domingo, 31 de julho de 2011

Leia gratuitamente os livros do escritor Paulo Coelho

Especial para você leitor deste Blogger

RULES OF THE GAME

A] I the case that you download a book and like it, please buy the book, so we can tell to the industry that sharing contents is not life threatening to the book business.
B] You can do a relevant service to your community. Print and handle FOR FREE to a local library in a small town, to a hospital, to a prison. The intention of Pirate Coelho (as well as my free web books) is first and foremost share thoughts with people who cannot afford buying books.

REGRAS DO JOGO

A) se baixar um livro e gostar da leitura, por favor compre. Isso mostrará às editoras que dividir é multiplicar
B) Use a cópia que imprimiu e faça uma doação para a biblioteca da sua cidade, um hospital, ou uma prisão.

A intenção de Pirate Coelho é permitir acesso de meus livros à gente que não tem dinheiro para compra-los.

Obrigado/ Thank you

Paulo Coelho

http://paulocoelhoblog.com/2009/08/31/pirate-coelho-2/

Dear Paulo:
thank you for these gifts. Everytime an artist, or writer share his or her work, it inspires me to buy the publications for me and also as gifts for friends.

DANUZA LEÃO

Liberdade, oh, liberdade

Ah, que maravilha: vai aonde quer, volta na hora que bem entende, sem ninguém para reclamar

TODO MUNDO quer ser livre; a liberdade é o bem mais precioso, almejado por homens e mulheres de todas as idades, e a luta para conquistá-la começa bem cedo. Desde os primeiros meses de idade só se pensa em uma coisa: fazer apenas o que quer, na hora que quer, do jeito que quer.

Crianças de meses rejeitam a mamadeira de três em três horas, mas choram quando têm fome (só querem comer quando têm fome, o que é muito justo) e quando um pouco mais grandinhas, brigam para não vestir a roupa que a mãe escolheu.

Ficam loucas para ir sozinhas para o colégio, e quando chegam em casa além do horário previsto, ai de quem perguntar onde elas estiveram. "Por aí", é o que respondem, quando respondem -e as mães que enlouqueçam.

Quando adolescentes, as coisas pioram: querem a chave da casa (e a do carro), e quando começam a sair à noite e os pais tentam estabelecer uma hora para chegar, é guerra na certa, com as devidas consequências: quarto trancado, onde ninguém pode entrar nem para fazer uma arrumação básica.

Naquele território ninguém entra, pois é o único do qual ele se sente dono -portanto, livre. A partir dos 12 anos, o sonho de todos os adolescentes é morar num apart -sozinhos, claro.

Mas o tempo passa, vem um namoro mais sério, e quem ama não é -nem quer ser- livre (para que o outro também não seja). Dá para quem está namorando sumir por três dias? Claro que não. Se for passar o fim de semana na casa da avó, em outra cidade, vai ter que dar o número do telefone, e isso lá é liberdade? Os celulares permitem, pelo menos, que eles não atendam, já que sabem quem está ligando.

Aí um dia você começa a achar que para ser livre mesmo é preciso ser só; começa a se afastar de tudo e cancela o amor em sua vida, entre outras coisas. Ah, que maravilha: vai aonde quer, volta na hora que bem entende, resolve se o almoço vai ser um sanduíche ou nada, sem ninguém para reclamar da geladeira vazia, trocar o canal de televisão ou reclamar do fumacê no quarto. Ah, viver em total liberdade é a melhor coisa do mundo.

Mas a vida não é simples, e um dia você acorda pensando em mudar de casa; fica horas pesando os prós e contras, mas não consegue decidir se deve ou não. Pensa em refrescar a cabeça e ir ao cinema, mas fica na dúvida -enfrentar a fila, vale a pena? Vê a foto de uma modelo na revista e tem vontade de cortar o cabelo igual, mas será que deve?

Acaba não fazendo nada, e depois de tantos anos sem precisar dar satisfação da vida a ninguém, começa a sentir uma estranha nostalgia.

Como seria bom se tivesse alguém para dizer que é loucura fazer uma tatuagem; que aconselhasse a não trocar de carro agora -pra que, se o seu está tão bom?

Que mostrasse o quanto foi injusta com aquela amiga e precipitada quando largou o marido, o quanto foi rude com a faxineira por bobagem. Que falasse coisas que iam te irritar, desse conselhos que você ia seguir ou não, alguém com quem você pudesse brigar, que te atormentasse o juízo às vezes, para poder reclamar bastante. Alguém que dissesse o que deve ou não fazer, o que pode e o que não pode, e até mesmo te proibisse de alguma coisa.

E que às vezes notasse suas olheiras e falasse, de maneira firme, que você está muito magra e talvez exagerando na dieta; alguém que percebesse que faltando dez dias para o final do mês você só tem R$ 50 na carteira e perguntasse se você não está precisando de alguma coisa. E que dissesse sempre, em qualquer circunstância, "vai dar tudo certo".

Que falta faz um pai.

danuza.leao@uol.com.br


ELIANE CANTANHÊDE

Tudo balança, mas não cai

BRASÍLIA - A maior preocupação da presidente Dilma Rousseff, como ela deixou evidente na posse de Ollanta Humala no Peru e nos encontros com Cristina Kirchner em Brasília, é com os efeitos ainda não bem definidos da crise dos EUA no mundo, na América do Sul e, consequentemente, no Brasil.

De público, Dilma diz que teme o desequilíbrio das moedas da região em função do esfarelamento do dólar, como também a enxurrada de produtos manufaturados que, sem compradores nos países ricos, tendem a inundar os emergentes. A enxurrada, se houver, pode afetar as indústrias e os empregos nacionais -do Brasil e dos vizinhos.

Em privado, o que prevalece é o temor aliado às incertezas, ou seja, uma grande interrogação. Ninguém sabe, ao certo, em que ponto o endividamento americano e o impasse político de Barack Obama vão se somar à fragilidade de países europeus. E no que tudo isso, junto, vai dar a curto e médio prazos.

Mas, enquanto a agonia de Dilma é com a crise mundial que vai tomando forma, como uma nuvem carregada, a de Lula e dos lulistas é mais doméstica: as consequências da faxina nos Transportes.

Não é por acaso que só 1% (1% mesmo!) das obras do PAC na área justamente de transportes estão prontas, mas a preocupação é outra: a tentativa do PR de extrapolar sua insatisfação para os demais partidos aliados. A ministra Ideli Salvatti está encarregada de acalmar a turma com cargos, mas algo emperra a tarefa: Dilma exige "ficha limpa". Sobram poucos...

Esta semana, portanto, promete grandes emoções, com o mundo e o governo brasileiro aos sobressaltos. E tem mais: o ministro Nelson Jobim vai amanhã ao programa "Roda Viva", da TV Cultura. Jobim, o que balança, mas não cai, está em fase de dizer verdades por aí e, como todos sabemos, a verdade às vezes dói. Quando dói na presidente da República, o tombo passa a ser questão de tempo.

elianec@uol.com.br

EDSON ARAN

O baú dos templários

Não é por acaso que a direita fundamentalista se inspirou nos templários: eles são os maiores heróis (ou os piores vilões) de toda a cristandade

Até que demorou para a extrema direita europeia buscar inspiração nos templários para seus atos terroristas, como fez Anders Breivik.

O norueguês homicida afirma pertencer a uma nova Ordem dos Cavaleiros do Templo, que reúne europeus engajados em combater o multiculturalismo em geral e o islã em particular.
Faz sentido. Dependendo do ponto de vista, os templários são os maiores heróis da cristandade -ou os piores vilões.

A ordem foi fundada no 19º ano do Reino Cristão de Jerusalém, que havia sido conquistado meio por acaso em 1099, durante a Primeira Cruzada. Como a população da cidade fora dizimada pelos invasores -que não fizeram distinção entre cristãos ortodoxos, judeus e muçulmanos-, os novos soberanos passaram a pregar a imigração de europeus para a Terra Santa.

O problema é que as rotas eram infestadas de criminosos. Em 1118, Hugo de Payens e mais oito cavaleiros criaram uma organização autônoma de monges combatentes para proteger os peregrinos. A ordem jurava fidelidade apenas ao papa e, financiada por impostos eclesiásticos, se tornou o primeiro exército regular do Ocidente desde a queda de Roma em 476 d.C.

Com a conquista de Jerusalém por Saladino, em 1187, os templários voltaram sua atenção para a Europa, onde adquiriram vastas extensões de terra e organizaram um rudimentar sistema bancário. As lendas, no entanto, os transformaram em guardiões do Santo Graal, o místico cálice que Jesus Cristo usara na Santa Ceia e que servira para recolher seu sangue na cruz.

Os mitos do Graal são uma espécie de compensação cultural pela perda da Terra Santa para o islã.

Não por acaso, em narrativas posteriores, o cálice se transforma na própria descendência de Cristo e Maria Madalena, que, refugiada no sul da França, dá origem à dinastia dos reis merovíngios e, mais tarde, à casa dos Habsburgos, soberanos do Império Austro-Húngaro. A linhagem, como o cálice, estaria sob a proteção dos templários, braço armado de organização ainda mais misteriosa, o Priorado de Sião.

Ao contrário da trama de "O Código Da Vinci", de Dan Brown, os guardiões do Graal não querem promover filosofia "new age", mas restaurar a monarquia na França e restabelecer o Reino Cristão de Jerusalém. Afinal, Jesus Jr., além de merovíngio e Habsburgo, também descende do rei Davi e, portanto, é legítimo soberano da Terra Santa.

Nada agrada mais à extrema direita do que sociedades secretas excludentes e elitistas. O nazismo sempre foi associado a ordens esotéricas, que, no entanto, não o salvaram da derrota. Os templários não tiveram melhor sorte.

A ordem foi exterminada em 1307, quando o último grão-mestre, Jacques De Molay, foi condenado à fogueira por heresia. A Inquisição acusava os cavaleiros de adorarem um demônio de três cabeças chamado Bafomé. Entre os ocultistas, a criatura é associada à sabedoria, mas há também quem veja em seu nome uma corruptela de "Maomé", que a ordem teria aprendido a cultuar na Terra Santa.
Se deus existe, ele tem mesmo um senso de humor dos diabos.
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EDSON ARAN é autor de "Conspirações - Tudo o que Não Querem que Você Saiba" e diretor de Redação da revista "Playboy".

sábado, 30 de julho de 2011



31 de julho de 2011 | N° 16778
MARTHA MEDEIROS


Amputações

Estamos falando de tudo que é nosso, mas que teve que deixar de ser na marra, em troca da nossa sobrevivência emocional

Quando o filme 127 Horas estreou no cinema, resisti à tentação de assisti-lo. Achei que a cena da amputação do braço, filmada com extremo realismo, não faria bem para meu estômago. Mas agora que saiu em DVD, corri para a locadora. Em casa eu estaria livre de dar vexame.

