segunda-feira, 17 de outubro de 2011



17 de outubro de 2011 | N° 16858
ARTIGOS - Cláudio Brito*

Desfaçatez

Desaforo, cinismo, descaramento. São alguns sinônimos para desfaçatez. Insolência e “cara de pau” também servem. Menos usada, a impudência, ou o impudor. São palavras que podemos usar para definir e qualificar, ou desqualificar, comportamentos como o dos importadores do lixo hospitalar que a Receita Federal conseguiu interceptar em Pernambuco.

A resposta tem que ser indignada, forte e escancarada. A cidadania tem que acompanhar e fiscalizar até o último ato do inquérito que a Polícia Federal instaurou para apurar todas as responsabilidades pela aberração cometida.

Dizendo que se tratava de importação de amostras de tecido defeituoso, certamente adquiridas para reciclagem e reaproveitamento, empresa do setor têxtil pernambucano fez entrar em nosso país uma partida de lixo hospitalar dos Estados Unidos.

Santa desconfiança tiveram os fiscais alfandegários, que viram incompatibilidade entre valores declarados e volume da carga. Abertos os contêineres, a desfaçatez sanguinolenta e purulenta estava lá. Nossa terra outra vez servindo de lixeira para o mundo. Acontecera anteriormente e uma parte da porcaria veio parar em Rio Grande.

Agora, em Ipojuca, no Porto de Suape, duas apreensões de lençóis sujos, seringas, luvas usadas e cateteres. A importação foi definida como contrabando e, além das implicações fiscais, a Polícia Federal e o Ministério Público investigam outras consequências. E tem que haver muita investigação, pois a mesma empresa já importou outros seis contêineres, que passaram incólumes pela fiscalização. Faz algum tempo, talvez os panos sujos e podres dos americanos já tenham sido reciclados e hoje vistam alguns de nós.

Quem sabe aquela camisa esportiva de algodão ou de fibra egípcia que temos guardada para bons momentos de verão seja resto de lençóis de um bloco cirúrgico ou de um leito de UTI do Porto de Charleston, de onde veio a encomenda macabra para o nordeste do Brasil.

Nós é que precisamos de um pouco de desfaçatez. No sentido de desassombro e insolência para respondermos à ofensa na medida adequada e justa. Nenhum pudor com essa gente, nenhum receio. É multa e cana dura, apreensão e indisponibilidade de bens, não se pode esperar menos.

Impossível aceitarmos a condição de escarradeira das nações. Vale para quem mandou a carga e para quem a comprou. A punição bem que poderia ser cobri-los com aquilo que os contêineres escondiam. Com a mesma desfaçatez de suas condutas.

*Jornalista

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