15
de abril de 2014 | N° 17764
MARIO
CORSO (Interino)
O futuro é
vegetariano
Uma
maneira rápida de afundar uma reputação é fazer previsões. Só as cartomantes e
assemelhados podem errar sistematicamente e seguir sendo ouvidos. Quem se calça
na ciência é cobrado. Porém, como minha previsão é a longo prazo, meu risco é
com meus netos. Poderei um dia ouvir: não é de hoje que o vovô diz bobagem!
Embora
saibamos que a futurologia é o caminho do descrédito, ela segue nos fascinando.
Poucas coisas magnetizam tanto quanto tentar adivinhar o que nos está
reservado. Na mitologia clássica, os deuses tinham duas prerrogativas que não
nos eram concedidas: a imortalidade e a antevisão do futuro. Por isso, as
profecias são acompanhadas de uma neblina misteriosa, afinal, como entramos em
seara divina, seu obscuro e impalpável simbolismo surge.
Mas
vamos à minha investida nessa concorrida profissão de profeta: acredito que
rumamos para um mundo vegetariano. Não creio que a escolha por essa modalidade
de alimentação, cada vez mais frequente entre os jovens, seja um modismo. Penso
que veio para ficar, vai ser uma transição lenta, duas gerações ao menos, mas
já está acontecendo. Não teremos um mundo vegano, como quer a esquerda radical
da tendência. Acredito numa vitória da ala social-democrata, numa aceitação de
leite e ovos e talvez do consumo discreto, esporádico, de animais criados
livres.
De
onde tirei tal disparate, vão me perguntar meus conterrâneos de Passo Fundo,
enquanto preparam um costelão. Simples, essa nova geração possui uma
sensibilidade mais aguçada relativa aos animais e também é menos prisioneira da
razão instrumental, pragmática, que imperou no século 20. Eles não admitem mais
que os fins justifiquem os meios.
Conversando
com os recém-conversos, vejo que seguem uma lógica: não querem compactuar com
esse sistema movido à força do sofrimento animal. Seu protesto em ato é não
comer carne. Muitos aderiram depois de ver vídeos que denunciam os maus-tratos
impingidos aos animais durante seu crescimento e como são mortos. Admiro quem
não abre mão de dialogar com sua consciência e toma decisões morais a partir
disso. Creio que o primeiro embate deles será contra os animais criados
confinados. Nas palavras deles, criamos Auschwitzs para o mundo animal. Para os
vegetarianos a alimentação é um dilema ético.
Como
que eu fico nessa? Ora, eu sou um vegetariano em processo. Já me ganharam na
argumentação, mas a adaptação ao novo modelo vai demorar um tempo. Estou me
acostumando. Lembro da piada do sujeito que toma seu uísque sem gelo dizendo
ser ordens médicas. Interrogado pelo absurdo ele emenda: o doutor me proibiu de
beber, mas resolvi começar aos poucos, já cortei o gelo!
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