Quando a famosa cena se iniciasse, bastaria dar um passeio até a cozinha, tomar um copo d´água, conferir as mensagens no celular, e então voltar para a frente da TV quando a desgraceira estivesse consumada. Foi o que fiz.

O corte, o tão famigerado corte, no entanto, faz parte da solução, não do problema. São cinco minutos de racionalidade, bravura e dor extremas, mas é também um ato de libertação, a verdadeira parte feliz do filme, ainda que tenhamos dificuldade de aceitar que a felicidade pode ser dolorosa. É muito improvável que o que aconteceu com o Aron Ralston da vida real (interpretado no filme por James Franco) aconteça conosco também, e daquele jeito.

Mas, metaforicamente, alguns homens e mulheres conhecem a experiência de ficar com um pedaço de si aprisionado, imóvel, apodrecendo, impedindo a continuidade da vida. Muitos tiveram a sua grande rocha para mover e, não conseguindo movê-la, foram obrigados a uma amputação dramática, porém necessária.

Sim, estamos falando de amores paralisantes, mas também de profissões que não deram retorno, de laços familiares que tivemos de romper, de raízes que resolvemos abandonar, cidades que deixamos. De tudo que é nosso, mas que teve que deixar de ser, na marra, em troca da nossa sobrevivência emocional. E física, também, já que insatisfação é algo que debilita.

Depois que vi o filme, passei a olhar para pessoas desconhecidas me perguntando: qual será a parte que lhes falta? Não o “Pedaço de Mim” da música do Chico Buarque, aquela do filho que já partiu, mutilação mais arrasadora que há, mas as mutilações escolhidas, o toco de braço que tiveram que deixar para trás a fim de começarem uma nova vida.

Se eu juntasse alguns transeuntes, aleatoriamente, duvido que encontrasse um que afirmasse: cheguei até aqui sem nenhuma amputação autoprovocada. Será? Talvez seja um sortudo. Mas é mais provável que tenha faltado coragem.

Às vezes o músculo está estendido, espichado, no limite: há um único nervo que nos mantém presos a algo que não nos serve mais, porém ainda nos pertence. Fazer o talho sangra. Machuca. Dói de dar vertigem, de fazer desmaiar. E dói mais ainda porque se sabe que é irreversível. A partir dali, a vida recomeçará com uma ausência.

Mas é isso ou morrer aprisionado por uma pedra que não vai se mover sozinha. O tempo não vai mudar a situação. Ninguém vai aparecer para salvá-lo. 127 horas, 2.300 horas, 6.450 horas, 22.500 horas que se transformam em anos.

Cada um tem um cânion pelo qual se sente atraído. E um cânion do qual é preciso escapar.


31 de julho de 2011 | N° 16778
MISÉRIA NO ESTADO


O Rio grande indigente

No dia 12 de julho, Alessandra Rodrigues completou oito anos em um casebre feito de remendos de madeira apodrecida, comprado pelos pais por R$ 150 em Bagé. Não houve bolo, presente ou Parabéns a Você na rua sem iluminação pública ou calçamento, alagada pelo esgoto que corre a céu aberto.

O banho foi de balde, porque não há banheiro, só um buraco no chão para servir de latrina. Para atravessar o mês, Alessandra, a irmã e os pais contavam apenas com os R$ 130 do Bolsa-Família, programa federal que distribui valores variáveis conforme critérios.

– Eu queria bolo ou churrasco, mas minha mãe não fez nada. Ela explicou que não tem dinheiro. Só me deu parabéns – contou a aniversariante.

No Rio Grande do Sul orgulhoso de seus indicadores sociais, a miséria de famílias como a de Bagé tende a ser vista como uma anomalia, um mal restrito a bolsões recalcitrantes no entorno das grandes cidades, mas os números do Censo de 2010 contam uma história diferente.

Eles revelam um quadro de miséria endêmica. Vivem hoje com, no máximo, R$ 70 de rendimento per capita mensal – o critério federal para configurar a pobreza extrema – 385 mil gaúchos. Se essas pessoas formassem uma cidade, ela seria a terceira maior do Estado.

Saber quem são e onde estão essas pessoas revestiu-se de importância renovada a partir de 1° de janeiro, quando a recém-empossada presidente Dilma Rousseff prometeu erradicar a pobreza extrema no país.

Em junho, o governador Tarso Genro uniu-se à proposta, com o lançamento do programa RS Mais Igual. Para amparar essas ações governamentais, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aplicou filtros aos dados e quantificou os que mais necessitam do socorro público: são 306,6 mil dos 385 mil gaúchos.

Ao longo deste mês, Zero Hora debruçou-se sobre as estatísticas e percorreu as áreas do Rio Grande do Sul assoladas pela miséria para produzir um retrato dos gaúchos que vivem com quase nada.

O resultado, que será publicado entre este domingo e terça-feira, permite lançar um alerta: se as políticas públicas limitarem-se a transferir dinheiro, o problema não será resolvido. Como observa Flavio Comim, professor de Economia da Pobreza da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), é preciso oferecer um horizonte às famílias.

– É fácil repassar dinheiro, dizer que se erradicou a miséria. Mas o que muda se a pessoa tiver R$ 71 por mês?

A família de Alessandra mostra que a solução é mais complexa. Sua mãe, Josiene Pereira Machado, 23 anos, largou a escola por causa da gravidez, aos 14 anos. Cresceu em meio à violência: um de seus 10 irmãos foi assassinado aos 12 anos.

Ao longo do tempo, ela e o marido, José Ricardo Rodrigues, 27 anos, não conseguiram mais do que biscates. A esperança de uma vida digna chegou apenas neste mês – e não veio do governo. José Ricardo conseguiu trabalho em uma estância. Ele receberia o primeiro salário, de R$ 680, neste fim de mês.

– Nossa vida vai mudar – alegrava-se Josiene, que agora vislumbra a possibilidade de oferecer um bolo à filha no próximo 12 de julho.


31 de julho de 2011 | N° 16778
VERISSIMO


Tem cada um...

Tem, por exemplo, o Victor, que não perde oportunidade de ostentar sua cultura; e o Pinheiro, cujo sono é lendário

Tem, por exemplo, o Victor, que não perde oportunidade de ostentar sua cultura, para divertimento e, às vezes, irritação da turma. Como na vez em que houve um silêncio na mesa do bar em que eles se reuniam e o Victor disse:

– Eu conheço este silêncio de um filme do Bergman.

O Marcão não aguentou.

– Como, de um filme do Bergman? Como um silêncio pode ser igual a outro silêncio, que não tem nada a ver?

O Victor apenas sorriu. Não poderia esperar que o Marcão, logo o Marcão, entendesse. O que mais irritava o Marcão era aquele sorriso do Victor.

Mas a melhor do Victor quem contou foi o Mendonça, médico, que também frequentava a turma. O Victor andava tossindo muito, e expectorando, e procurara o Mendonça no seu consultório.

– Acho que peguei a gripe.

– Você tem muito catarro? – perguntara o médico.

– Tenho.

– De que cor é o catarro?

E então o Victor pensara um pouco e respondera:

– Sabe o verde daquele afresco do Tiepolo no Palazzo Clerici, em Milão?

O Victor estava presente na mesa quando o dr. Mendonça contou o fato e apenas sorriu diante da gargalhada geral da turma. Depois deu de ombros e disse:

– O que eu vou fazer se vocês não viajam?

O Marcão ficou pra morrer.

E tem o Pinheiro, também chamado Pinho, cujo sono é lendário. Contam que o Pinho não pode ir ao cinema porque dorme no começo do filme, sempre. Filme de caubói, filme de guerra, inclusive intergaláctica... Não via nem os créditos completos.

– Você chegou a ver o nome do diretor, Pinho?

– Não, fui só até o produtor.

Mas não deve ser verdade o que contam sobre a separação do Pinho.

Contam que o casamento do Pinho e da Eneida não estava dando certo – em grande parte porque o Pinho invariavelmente dormia quando a Eneida começava a lhe dizer alguma coisa, às vezes no meio de uma frase. E que um dia a Eneida levantara da cama do casal, saíra à rua, contratara uma empresa de mudança e voltara com três carregadores, que passaram a tirar tudo de dentro do apartamento. Tudo. Geladeira, fogão, móveis da sala, televisão, mesa de jantar...

– Este armário também vai, dona?

– Tudo.

Deixaram o quarto de dormir, onde o Pinho ainda roncava em cima da cama, para o fim. E o quarto também foi esvaziado.

– E a cama, dona?

Eneida hesitou. Levava ou deixava a cama? Decidiu:

– A cama vai.

– E o doutor?

– Fica. Deixem o colchão pra ele.

Aqui as versões divergem. Há quem diga que a Eneida voltou atrás e mandou carregarem o colchão também, deixando o Pinho dormindo no chão. Outros dizem que o colchão, misericordiosamente, ficou. Mas todos concordam que, como não havia mais nada no apartamento onde colocar o bilhete de despedida que escrevera para o marido, a Eneida o colocara entre dois dedos do seu pé. Para o Pinho ler quando acordasse.


31 de julho de 2011 | N° 16778
PAULO SANT’ANA


Os lentos e os apressados

Tenho amigos que são lentos e tenho amigos que são apressados demais.

Tenho um amigo tão lento (não cito seu nome porque ele pode levar a mal), que demora uma hora e meia no banho. Sei porque foi sua mulher que me disse.

E tenho amigos tão apressados, que, quando conversamos, eles não prestam atenção no que eu digo porque estão empenhados em raciocinar sobre o que vão me dizer quando eu cessar de falar.

O Lauro Quadros, meu inimigo, é o sujeito mais apressado que conhecemos aqui na RBS. Ele nunca se detém para falar com ninguém. Quando alguém o chama, ele continua caminhando e comprime a pessoa que o acompanhe nos passos, só assim a atende.

O Lauro Quadros é a única pessoa do mundo que nunca tomou cafezinho com ninguém. Ele se recusa a parar em qualquer lugar, está sempre em andamento. Alega sempre, para evitar falar com qualquer um, que tem de ir ao banco. Se não for horário de banco, ele alega qualquer outro compromisso e continua caminhando. Não para nunca.

O Lauro Quadros, quando está em casa, à noite, em companhia da Maria Helena, sua mulher, vê televisão de pé: pronto para qualquer emergência.

Já o Siqueira é um outro amigo meu muito apressado. Ele entra no restaurante e já diz para o garçom, antes de sentar-se: “Por que ainda não trouxe o vinho?”.

O Siqueira, quando anda de táxi, sempre paga a corrida ao taxista antes de chegar ao destino. Porque basta estacionar o táxi e ele já sai correndo.

Interessantes as pessoas. E tenho uma curiosidade louca para saber como fazem sexo esses meus amigos lentos e apressados.

Os lentos devem agradar a suas mulheres, os apressados as desagradam, acho que é assim que funciona.

O Jurandir é tão apressado, que nunca pronunciou a palavra “alô” no telefone: ele já sai falando o que lhe interessa e jamais qualquer ligação sua demorou mais de um minuto.

