segunda-feira, 31 de outubro de 2011



31 de outubro de 2011 | N° 16872
PAULO SANT’ANA


Os outros

Esses dias, escrevi que, se dermos uma esmola a alguém e, se a alegria de quem recebeu o óbolo for maior do que a nossa alegria, a esmola não se completou para nós.

A alegria de dar, de amparar, de oferecer-se aos outros é incomparavelmente a maior de todas as alegrias.

A alegria de dar é própria dos santos, principalmente de São Francisco de Assis, que não gostava só de dar seu amor e carinho para os homens, mas também os dava para os animais e até para as coisas.

Para São Francisco, a raposa ele chamava de Irmã Raposa. E, quando pregava um prego, São Francisco de Assis agradecia ao “Irmão Martelo”.

Ou seja, São Francisco celebrava todos os dias, todas as horas, o prazer e o orgulho de ter sido contemplado por Deus com vários atores que faziam parte de sua convivência, inclusive os animais e os objetos.

Sartre disse numa célebre sentença que “o inferno são os outros”. São Francisco o desautorizou, afirmando que o “céu são os outros”, isto é, de que nada vale nossa passagem pela Terra se não a dedicarmos exclusivamente para ajudar os outros.

Toda a moral do cristianismo encerra afinal a doação aos outros. “Ama o próximo como a ti mesmo.”

O próximo, este a meta, este deve ser o único objetivo do homem, a única forma de ele realizar-se.

Em outras palavras, o homem sozinho é incompleto. E os santos perceberam que só há uma forma de o homem deixar de ser só: é entregar-se de pleno a outras pessoas, é querer o bem de outras pessoas e tudo fazer para realizá-lo.

A diferença entre o homem correto e o escolhido por Deus é que o primeiro não faz o mal para ninguém. Mas o escolhido por Deus é superior ao homem correto porque só faz o bem para as pessoas.

O homem correto é o bondoso inativo, o escolhido por Deus é bondoso em permanente atividade.

São Francisco de Assis chegou ao cúmulo de compreender e agir do seguinte modo: despiu-se de todos os bens do mundo, só se reservou o direito de possuir uma batina e um chinelo.

Foi desse modo, sem ter qualquer propriedade, que encontrou técnica e estrategicamente a sabedoria: se decidiu não ter nada, tudo o que lhe caísse nas mãos ou brotasse no coração era imediatamente destinado aos outros.

Pode haver neste mundo ser mais abençoado por Deus que aquele que se dedica permanentemente a assistir os outros?

Pode haver nesta vida alguém mais santo que não queira nada do mundo para si e reserve tudo o que de material e espiritual para doar aos outros?

Por isso é que o amor pode se resumir apenas em dedicar-se a outra pessoa.

O amor é uma escada sublime que leva alguém a subir um degrau para homenagear a sua amada, o seu amado, compartilhando o mundo com ela.

O amor se instala naquele momento sublime em que uma outra pessoa surge milagrosamente para nos tirar da solidão e nos fazer a companhia mais próspera.

O amor dos santos e o amor dos homens é tudo o que se deve exigir de qualquer ser vivo e racional.

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