quinta-feira, 20 de outubro de 2011



20 de outubro de 2011 | N° 16861
ARTIGOS - Renato Silvano Pulz*


Insustentável leveza de ser corrupto

Um simples abrir os olhos e confesso que não consigo evitar uma visão sombria dos fatos. Uma sucessão de maracutaias com o dinheiro público embotando qualquer sinal de esperança. Mas, quando estamos quase jogando a toalha, surge uma réstia iluminando um futuro distante. Nem tudo é cinza, às vezes, um azul aparece.

A prisão de um comandante de batalhão da polícia e seus asseclas, envolvidos com o tráfico carioca. Licitações irregulares desvendadas, a Justiça garantindo o direito de termos uma imprensa livre para divulgar as irregularidades dos nossos políticos. E, agora, o povo saindo às ruas e voltando a se mobilizar.

A corrupção já faz parte de nosso cotidiano. Um fardo pesado. Ao ponto de quase nem merecer o tempo que dedico a estas linhas. Nos noticiários, um escândalo atrás do outro. Pessoas, que deveriam zelar pelo coletivo, seduzidas pelo lucro fácil.

As explicações sobre a origem histórica, sobre os fatores socioculturais não nos servem de consolo. Os brados contra a classe política ecoam por todos os cantos de um país que ocupa uma vergonhosa posição no ranking dos que mais desviam o dinheiro público.

Mas aqueles que gritam esquecem que os políticos são legítimos representantes do povo e foram eleitos democraticamente. É, pois, a tolerância da sociedade às vantagens recebidas, à custa dos outros, uma prática socialmente aceita. Um alicerce aos logros dos inescrupulosos.

O romance de Milan Kundera nos proporciona uma reflexão. Levar uma vida leve, sem o peso do comprometimento, pode ser uma escolha, mas tem seu preço. Levar a vida sem comprometer-se com algo, além de seus próprios interesses, corrobora a filosofia dos corruptos.

Se almejarmos alguma mudança, devemos sustentar o peso de nossas escolhas. Devemos entender que esperar na fila, devolver o troco a mais, gerir bem o dinheiro público, ou seja, abdicar do jeitinho é uma opção que devemos fazer se quisermos um futuro melhor.

Apesar dos momentos de desesperança, acredito que a maioria dos cidadãos são honestos e pessoas de bem. Por isto sei que é insustentável a leviandade, é chegada a hora de todos escolherem como querem viver.

*Professor universitário

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