Interessante é que se dá o seguinte com meus amigos no trânsito: os lentos andam em alta velocidade quando dirigem e os apressados chegam até a ser chatos, tão devagar eles trafegam.

Já um amigo que não vou citar o nome por motivo óbvio, quando vai receber uma conta, fica se coçando ansioso para que o devedor quite logo a dívida, completamente ao contrário de outro amigo que, quando vai pagar a conta, diante do credor, leva cerca de meia hora para assinar o cheque.

E finalmente uma sobre o Luiz Tesch, o meu amigo mais apressado: quando vai assistir a um show e o público delira com o artista e grita “bis, bis, bis”, ele a pleno pulmões vocifera: “A seguinte, a seguinte!”.

RUTH DE AQUINO

O chororô dos meritíssimos

Estou com pena dos juízes. Seus 60 dias de férias anuais podem ser reduzidos à metade. É uma maldade com os meritíssimos. O tratamento cerimonioso vem da palavra mérito. Os juízes estão acostumados aos superlativos. Digníssimo, excelentíssimo. Os salários e os benefícios do Judiciário também são superlativos. Quando um juiz é afastado por um abuso, é “punido” com aposentadoria integral. Na semana passada, o direito dos magistrados a férias em dobro foi ameaçado.

Quem comprou a briga foi o presidente do STF, Cezar Peluso. Em entrevista ao jornal O Globo, ele defendeu a redução das férias – ou melhor, a “equiparação” do descanso dos juízes ao de todos os assalariados brasileiros, com base nas leis trabalhistas. A reação da categoria foi estridente e imediata. O chororô afeta a credibilidade de uma classe bem remunerada que estuda em princípio para defender direitos iguais.

A carta aberta dos juízes é comovente. Eles defendem seus 60 dias de férias por motivo nobre. Trabalham demais e sob pressão, não recebem por hora extra, levam “processos complexos” para casa nos fins de semana. Professores, médicos, motoristas, todos deveriam se inspirar no direito ao ócio dos meritíssimos.

Os juízes explicam que, livres das audiências, trabalham durante as férias. E, por isso, precisam dos 60 dias. Para resolver a lerdeza da Justiça, talvez devêssemos ampliar ainda mais as férias dos juízes. Os processos não se acumulariam tanto, sem solução. Noventa dias de férias anuais seriam suficientes para tirar o atraso?

Não é apenas em nome da eficiência que a Associação dos Magistrados do Brasil se amotinou. Os juízes afirmam que férias dobradas reduzem a aposentadoria por invalidez ou morte prematura. Esse argumento parece piada de humor negro com os demais trabalhadores.

E a comédia não para aí. O senador petista Eduardo Suplicy criticou o privilégio dos juízes e promotores: “Há tantas outras profissões que exigem extraordinária dedicação e nem por isso têm férias maiores que o normal”. Suplicy esqueceu que ele e seus companheiros no Congresso têm direito a 55 dias de descanso remunerado por ano.
Eles querem manter o privilégio das férias mais longas. Onde vai parar a guerra às castas no Brasil?

O professor da PUC do Rio Luiz Werneck Vianna, autor do livro Corpo e alma da magistratura brasileira, defende as longas férias dos juízes. “É uma profissão estressante. Isso é coisa de classe média ressentida”, diz ele. O presidente da OAB, Ophir Cavalcanti, discorda: “ (A regalia) fere a igualdade que deve existir entre os cidadãos.

A Justiça brasileira é morosa também pelo excesso de férias, recesso e feriados”. A sociedade já não idealiza o magistrado, afirma o professor de história do Direito da FGV de São Paulo, José Reinaldo de Lima Lopes: “Está cada vez mais forte a mentalidade de que o juiz é um prestador de serviço como outro funcionário”. Foi-se o tempo em que o juiz era indicado pelo imperador ou pelo ministro da Justiça. Há concursos públicos.

Em abril deste ano, a polêmica foi outra. Tentou-se em vão exigir dos tribunais o expediente integral, das 9 horas às 18 horas. Não adiantou o presidente da OAB brigar pela igualdade: “A toga é apenas uma indumentária, e não um escudo para justificar a diferenciação entre os trabalhadores”. Um dos argumentos dos juízes foi o calor excessivo no fim da tarde. O horário dos tribunais em alguns Estados vai das 9 horas às 14 horas. É por isso que precisam de tantas férias para trabalhar. A realidade não cabe num expediente assim.

Onde vai parar a guerra às castas no Brasil? Dilma começou a faxina ética no governo e no Congresso – e isso rende votos. Não importa se as razões da presidente são altruístas ou estratégicas. Alguém começa a peitar os mercenários da política.

Mesmo que nenhum ex-ministro mensaleiro devolva o dinheiro, Dilma pode dar uma de Peluso e questionar por que deputados e senadores trabalham dois dias por semana, discutem só o que importa a eles, vendem a consciência em troca de benefícios regionais ou pessoais, gastam as verbas extras sem prestar contas e se esbaldam em recessos com passagens aéreas financiadas por nós. Vivem todos vidas superlativas, alguns com ficha suja. Sem a menor culpa.


30 de julho de 2011 | N° 16777
NILSON SOUZA


A execução e o terremoto

Se o futebol é mesmo uma metáfora da vida – como já afirmaram vários autores, incluindo-se aí o uruguaio Eduardo Galeano –, o pênalti, do ponto de vista do cobrador, é a encruzilhada entre o dever e o fracasso. Parece fácil, mas até os maiores craques tremem quando se encaminham para a bola. É uma espécie de pelotão de fuzilamento ao contrário: o artilheiro é que corre maior risco de ser alvejado pelo próprio tiro.

São 11 metros entre a marca fatal e as balizas, que formam um retângulo com 7m32cm de largura e 2m44cm de altura. Qualquer criança é capaz de colocar a bola num espaço dessa dimensão.

Claro que há um goleiro lá dentro, mas com enormes limitações, sem poder tirar os pés da linha antes da bola ser chutada. Porém, tudo se modifica numa cobrança decisiva: o gol fica diminuto, o goleiro se agiganta e a bola se transforma em chumbo para o homem encarregado de arremessá-la às redes. É pressão demais.

O estádio, qualquer estádio, se transforma num coliseu romano lotado de espectadores impacientes que fuzilam o gladiador com olhares implacáveis, exigindo a execução. Ele sabe que não pode falhar. Se errar, os polegares acusadores apontarão inexoravelmente para o chão.

Atletas treinam muito para executar com perfeição os movimentos do esporte. O cobrador de pênaltis já fez dezenas, centenas, até milhares de vezes o que vai fazer agora. Mas ele sabe que nenhuma daquelas vezes foi igual a outra. Sabe, também, que a bola tem as suas manhas, às vezes tem vontade própria, nem sempre cumpre a trajetória pretendida pelo pé que a impulsiona.

O torcedor não sabe disso. De pé na arquibancada, ou roendo as unhas diante da televisão, imagina que é moleza acertar o cantinho, colocar a bola no ângulo, enganar o goleiro com um chute de efeito.

Nem lhe passa pela cabeça que aquele homem encarregado da cobrança leva nos ombros um fardo maior do que pode suportar. É inadmissível, para a lógica da paixão, que um jogador profissional possa arrematar por cima do travessão daquela distância, chutar pela linha de fundo ou – o improvável que tanto se repete – acertar uma trave de, no máximo, 12 centímetros de espessura.

Mas o carrasco prestes a se transformar em condenado sabe que até um pequeno terremoto costuma ocorrer naqueles décimos de segundo em que ele avança para a bola. E o pior é que ninguém vai acreditar que a grama se desprendeu sob seus pés, que a própria marca do pênalti se movimentou e que o tremor do mundo (ou de suas pernas?) tirou-lhe a concentração.


30 de julho de 2011 | N° 16777
PAULO SANT’ANA


Só 15 linhas

Que século! Os Estados Unidos estão a ponto de quebrar e passar o calote em seus credores!

E que culpa terá o Brasil se os Estados Unidos forem à falência? Mas há um justificado temor de que todos no mundo venham a sofrer as consequências dessa moratória norte-americana.

Grécia e Estados Unidos quebrados, sou capaz de retirar toda a minha caderneta de poupança.

Será que o capitalismo é mesmo inviável?

Eu havia pedido para os leitores não escreverem mais do que 15 linhas. Eu precisava ler os e-mails de todos e, assim extensos, eu não conseguia.

Pois bem, ontem um leitor iniciou seu e-mail dizendo que sabia não dever escrever mais que 15 linhas. E a seguir escreveu 50 linhas. Desisto.

Mas não li nenhuma linha desse leitor.

É um desaforo a pessoa escrever 90 linhas para um colunista e achar que ele tem a obrigação de lê-la. Não tenho. E não vou ler. Desculpem, mas tem de haver normas de bom senso.

Se leio todos os exageradamente extensos, não tenho tempo para ler os corretamente não extensos.

Como já cientifiquei a todos, com a radioterapia perdi o paladar, o apetite e a saliva. E, de quebra, portanto, perdi 12 quilos.

Eu queria perder era o paladar do relacionamento. Assim como não consigo ingerir alimentos sólidos, evitaria de engolir os chatos.

E só me alimentaria das pessoas líquidas, isto é, dos indivíduos agradáveis e bem-humorados.

Recebo do tenente-coronel José Carlos Riccardi Guimarães, presidente da Associação dos Oficiais da Brigada Militar, o seguinte: “Prezado amigo Paulo Sant’Ana. Agradeço publicamente teu reconhecimento ao profícuo trabalho que temos realizado.

Mas sobre aquele parágrafo em que escreveste que nenhum governo ousaria quebrar a equiparação salarial entre delegados de polícia e oficiais da BM, isto que escreveste é retrato do diferenciado observador social que és, eis que a inteligência constitucional assegura a existência das duas polícias, certos e recentes governos é que têm desconsiderado esse equilíbrio, em desfavor não da oficialidade da BM, mas da sociedade gaúcha”.

Recebo do tenente-coronel da BM RR Paulo Francisco Martins Pacheco, sobre aquela mesma coluna minha: “Certo de que o senhor, após bem informado, reassumirá a posição de medianidade perfeita no pleito da equiparação salarial entre delegados de polícia e oficiais de nível superior da BM, sublinho que já houve um desequilíbrio no governo Yeda: os delegados foram contemplados com 24% de aumento, enquanto os oficiais superiores receberam apenas 19%.

Note-se que, se fosse verdade o que afirma em sua coluna, não teríamos uma defasagem salarial tão grande entre o capitão da BM e o delegado de 1ª classe, bem como não haveria esse disparate entre o coronel e o delegado de 4ª classe. Receba minha maior admiração (que resulta sempre da soma do respeito com o espanto)”.


30 de julho de 2011 | N° 16777
DAVID COIMBRA


Um jogo de meninos

Eu estava em Ciudad del Este em 1999. Vi o que aconteceu. Ciudad del Este. Um dos lugares mais feios que já visitei. Feio, sujo e perigoso. Andando pelas ruas de Ciudad del Este você sente que ali tudo é extraoficial, que ali tudo o que não é permitido é possível.

Foi em Ciudad del Este que a Seleção Brasileira jogou a primeira fase da Copa América daquele ano. Foi no precário e mal-enjorcado estádio da cidade que testemunhei o maior momento da carreira de Ronaldinho.

Ele tinha 19 anos de idade e vinha de uma façanha. Uma semana antes do Gre-Nal decisivo do Gauchão fora “jurado” por ninguém menos do que Dunga, o Capitão do Tetra. Dunga prometeu “pegar” Ronaldinho no clássico e conquistar o campeonato pelo Inter. Indagado sobre a ameaça, Ronaldinho tergiversou:

– Eu admiro muito o Dunga. Até tenho a figurinha dele no meu álbum.

Naquele dia, pensei: resposta inteligente! Suavemente irônica e, ao mesmo tempo, respeitosa. Hoje tenho dúvidas se a ironia foi intencional e se houve inteligência na frase. Enfim. No domingo, em campo, Ronaldinho deu uma resposta mais corrosiva. Foi o melhor da partida, aplicou um chapéu e um elástico em Dunga, entrou na área do Inter a drible e marcou o gol da vitória e do título. Na segunda-feira, Luxemburgo o chamou para a Copa América.

Ronaldinho era reserva. Aquela Seleção tinha Romário, Ronaldo, Rivaldo, Edmundo e outros que tais. Mas, no jogo de abertura, contra a Venezuela, ele entrou no final. O Brasil já goleava, estava 5 a 0. Então, Ronaldinho protagonizou um lance que já se tornou clássico do futebol mundial: dentro da área, dominou a bola no ar, chapeleou um zagueiro, evitou outro e, cercado de adversários, mandou para o gol. Golaço.

Um gol lindo, sim, mas o melhor foi o que o sucedeu: a comemoração. Ronaldinho saiu gritando, pulando, socando o ar, vibrando com uma alegria autêntica e juvenil que encantou o mundo. Exatamente: foi aquela comemoração, mais do que a plasticidade do gol, que apaixonou os amantes do futebol. Porque Ronaldinho, naquele momento, representava a essência do jogo.

Era um menino que jogava por prazer, jogava rindo e brincando, e se emocionava com um gol que fazia. Não houve ensaio ou a mínima premeditação naquela comemoração. Não havia deboche, desafio, ironia ou bazófia. Ele não estava se jactando, nem afrontando quem quer que fosse. Era um menino festejando o seu gol. Só. E não precisava mais. E era o próprio futebol.

O Ronaldinho dentuço, sorridente e quase ingênuo, falando sempre em alegria, aquele Ronaldinho, por algum tempo, fez o mundo sonhar. Porque o futebol mais autêntico é o que se joga com 12 anos de idade: jogado por prazer. Ronaldinho parecia jogar por prazer.

Mais: Ronaldinho gritava ao mundo que jogava no clube do seu coração, o clube em que trabalhou o seu pai, em que trabalhava sua irmã, em que jogou seu irmão. Há fotos de Ronaldinho com sete anos de idade com a camisa do Grêmio, brincando com a bola, como brincaria aos 19. Naquela Copa América, inclusive, Ronaldinho declarou:

– No Grêmio eu jogo até de graça.

Claro que todos sabiam que não era bem assim, claro que nem o gremista mais acerbado esperaria que um jogador, qualquer que fosse, jogaria de graça, mas a declaração de Ronaldinho denotava o prazer que ele sentia em jogar bola no time pelo qual torcia. Não é precisamente esse o encanto do futebol? A paixão? Dois anos depois, quando os clubes europeus assediavam o Grêmio para contratá-lo, Ronaldinho, ao marcar um gol, correu para a casamata e gritou para os dirigentes sentados no banco:

– Não me venda, presidente!

Podia haver mágica maior para a torcida? Mas, pouco tempo depois, Ronaldinho saiu da forma como saiu, meio arrevesada, meio clandestina e friamente planejada. Ronaldinho, então, começou a quebrar o feitiço que o envolvia: descobriu-se que ele era outro a agir por dinheiro. Mais tarde, Ronaldinho pareceu desinteressar-se também pelo jogo. Tudo indicava que não sentia mais prazer com o futebol.

No começo desse ano, Ronaldinho acertou sua volta ao Grêmio. Seria o retorno daquele menino que gostava de jogar bola, e que gostava, sobretudo, de jogar no time pelo qual torcia. Depois, como se sabe, Ronaldinho desacertou de inopino sua volta ao Grêmio e fechou com o Flamengo.

Hoje, no Flamengo, Ronaldinho jogará contra o clube do seu coração. Exatamente na semana em que, depois de tanto tempo, ele finalmente voltou a jogar como um menino. Como se estivesse se divertindo. Estou curioso para vê-lo em campo. Será que sentirá algo quando vir a camisa do adversário? Será que ainda é capaz disso? Será que ainda existe um pouco daquele menino no corpo adulto de Ronaldinho? Ou será que o Ronaldinho da grana e da fama venceu?


30 de julho de 2011 | N° 16777
CLÁUDIA LAITANO


Os suspeitos de sempre

Você já deve ter ouvido falar da Lei de Murphy, mas talvez não conheça a curiosa Lei de Godwin, segundo a qual, em uma discussão online que se estende muito, a probabilidade de um dos lados sacar uma comparação envolvendo nazistas, holocausto ou Hitler atinge 100% – não importando se o assunto em pauta é a fome na África ou a taxa de suicídios na Dinamarca.

Formulada pelo advogado Mike Godwin em 1990 – em tom de brincadeira, mas com um impressionante fundo de verdade –, a Lei de Godwin serve para chamar a atenção não apenas para a previsibilidade de alguns argumentos, mas também para aquele tipo de manobra intelectual que embreta o debate de tal forma, que fica quase impossível continuar discutindo a sério.

É o caso, por exemplo, dos discursos (sobre a fome na África ou a taxa de suicídios na Dinamarca...) que desembocam no indefectível “a culpa é da mídia”. As brasileiras querem ter seios grandes? A culpa é da mídia. Sexualização precoce? A culpa é da mídia. Adolescentes violentos? Idem ibidem.

É provável que quem usa essa linha de raciocínio tenha em mente um tipo específico de veículo de comunicação, maquiavelicamente programado para manipular ideias e emoções, mas o fato é que a “mídia” é um balaio de gatos informe que não se encontra em estado puro na natureza.

O poder midiático só existe em relação a um determinado público, que, por sua vez, consome e legitima seus valores de alguma forma. O que a explicação “midiática” fornece, mais do que uma análise profunda de qualquer coisa, é uma espécie de terceirização da culpa. Como se a sociedade fosse melhor do que a mídia que ela consome e não, em grande parte, reflexo dela ou parte dela.

O recurso retórico de culpar a mídia por todos os males morais tornou-se ainda mais anacrônico depois que as redes sociais passaram a expor, em tempo real, a reação individual a determinados temas, antes de qualquer tipo de mediação.

As redes sociais revelam como indivíduos interligados reagem diante de assuntos considerados “midiáticos”, exibindo uma espécie de moral coletiva muito mais interessante, em termos de retrato sociológico, do que a posição passiva do espectador/leitor manipulado.

Esta semana, graças à avalanche de piadas no Twitter, ficamos sabendo, por exemplo, que boa parte dos brasileiros considera praticamente intolerável que Sandy, associada até hoje ao perfil virginal da adolescência, fale a respeito de prazer e sexo anal em uma entrevista.

Esta semana, também vimos que havia uma bolsa de apostas virtual dedicada a acertar a data da morte de Amy Winehouse – a vítima perfeita para o tipo de curiosidade mórbida a respeito da desgraça alheia que boa parte de nós alimenta.

Pode-se colocar a culpa na mídia, na voracidade capitalista, na crise de costumes, mas por trás de cada fenômeno de massa existe uma moral individual, uma escolha particular.

E essa escolha, muitas vezes, é consumir a vida dos artistas como se eles fossem personagens de uma grande telenovela: previsíveis, sem nuanças e condenados a viver não as próprias vidas, mas um roteiro escrito unicamente para alimentar o nosso voyeurismo.

sexta-feira, 29 de julho de 2011


JOSÉ SIMÃO

Ueba! Cuidado! Dilma na pista!

E o Sarney hoje acordou revoltado. O Ricardo Teixeira tá há mais tempo no poder que ele

Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto de Bueiros Aires! Olha esta faixa em loja do Rio: "Promoção igual a bueiro. VAI ESTOURAR!". Rarará! E um leitor acha que tem que encher os bueiros de políticos pra estourar junto. E este adesivo aqui: "Jesus te ama, mas eu te acho um idiota". Rarará!

E o Elano Errano? Diz que o único chute que o Elano acertou foi no traseiro da ex-namorada. E a morte da Amy está em "diversão" no site Terra. E adorei a menina que botou a foto da Amy e escreveu embaixo: "Que chique! Morri!". Rarará!

E o Sarney hoje acordou revoltado. O Ricardo Teixeira tá há mais tempo no poder que ele. Aliás, sabe o que o Sarney gritou? "Estou no poder apenas há 50 anos, agora vocês vão encher o saco do Ricardo Teixeira." Vamos!

O Neymar é o Caisempre e o Ricardo Teixeira é o Cainunca. E a filha que é diretora da Copa? Então CBF quer dizer Confederacão Brasileira da Família. Do Ricardo Teixeira. Ele é genro do Havelange. CBF é dinastia e dirigente é cargo hereditário!

E a Dilma, de tanto assinar demissão no Dnit, tá com tenDnit! Tendinite é infame! E mudanças nas placas de estradas. Agora é: "Coitado! Homens Demitidos". E outra: "Dilma na Pista". E a "Fazenda 4"? Um leitor me disse que a Valesca Popozuda não senta, faz baliza. Se a Valesca Popozuda sentar, alguém morre soterrado!

E sabe como se chama o chefe da área de crédito do BNDES? Marcelo PORTEIRO. Ai, seu Porteiro, me deixa entrar que eu preciso duma grana! É mole? É mole mas sobe!

E mais predestinados. Chefe da farmácia da Santa Casa de Laranjal Paulista: Sarajane GARDENAL. E o gerente de relacionamento do Banco do Brasil: Alexandre PISÃO! E eu conheço um mímico chamado Leandro Calado. Rarará! O brasileiro é cordial.

Mais uma placa do Gervásio na empresa em São Bernardo: "Se eu souber que algum gotembólio daqui está se negando a doar sangue porque tem cagaço de agulha, vou pegar esse vacilão e fazer ele ter as artérias do corpo dissecadas por um bando de morcegos carnívoros. Conto com todos. Assinado: Gervásio". O Gervásio devia trabalhar no Ministério da Saúde.

E sabe como é campanha de doação de sangue em Portugal? "Doe! Talvez não doa tanto". Rarará! Nóis sofre mas nóis goza! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

simao@uol.com.br


29 de julho de 2011 | N° 16776
EDITORIAIS ZH


O pesadelo da saúde

Poucas vezes, a população gaúcha foi confrontada de maneira tão chocante com os dramas enfrentados cotidianamente por pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), como vem ocorrendo com a série de reportagens denominada Pesadelo da Saúde, que a RBS TV vem apresentando esta semana.

Cada episódio é uma dor: perda de vidas, amputações, agravamento de doenças motivado unicamente pela falta de atendimento adequado. Espera-se que, com a amplificação dessa realidade dolorosa, as autoridades se disponham finalmente a tomar alguma providência para atenuar o sofrimento dessa parcela negligenciada da população gaúcha.

Embora o descaso dos governantes com a saúde seja histórico no país, é difícil entender como situações envolvendo tanto sofrimento possam se estender indefinidamente e até se agravar.

Os relatos mostram mais que pessoas enfermas viajando centenas de quilômetros entre seus municípios de origem e centros maiores, particularmente Porto Alegre, em busca de atendimento especializado. Incluem desde pais que perderam o filho por falta de ambulância para transportá-lo ao local adequado até um descontrolado exército de amputados, formado em grande parte por diabéticos sem atendimento.

E o que dizer de quem perde a visão pela demora na marcação de consulta com um oftalmologista e, mais ainda, com um cirurgião? Ou, então, de quem tem consciência de estar morrendo por uma doença que poderia ser curável se tivesse acesso a tratamento?

Políticos são eleitos para o Legislativo ou como gestores públicos para encarar problemas desse tipo, primeiro declarando-os prioritários e, de imediato, adotando providências objetivas, que possam pôr fim de vez ao sofrimento de tantas pessoas.

Obviamente, a solução depende de recursos na quantia necessária – uma das atribuições dos administradores é justamente a de encontrá-los –, mas também de uma melhora na qualidade da gestão no setor público. O que precisa ocorrer é uma providência cabal, imediata, que acene pelo menos com uma perspectiva de fim desse pesadelo tristemente real.


29 de julho de 2011 | N° 16776
ARTIGOS - José Sperotto*


Free shops do lado de cá

Grande número de cidades da região da fronteira do Rio Grande do Sul com o Uruguai sofre com a falta de perspectivas para o desenvolvimento econômico e, consequentemente, social. Seu comércio vem definhando ao longo de anos. Indústrias, de pequeno ou grande porte, nem projetam se instalar por lá. Enquanto isso, as cidades do outro lado da fronteira têm seu comércio solidificado a cada ano, vivendo um eldorado moderno. Por lá há empregos, por aqui, desesperança.

A riqueza de nossos irmãos uruguaios está se acumulando a partir dos consumidores verde-amarelos. Dezenas de milhares de brasileiros, de carros, ônibus, ou de qualquer outra forma de transporte, vão diariamente fazer compras nas cidades uruguaias. Em 2010, por exemplo, calcula-se que gastaram mais de US$ 1 milhão, em compras de bebidas, tênis, perfumes e outros produtos adquiridos nas lojas “hermanas”.

Todo esse dinheiro, todavia, poderia estar gerando renda e, acima de tudo, elevando a autoestima da população fronteiriça. Como? Com uma simples medida: parte dos problemas poderia ser resolvida com a abertura dos free shops do lado de cá, nas cidades gêmeas na zona de fronteira.

Nos últimos dias, participei de audiências públicas nas quais ouvi, das lideranças e também dos próprios moradores, um clamor pela urgente aprovação do projeto de lei nº 6.316/2009, de autoria do deputado federal Marco Maia (PT), que prevê a abertura de “lojas francas”, em cidades gêmeas do território nacional brasileiro, que sejam ligadas por estradas federais asfaltadas.

Desta forma, em vez de o nosso suado dinheiro ir embora para a “banda oriental”, podemos fazer com que ele fique rendendo no lado de cá, permitindo a geração de emprego e renda. Assim, as atuais e as futuras gerações poderão ter emprego nos municípios de Chuí, Jaguarão, Aceguá, Santana do Livramento, Quaraí e outras localidades que fazem fronteira também com a Argentina.

A implantação dos free shops nas fronteiras do Brasil é uma demanda apartidária, que busca estancar o empobrecimento das populações locais e a migração. Não dá mais para fechar os olhos, a solução mais rápida é a união da sociedade em prol da aprovação desse projeto em Brasília.
*Deputado estadual (PTB), vice-presidente da Assembleia Legislativa


29 de julho de 2011 | N° 16776
PAULO SANT’ANA


Querem me irritar

Os meus leitores são mesmo uns gozadores. Escrevi aqui que não ia ler mensagens que me mandassem, se elas tivessem mais de 15 linhas. E não vou mesmo, tem gente que manda textos de 90 linhas. E, como leio todas as mensagens, eu me esfalfo.

Então o obediente leitor e-mail: dmelo63@hotmail.com me mandou uma mensagem com exatamente 15 linhas. Ei-la:

“1)- Não cerquem a Redenção

2)- Não cerquem a Redenção

3)- Não cerquem a Redenção

4)- Não cerquem a Redenção

5)- Não cerquem a Redenção

6)- Não cerquem a Redenção

7)- Não cerquem a Redenção

8)- Não cerquem a Redenção

9)- Não cerquem a Redenção

10)- Não cerquem a Redenção

11)- Não cerquem a Redenção

12)- Não cerquem a Redenção

13)- Não cerquem a Redenção

14)- Não cerquem a Redenção

15)- Não cerquem a Redenção”

Todos os médicos que me atendem dizem o mesmo: eu tinha de parar de fumar.

Mas o único que me levou a um canto do consultório e me disse ontem, com ar grave, o seguinte, foi o Dr. Nédio Steffen: “Vais ter de parar de fumar”.

Estou com esse encargo me pesando mais que a ameaça de o Grêmio descer para a segunda divisão.

Não tenho forças para parar de fumar. Não sei como vou fazer.

Mas tenho de parar.

Já expliquei tantas vezes, mas parece que não entendem: no dicionário, o significado de time rebaixado é exatamente aquela equipe que não ganha jogos dentro de sua casa.

Por isso é que eu digo...

Se, amanhã à tardinha, o treinador do Grêmio, Julinho Camargo, não formar uma super-retranca contra o Flamengo, nós perderemos o jogo por 5 a 0.

Se armar a super-retranca, poderemos perder por 1 ou 2 a 0.

E, se perder amanhã, o Grêmio ingressa na zona de rebaixamento.

Credo em cruz! Haja falta de talento pra formar um time pelo menos médio!


29 de julho de 2011 | N° 16776
DAVID COIMBRA


Esses diferentes são todos iguais

Li que o psicopata norueguês que assassinou 76 pessoas em Oslo é um “fundamentalista cristão”. Ou seja, trata-se de um adepto radical do cristianismo. Que é, todos sabem, a religião do amor. No seu grande manifesto filosófico, o Sermão da Montanha, Jesus disse: “Amai ao próximo como a ti mesmo”.

Mais até. Ele disse: “Amai aos vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, orai pelos que vos maltratam e perseguem”. Logo, um fundamentalista cristão deveria ser uma pessoa que ama incondicionalmente as outras pessoas, que entende o significado revolucionário de oferecer a face esquerda quando alguém lhe aplica uma bofetada na direita. Deveria ser um adepto da paz e do entendimento entre os homens.

Qual é o problema daquele norueguês, então? Qual é o problema de outros tantos cristãos convictos que lutaram contra os muçulmanos em Cruzadas, queimaram mulheres em fogueiras, supliciaram hereges, submeteram índios pela força das armas e, ainda hoje, matam, roubam e exploram o próximo? Será que esses cristãos todos padecem do terrível mal que atormenta o povo brasileiro, a interpretação de texto defeituosa? Não pode ser. É gente demais.

Provavelmente eles entenderam tudo o que a religião deles prega, mas não têm interesse em agir de acordo com suas próprias crenças. Porque o cristianismo diz que todos somos iguais, e essa é uma ideia insuportável. As pessoas querem, desesperadamente, ser diferentes.

A vida inteira lutam por isso, para se diferenciar dos outros. Não querem que os outros sejam seus “semelhantes”, querem que sejam diferentes. O patriotismo, o nacionalismo e o racismo se alimentam desse conceito, o de que as pessoas são diferentes.

Não faz muito, um aluno de História de uma universidade gaúcha escreveu um trabalho em que se referiu a questões “multirraciais”. Algo mais ou menos na linha do psicopata norueguês. Estamos no século 21 e ainda há pessoas que acreditam em raça. Pesquisas com DNA, testes com Carbono 14, a Ciência com cê maiúsculo, enfim, já provou que somos todos misturados, nós, humanos, que todos viemos do mesmo lugar, a mãe África, e que não há, e nunca deve ter havido, uma chamada “raça pura”.

Em essência, que o conceito de raça é falso, que raça não existe. Está tudo escrito, explicado por historiadores, por cientistas, por filósofos: não existem diferenças espirituais, físicas e intelectuais entre os seres humanos. Somos todos iguais, seja qual for a cor da pele ou a textura do cabelo. Isso é detestável para quem se crê diferente.

O curioso é que as pessoas que mais querem ser diferentes não toleram diferenças. Homofóbicos arrancam orelhas de supostos gays a dentadas, antitabagistas tentam proibir o fumo até em parques, ecologistas chutam carros nas ruas, europeus brancos fecham as fronteiras a africanos negros.

Não toleram diferenças, mas passam a vida a ressaltar o quanto eles são diferentes e chegam a defender suas diferenças a bala. E eis aí a razão de grande parte do sofrimento da Humanidade: é o fato de haver quem acredite que ser diferente é o mesmo que ser melhor.

quinta-feira, 28 de julho de 2011


CONTARDO CALLIGARIS

Asilo político para Berlusconi

Se o Brasil quiser abrigar as "vítimas" do Judiciário italiano, melhor que comece com Berlusconi

A Itália existe há um século e meio. Em Veneza, monumentos temporários propõem a inscrição: "A nossa história juntos cumpre 150 anos". Gostei: uma nação não é uma realidade étnica nem geográfica, mas a sensação de uma história comum, ou seja, de que compartilhamos um patrimônio de lembranças e de esperanças.

Em campo Manin, alguém pichou o monumento: "Manin era veneziano, não italiano". É curioso, Daniele Manin só podia ser veneziano: morto em 1857, ele nem viu a Itália existir. Mas o fato é que, nos últimos 15 anos, vingam bairrismos separatistas que não se conciliam bem com as festividades.

Enfim, quis tomar a temperatura do sentimento nacional italiano no aniversário dos 150 anos. Fui assistir a "Nabucco", de Verdi, na arena de Verona ("Nabucco", aliás, está em cartaz no Theatro Municipal do Rio de Janeiro nesta semana).

"Nabucco", de 1842, estabeleceu a fama e a fortuna de Verdi. A ópera é um drama da paternidade (no estilo "Rei Lear", um pai não entende uma filha e é traído pela outra) e um drama religioso (o deus dos judeus triunfa sobre o ídolo pagão dos assírios), mas, antes disso, é o drama do exílio de um povo arrancado à sua terra (os hebreus cativos na Babilônia). Esse drama é resumido pelo coro do terceiro ato, "Vá, Pensiero", cujo tema está presente desde a abertura e que foi recebido, na época, como o canto da nostalgia de uma pátria que os italianos ainda não tinham:

"Vai, pensamento, sobre tuas asas douradas, / Vai e te pousa sobre os clivos e os montes, / Onde mornas e doces exalam seu perfume as auras do sol nativo. / Saúda as beiras do Jordão / E as torres destruídas de Sião; / Oh, minha pátria, tão linda e tão perdida, / Oh, lembrança tão querida e tão fatal...".

Os 20 mil espectadores da arena de Verona escutaram num silêncio comovido, pediram e obtiveram o bis (tradicional no caso de "Vá, Pensiero"). Expressão de um nacionalismo canalha? Acho que não. Nos sentimentos que o coro evoca hoje (e talvez já na intenção de Verdi), há muito mais do que patriotismo: o coro é um hino para todos os que são arrancados à sua morada pela guerra, pela fome, pela violência dos outros e da natureza ou mesmo por seus próprios sonhos de "vida melhor".

Talvez os italianos o ouçam como um hino seu porque a modernidade os dispersou mundo afora e faz que, hoje, eles assistam à chegada à Itália de desterrados muito parecidos com eles mesmos poucas décadas atrás.

Como fica, nesse clima, o sentimento italiano em relação ao Brasil que concedeu asilo a Cesare Battisti? Nenhuma raiva nacionalista --apenas consternação com os argumentos brasileiros e a ignorância que eles manifestam da Itália das últimas décadas.

Para um italiano, a ideia de que alguém queira proteger Battisti da "Justiça de Berlusconi" é para além de cômica, pois juízes, promotores e policiais, com custos altíssimos (inclusive de vida), são 1) os que garantiram a sobrevivência da democracia italiana nos anos do terrorismo de esquerda e direita, quando Battisti operava, e 2) os que hoje defendem a legalidade democrática contra o "império" berlusconiano.

Esse estado de espírito é representado por uma coluna de Michele Serra, no "L'Espresso" da última quinta (21). Num processo que durou 20 anos, a Justiça condenou a Fininvest, de Berlusconi, a pagar 560 milhões de euros (R$ 1,4 bilhão) de indenização por ter corrompido um juiz que arbitrou a distribuição do controle acionário do grupo editorial Mondadori; agora, Serra imagina como Berlusconi poderia evitar pagar:

"Sendo impraticável o exílio para a Líbia (o risco de ser bombardeado pela Aeronáutica italiana é alto demais), Berlusconi poderia pedir asilo político ao Brasil, explicando a Lula que ele é vítima de uma infame perseguição política, assim como Cesare Battisti, e que ele tem muitos amigos entre os intelectuais franceses, entre eles Sylvie Vartan.

Para ser mais crível, Berlusconi está treinando para ver se ele consegue escrever romances policiais, mas as primeiras tentativas são decepcionantes: entende-se já, desde o primeiro parágrafo, que o culpado é sempre o juiz comunista".

Concordo, se realmente o Brasil quiser abrigar as "vítimas" do Judiciário italiano, melhor que comece (ou continue) com Berlusconi.

ccalligari@uol.com.br


28 de julho de 2011 | N° 16775
EDITORIAIS


A REAÇÃO À CRISE

Até hoje criticado pela demora em se dar conta do impacto da crise de 2008, o Ministério da Fazenda age bem ao demonstrar que, desta vez, não está paralisado diante das consequências inevitáveis da agonia de algumas economias importantes da União Europeia e da possibilidade de moratória na dívida norte-americana. Desta vez, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, agiu rápido, preocupado em evitar a continuidade da excessiva especulação com o dólar.

Os primeiros resultados das decisões tomadas – entre as quais maior taxação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) dos chamados derivativos cambiais, que influem na formação dos preços da moeda norte-americana – foram registrados ontem mesmo: depois de vários dias de queda em relação ao real, o dólar voltou a subir. Esse é apenas o começo da reação oficial, mas o Planalto, pelo menos, demonstra estar atento aos riscos da inação e do impacto inevitável para os brasileiros.

O anúncio das medidas cambiais e a expressiva alta do dólar coincidem com a confirmação, pela Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento e Comércio (Unctad, na sigla em inglês), de que o Brasil passou da 15ª para a quinta posição entre os maiores destinos de investimento direto no mundo. Ficou atrás apenas de Estados Unidos, China, Hong Kong e Bélgica.

Esses investimentos são diretos, destinados ao setor produtivo, mas não é impossível que pelo menos parte dos recursos transite algum tempo pelo mercado financeiro, aproveitando a taxação menor.

O que precisa preocupar os responsáveis pelo gerenciamento da política econômica, porém, são os recursos resultantes da liquidez internacional que ingressam no país atraídos pelos ganhos imediatos propiciados pelas taxas de juros recordes e pela pujança da economia brasileira.

Em entrevista concedida ontem, quando as novas medidas entraram em vigor, o ministro da Fazenda garantiu que o Brasil dispõe de um “arsenal” maior para usar na questão cambial. É importante que saiba usá-lo também na dose e no momento adequados, procurando atenuar não apenas os efeitos perversos da irrealidade cambial no mercado interno como também a especulação, que torna a economia excessivamente suscetível num momento de mais incertezas.

O país precisa agir a tempo de reduzir a vulnerabilidade de sua economia e proteger o setor produtivo, particularmente num momento de maior tensão devido à crise da dívida norte-americana e de nações da União Europeia. É difícil imaginar que, confirmadas as previsões mais pessimistas no cenário externo, o país possa sair ileso.

O que o Brasil precisa é reforçar continuamente os pilares de sua estabilidade econômica. Não há melhor forma de garantir condições adequadas a quem produz tanto para o mercado interno quanto para o externo, assegurando a continuidade da expansão da economia, mesmo num cenário internacional adverso.


28 de julho de 2011 | N° 16775
ARTIGOS - Susana Kakuta*


Para inovar não bastam palavras

Estive agora quase um mês na Coreia do Sul. Desta vez, a convite do seu governo, para conhecer mais o chamado Milagre Coreano, uma revolução socioeconômica baseada na economia do conhecimento. Voltei impressionada e com algumas certezas.

Em 1962, a Coreia era um dos lugares mais pobres do mundo, com PIB per capita de US$ 87 e exportações de US$ 40 milhões, baseadas em produtos primários. Em 2007, já se posicionava como uma das mais dinâmicas nações comerciais do mundo, com PIB per capita de US$ 20 mil e um volume de exportações de US$ 730 bilhões, em semicondutores, computadores, automóveis, navios e produtos petroquímicos.

Para chegar a esse patamar, o país construiu uma estratégia em que todo desenvolvimento é resultado da economia do conhecimento, passando por três fases distintas: de “seguidor” de tecnologias para “imitador” e, recentemente, para a fase de “inovador”.

Lá não se fala em educação sem que haja estreita correlação com a tecnologia, mas não só a vinculada às ciências exatas. Por outro lado, a estratégia nacional fez nascer o Ministério da Economia do Conhecimento, encarregado de estimular a repatriação de talentos, fazer investimentos em ambientes de inovação, acelerar a geração e a comercialização de patentes, além de fomentar o enfrentamento da globalização pela via da agregação de valor.

Também a cooperação e o papel do governo, do setor privado, das universidades e dos centros de tecnologia vêm crescendo nos últimos anos, levando a Coreia do Sul a avançar da 21ª posição, em 2002, no ranking mundial da competitividade do IMD (Institute for Management Development, da Suíça), para 14ª em 2009.

E é nessa opção de desenvolvimento que a nação tão admirada do Extremo Oriente prossegue. Não é à toa, portanto, que a Coreia do Sul é líder mundial em alguns segmentos: primeiro lugar em produção de memórias DRAM, tecnologia LCD e construção naval; segundo lugar em celulares com tecnologia CDMA; quarto em automóveis; e quinto em petroquímica.

Estratégia, foco, consenso e continuidade são palavras fundamentais e elas não me saem da cabeça. Temos dificuldade em colocar na prática tais palavras no Brasil. Mas mantenho sempre esperança de que algo mude, assim continuo apostando num país que pode muito mais do que já é hoje.

Espero que a Política de Desenvolvimento Produtivo traga novidades, especialmente as que garantem planejamentos de longo prazo, rumo a um Brasil que seja sinônimo de geração intensiva de inovação.

*Diretora executiva do Parque Tecnológico São Leopoldo – Tecnosinos


28 de julho de 2011 | N° 16775
PAULO SANT’ANA


Os salários policiais

No encontro em que recebeu os principais colunistas de jornal, o governador Tarso Genro mostrou-se atento ao problema salarial dos servidores policiais gaúchos.

O governador disse não lhe escapar que o piso salarial dos policiais é tão insuficiente, que, por lei, os PMs só trabalham seis horas diárias, daí que lhes pagam mais duas horas extras diárias para atenuar-lhes as dificuldades.

Isso quanto ao piso, sem falar na parte de cima da pirâmide, os oficiais da BM e os delegados de polícia.

O governador sofre, de um lado, a pressão do orçamento. Do outro lado, a pressão dos delegados de polícia, que querem se equiparar às carreiras jurídicas.

Segundo se noticiou, a ex-governadora Yeda Crusius, em final de seu mandato, já tinha elaborado projeto de lei que vinculava os delegados de polícia às carreiras jurídicas. Só não o enviou à Assembleia porque sofreu contrapressão dos oficiais da BM, que desejavam que a vantagem aos delegados lhes fosse também estendida.

No fim, nem os delegados nem os oficiais brigadianos subiram de posição salarial.

Ficou evidente ser pouco inteligente a posição dos oficiais da BM. Se a Assembleia Legislativa aprovasse o projeto dos delegados, inevitavelmente teria mais tarde de equiparar os oficiais da Brigada Militar às autoridades policiais civis.

Porque há 50 anos que os delegados de polícia estão equiparados aos oficiais da BM, o que se tornou uma tradição tão forte, que ninguém ousaria extinguir.

O fato indiscutível é que, por declaração expressa de Tarso Genro, o governo vai aumentar o piso dos servidores policiais, os PMs e os investigadores. Desde que era ministro da Justiça, o governador Tarso Genro se dedica à tarefa de remunerar melhor os policiais.

Os do piso salarial serão aumentados. E os de cima da pirâmide terão de esperar, mas o governador também está de olho neles.

Como está também prestando atenção aos reclamos dos professores e vai agir nesse sentido.

O vídeo do meu comentário no Jornal do Almoço do dia 18 de julho passado, quando pedi demissão da RBS por ter previsto que Falcão seria demitido dentro de “três meses”, o que de fato ocorreu em três meses e dois dias, tendo portanto errado em dois dias, atingiu a cifra recorde de 119.354 acessos, um montante jamais visto, no YouTube.

Centenas de milhares de pessoas acreditaram que eu seria demitido. Minha empregada doméstica veio me dizer que, se eu tivesse dificuldades pela minha demissão, aceitaria que seu salário fosse reduzido em 50%.

E as telefonistas de Zero Hora afirmaram que as pessoas telefonavam aos magotes, dizendo que, se eu fosse demitido, cancelariam suas assinaturas deste jornal.

Impressionantes as comunicações.

Foi doloroso ver o Grêmio empatar no Olímpico ontem. Nunca se viram tantas mediocridades reunidas num só time. Quem formou esse elenco tem de se afastar imediatamente do futebol.

Entre os medíocres e sofríveis, André Lima e Leandro.

O Grêmio continua ameaçado de rebaixamento, tanto que entre os últimos colocados, podem olhar, não existe nenhum time pior que este Grêmio.


28 de julho de 2011 | N° 16775
L. F. VERISSIMO


O resto

Anders Behring Breivik é um belo espécime de raça superior. Aquela que, segundo ele, deve se defender da mestiçagem e do multiculturalismo para não perder sua identidade, sua religião e finalmente seu espaço numa Europa ocupada por inferiores. E Breivik não contribuiria apenas com sua boa estampa para hipotéticos cartazes promovendo a causa.

Ele próprio é um exemplo da eficiência e da produtividade que caracterizam a raça nórdica, em contraste com as outras e com os mestiços. Fazer o que ele fez, em tão pouco tempo, requer uma organização e uma racionalização de meios incomuns. Como já se disse sobre a política de extermínio dos nazistas, abstraindo-se o resto a simples engenharia do feito foi admirável.

O “resto” a ser abstraído são os milhões de seres humanos assassinados pela engrenagem mortal, certo. Mas julgada pela eficiência e a produtividade, que para Breivik distinguem os puros dos híbridos e das raças menores, a engrenagem funcionou. Seu pequeno genocídio de noruegueses inocentes também funcionou. Assim, ao mesmo tempo que sua estampa nos mostra um ideal da raça que deve ser preservada, ele nos dá uma aula prática da sua superioridade. Se conseguirmos abstrair o “resto”, claro.

Chico

O crítico Edward Said escreveu sobre o “estilo tardio” que em muitos casos – o Beethoven dos últimos quartetos é o exemplo mais notório – distancia o artista do seu público. O artista quer evoluir e experimentar e o público quer a repetição do que gosta.

No caso do Chico Buarque, o estranhamento causado pelo seu novo CD pode durar uma ou duas audições de algumas das músicas (com outras, a rendição é instantânea), mas não resiste à terceira audição, quando o estranhamento vira encantamento.

Chico experimenta com rimas insólitas e sutilezas tonais (esmiuçadas naquele antológico artigo do Artur Nestrovski sobre o disco no Estadão, e pelo Wisnik no O Globo, semana passada), letras que misturam naturalmente o coloquial e o literário, canções que se esfarelam num quase recitativo, um blues e até um dueto de amor inevitável, que termina com o moço e a moça cantando “e lalari, lairiri” em vez de completar a letra. O estilo tardio do Chico é um estilo rarefeito, mas insista. O estranhamento acaba logo. E mal dá para esperar o que virá depois.

Definição

Ouvi uma perfeita definição de super-herói, que serve para todos:

– São aqueles caras que usam a cueca por fora das calças.

E...

E lalari, lairiri.

quarta-feira, 27 de julho de 2011


ANTONIO PRATA

Obituário

Panachão só voltou ao Brasil no mês passado, bastante debilitado pela doença, para morrer na casa de infância

SERÁ ENTERRADO nesta quarta-feira, em Arapiromba do Alto, oeste paulista, o grande físico e músico experimental Eurico Panachão. Não se envergonhe o leitor se jamais tiver ouvido falar nesse nome, nem estranhe se os jornais de hoje não dedicarem uma única linha à morte do professor -consequências esperadas da desimportância que se dá à ciência por estas plagas.

Felizmente, o ilustre arapirombense não precisou de nosso reconhecimento: recém-formado, foi contratado pela South Virginia University, nos EUA, onde lecionou por cinco décadas e desenvolveu relevantes pesquisas envolvendo física e música. Só voltou ao Brasil no mês passado, já bastante debilitado pela doença, para morrer na casa de infância, próximo aos familiares e ao Mercado Santa Terezinha -onde tudo começou.

Se Newton teve a maçã, Arquimedes, uma banheira, e Mendel, as ervilhas, a fagulha de Eurico Panachão foi um carrinho de supermercado. Um dia, ajudando a mãe a levar as compras para casa, o jovem estudante de física reparou no sonoro tremelique que o carrinho dava ao passar pelas ranhuras da calçada. Panachão, que também era músico e apreciador do samba, teve naquele momento um insight: viu as ruas de Arapiromba como uma enorme partitura, o carrinho como um instrumento e entendeu a que dedicaria sua vida.

A primeira peça para "carrinho e calçada" foi executada no dia seguinte. Ajudado por dois amigos, Panachão fez diversas ranhuras no concreto, ao longo de um quarteirão, a distâncias previamente calculadas, de modo que o carrinho, passando sobre elas a uma velocidade constante, sacolejasse no mesmo ritmo do pandeiro em "Um a Zero", de Pixinguinha.

Durante semanas, o cientista fez exaustivas experiências com carrinhos cheios e vazios, novos e usados, com ou sem "cadeirinha", até conseguir criar, usando dez deles simultaneamente, em dez "trilhas" paralelas, o efeito de uma verdadeira escola de samba.

O grande salto de Panachão, contudo, que lhe rendeu elogios de Hermeto Pascoal a Stephen Hawking, foi quando decidiu que os carrinhos deveriam ser conduzidos pela gravidade, e passou a fazer experimentos em ladeiras. A maior dificuldade era calcular a razão entre a aceleração dos "instrumentos" e a distância das ranhuras: afinal, ao longo do trajeto, eles iam ganhando velocidade, mas a música deveria, sempre, manter-se no mesmo andamento.

As fórmulas desenvolvidas para essas composições eram tão complexas -incorporavam variáveis como a inclinação do solo, o atrito, o vento, a propagação das ondas sonoras- que chegaram a ser usadas nas missões Apolo, ajudando a calcular a aceleração e o ângulo de entrada dos módulos espaciais na atmosfera. Há boatos, inclusive, de que os russos tentaram levar Panachão para seu programa espacial, em 1967.

O ilustre arapirombense, contudo, teria recusado, alegando estar muito ocupado em seu grande projeto, jamais concluído: uma sinfonia percussiva para neve e 130 trenós, a ser executada numa encosta do Everest.

Panachão morreu ontem, em casa. O velório realizar-se-á no Mercado Santa Terezinha e o enterro está marcado para as 16h30, no cemitério Bom Jesus, Arapiromba do Alto, São Paulo, Brasil.

antonioprata.folha@uol.com.br

JOSÉ SIMÃO

"A Fazenda 4"! A lhama é gostosa!

Essa história de maldição dos 27 anos tá hilária! O Justin Bieber tem quantos anos mesmo? Rarará!

Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O Esculhambador-geral da República! E esta do site Eramos6: "Com medo de morrer aos 27 como Amy, Kurt Cobain, Janis Joplin e Jim Morrison, cantor português se mata aos 26 anos". Melhor prevenir que morrer. A mim não me pegarão! Rarará!

Essa história de maldição dos 27 anos tá hilária! O Justin Bieber tem quantos anos mesmo? E diz que o Niemeyer já está preparado pra enfrentar a maldição dos 127!

E um leitor me mandou perguntar: "Minha sogra me enche a paciência há 26 anos, será que o ano que vem ela vai pro saco?". Rarará! E sabe como se chama o cabeleireiro da

Amy? Alex Foden! Tá explicado! Rarará! E atenção! Novidades de "A Fazenda 4"! E a Valesca Popozuda: aquilo não é uma bunda, é um altar! Diz que a bunda da Popozuda não tem ânus, tem séculos!

E olha o e-mail de um leitor: "Depois de ver a beiçola da Renata Banhara e as pelancas da Monique Evans, vou olhar com mais carinho pra minha esposa". Rarará!

E como disse o site QMerda: "A lhama é mais gostosa que a Monique Evans!". Rarará! E os bueiros do Rio? A Light devia encher os bueiros de confete e, quando explodir, começava o Carnaval. Ueba! E lá no Rio não pode mais usar aquela expressão "o que vem de baixo não me atinge".

E a Dilma no Dnit do Dmit? A Dilma já tem novo apelido: BOBCAT! Misto de trator com escavadeira. E o Piauí Herald: "Ministério dos Transportes aprova rodízio de propinas". E diz que os flanelinhas estão cobrando R$ 20 pra incluir os 30% do assessor do Dnit!

E um leitor me disse que a Dilma devia desenterrar a vassourinha do Jânio. "Varre, varre, vassourinha." E vão ter que pedir emprestado o Buffalo da FAB pra transportar os demitidos! Os dilmitidos! Podem demitir todos nos Transportes. Menos o motorista e o cobrador!

E esta: "'Fazenda 4' tira audiência, mas não bate 'O Astro'". Então bota um turbante na bunda da Popozuda com uma ametista no meio do fiofó! "Meu fiofó éééé ametista!"

E com aquela oferenda que os fãs botaram na porta da casa da Amy, ela não morreu, virou orixá! E eu conheço um cara que trabalha com enfeites de Natal e se chama Ricardo Ghirlanda. Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje só amanhã! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

simao@uol.com.br

FÁBIO TAKAHASHI - DE SÃO PAULO

FGV cria graduação em administração pública

Profissional poderá atuar em governos, partidos políticos, ONGs e empresas

Curso começará no ano que vem e mensalidade custará R$ 2.531; parte da nova graduação será realizada no exterior

A partir do ano que vem, a FGV-SP oferecerá uma nova graduação: administração pública, que exigirá parte dos estudos no exterior.

Com 50 vagas por vestibular, o curso será em tempo integral e custará R$ 2.531 ao mês. Até este ano, a área pública era apenas uma habilitação do tradicional curso de administração da escola.

Foi gratuita até a década de 1990, quando era custeada pelo governo de SP.

A avaliação da FGV-SP é que, em geral, a opção atraía alunos não suficientemente engajados, pois a maioria escolhia administração de empresas como primeira opção e ia para pública para aguardar vaga na opção inicial.

Outra explicação, afirma a escola, é que tem aumentado a demanda por profissionais com boa formação para atuar no poder público, em ONGs e em empresas privadas com negócios com governos.

A instituição aproveitou a mudança para selecionar melhor os calouros e alterou o projeto pedagógico. Agora, o aluno deverá estudar um bimestre no exterior.

O graduando deverá ir para uma instituição parceira de ensino e pesquisa da América Latina, China, Índia ou África de língua portuguesa.

"Queremos que o estudante sinta a realidade local de países onde a inserção do Brasil já é forte e tem aumentado", disse o coordenador do curso, Fernando Abrúcio.
A princípio, o período no exterior será financiado pelo próprio aluno, mas a FGV-SP deve negociar auxílios financeiros para a viagem.

O curso buscará ainda melhorar a relação entre conhecimento prático e teórico. Aulas expositivas serão de manhã e, à tarde, haverá atividades como estudos de caso.
"O mercado para administrador público é grande", disse Carlos Monteiro, consultor de universidades.

"Municípios, por exemplo, precisam de profissionais que façam gerenciamento, independentemente do prefeito eleito."

Presidente do conselho regional de administração, Walter Sigollo também concorda com o curso. "Quem trabalha no setor público precisa conhecer amarras e legislações específicas."

terça-feira, 26 de julho de 2011



26 de julho de 2011 | N° 16773
LIBERATO VIEIRA DA CUNHA


Viagens de trem

Tomo um táxi e, sem razão nem porquê, o motorista começa a falar de trens. Nasceu na Fronteira e o tema lhe desperta agradáveis recordações. Era passageiro do Minuano, uma composição dotada de amplas poltronas e, especialmente, de um vagão-bar, onde você podia tomar sua cerveja ao ritmo sincopado dos trilhos. Havia também os Húngaros, nos quais lhe serviam o jantar numa badeja móvel, dessas que se encontra hoje nos aviões.

Escuto-o com atenção, mas sem poder me esquecer dos trens em que viajei nos Estados Unidos e na Europa. Os americanos eram burocráticos. O máximo que lhe alcançavam era um cobertor, quando a temperatura lá fora era muito baixa. Já os europeus eram todo um compêndio da arte de viajar.

Primeiro, lhe davam uma cabine, que você precisava dividir com ingleses, alemães, franceses. Segundo, um carrinho passava por sua porta e lhe oferecia drinques e petiscos. Terceiro, a companhia na cabine era agradável – às vezes graciosa e agradabilíssima – e você podia se sentir um eleito dos deuses.

Não esqueço também as viagens no TGV, que uniam Paris a Londres em três horas, sob o Canal da Mancha. Foi igualmente esse bólido que me levou de Paris a Nice, na Côte d’Azur, passando por Marselha. E ali ficava todo um mundo de charme e encantamento, cujo centro e capital era o Principado de Mônaco.

Mas se me perguntarem qual foi a viagem que mais me impressionou, porei de lado uma que me levou de Colônia, na Alemanha, a Paris, para me fixar em outra, bem mais ao sul.

Falo de um trajeto que me conduziu de Munique a Zurique. Era um dia em que nevava muito, e os flocos pintavam o mundo de branco. Eu estava só, numa cabine, quando entrou uma mulher de seus 30 anos, muito bonita.

Percebi, por seu rosto, que sofria. Era francesa e casada. Assim que a composição se movimentou, abriu as torrentes de suas confissões. O seu era um drama não muito incomum, mas mesmo assim emocionava. Escutei-a com atenção e lhe dei alguns conselhos, que nunca soube se usou.

Era uma cena surreal. Toda aquela neve caindo e uma mulher jovem e linda entregando confidências a um desconhecido.

Mas essas são coisas mágicas que só acontecem num trem.


26 de julho de 2011 | N° 16773
CLÁUDIO MORENO


A mão e a escrita

Diziam os antigos – talvez por pura maledicência – que a Academia de Platão tinha concluído que ser bípede e não ter penas bastava para distinguir o homem de todos os demais seres vivos. Pois essa lendária definição, tantas vezes ridicularizada no passado, não desagradaria de todo a uma importante corrente da ciência moderna, que afirma que a humanidade nasceu no momento em que nosso antepassado se pôs de pé.

Ao nos tornamos bípedes, aquelas que seriam nossas patas dianteiras ficaram livres para se transformar em mãos – as quais, juntamente com a linguagem, são consideradas os traços fundamentais para a caracterização de nossa espécie.

A mão não se comporta como os outros órgãos – ela tem algo de particular e extraordinário. Como a linguagem, ela é veículo de significação; ela está ligada ao gesto, ao sinal; ela aponta, ela mostra, ela toma, ela oferece. Ela é a extensão mais importante do cérebro, e dele recebe, com justiça, um tratamento privilegiado.

Na escrita, mais do que nunca, os dois atuam juntos – um não manda no outro, mas são parceiros, num diálogo em que os músculos e a mente ensinam e aprendem ao mesmo tempo. Depois de automatizada, a escrita passa a ser uma dança em que o corpo e o espírito se movem em harmonia; só então se pode dizer, como Cervantes, que a mão que empunha a pena se tornou a língua de sua alma.

A partir desse momento, o jeito de traçar as letras, de ligar umas às outras, de cortar os tês ou pôr os pingos nos is passa a ser uma característica tão particular e inconfundível quanto o meu rosto ou minha voz.

Da mesma forma, os sinais que os pintores depõem em sua tela valem como verdadeiras impressões digitais. Quando o Papa enviou a Florença um emissário para pedir que Giotto, um dos grandes mestres do Renascimento, fornecesse uma amostra de seu trabalho, o pintor simplesmente tomou uma folha em branco e com sua pena, usando um vermelho muito vivo, traçou à mão livre um círculo tão perfeito que, diz Vasari, “era uma maravilha de se ver” – e isso foi suficiente.

Minha letra é também tão pessoal que basta minha assinatura para provar quem sou eu – e por isso mesmo, quando não quero ser identificado, vou me esconder na neutralidade da letra de fôrma.

Pois não é que agora, indiferentes a tudo isso, surgem vozes delirantes a dizer que é desnecessário o ensino da escrita cursiva na escola? Afinal, alegam, se nosso jovem só escreve mesmo no computador ou no celular, por que não alfabetizá-lo diretamente no teclado ou, no máximo, em letras de bastão?

Mas estão cegos e surdos? Não veem o que vamos perder? A criança de hoje deve aprender a usar o teclado, sem dúvida, mas como um acréscimo necessário à sua formação, e não à custa desta aliança essencial entre a mão e a linguagem. A perda seria irreparável.


26 de julho de 2011 | N° 16773
DAVID COIMBRA


Para que serve o passado

Nos anos 60, os Mandarins eram jovens e, como jovens, se reuniam nos bares da cidade, varavam as madrugadas lubrificando os neurônios com álcool, alimentando os olhos com a visão das pernas de louça das moças e tramando, que jovens tramam. Os esquemas de muitos de seus planos foram traçados em guardanapos de papel manchados da gordura dos bolinhos de bacalhau e da espuma dos chopes.

Os Mandarins formavam um grupo de novos dirigentes do Inter. Graças a eles, o clube montaria o melhor time da sua história, nos anos 70. Certo. E o que os Mandarins fizeram de diferente?

Nada.

Os Mandarins aprenderam com os erros do passado, do seu passado, e com os acertos do passado do inimigo. No caso, o Grêmio. Havia década e meia que o Grêmio era hegemônico no Estado devido a um estilo implantado por Oswaldo Rolla, o Foguinho, nos anos 50.

Foguinho instituiu o futebol de marcação, de preenchimento de espaços, o futebol de solidariedade, de valorização do coletivo. Foguinho foi o primeiro treinador a priorizar a preparação física no Rio Grande do Sul, o primeiro a pregar que um jogador tinha de ser útil para todos, não só para ele próprio.

Os Mandarins se debruçaram sobre a experiência vitoriosa do Grêmio, examinaram-na às minúcias, teorizaram a respeito e estabeleceram uma fórmula: os jogadores do novo Inter teriam de possuir duas de três qualidades: técnica, força e velocidade. Assim, um jogador poderia ser técnico e forte, sem ser veloz; ou veloz e forte, sem ser técnico; ou veloz e técnico, sem ser forte; mas jamais poderia ser só técnico, só forte ou só veloz, por mais forte, técnico ou veloz que fosse.

Naquele Inter, Pontes, Cláudio, Vacaria, Caçapava, Dario e Valdomiro eram velozes e fortes, sem ser exatamente técnicos; Figueroa era forte e técnico, sem ser veloz; Lula e Carpegiani eram velozes e técnicos, sem serem fortes; e Falcão era forte, técnico e veloz. Um extraclasse.

Aquele Inter foi uma contundente reação ao Inter do passado, o Inter clássico de quem o símbolo era Bráulio, um jogador puramente técnico, mas pouco participativo. Bráulio transformou-se em cavalo de batalha: eram os “braulistas” contra os “antibraulistas”. Ibsen Pinheiro se alinhava ferozmente entre os últimos. Lembro de quando surgiram os gêmeos Diego e Diogo no Inter, tempos atrás. Eram jogadores pequenos, manhosos e não muito competitivos. Ibsen recomendou:

– Vendam logo, antes que façam sucesso. Porque depois vai ser difícil de vender.

Curiosamente, o Grêmio, que servira de modelo ao Inter, desaprendeu, nos anos 70, as razões de seu sucesso. Os jogadores-símbolo do Grêmio, naquela época, eram Caio e Gaspar, chamados por Lauro Quadros de “Os Amigos da Bola”. Eram amigos da bola, mas não do time. Jogavam para o espetáculo, não para a vitória.

De lá para cá, nunca um time da Dupla Gre-Nal foi vitorioso sem que houvesse entrega dos jogadores, sem que todos jogassem para o coletivo. Paulo César Caju, Tita, Dener e Roger, quando jogaram no Grêmio, continuaram jogando com toda a habilidade que a Natureza lhes deu, mas corriam, marcavam, acossavam o adversário, como a história do clube exigia. Assim, foram amados pela torcida. Assim, se tornaram vencedores.

Douglas, quando jogava no time de Renato, dizia só jogar com a bola no pé. Mentira. Douglas corria, combatia, até tomava a bola do adversário. Agora, sim, ele só joga com a bola no pé. Agora ele é um jogador do passado. E o Grêmio um time do passado. De um mau passado.

A pior de todas as decisões

Um comandante, seja lá o que comande, seja uma fruteira, seja um país, um comandante tem que tomar decisões. Se for a decisão correta, tanto melhor. Se for a errada, paciência. Mas há que se tomar decisões. O pior que pode fazer um comandante é não fazer. Não decidir.

Os dirigentes do Inter decidiram não decidir quem será o técnico sucessor de Falcão. Decidiram... esperar... Estão, agora, dependendo do imponderável, do que se costuma chamar de “sorte”. No caso, o bom sucesso do torneio da Alemanha. Que pode ocorrer, já que os europeus estão em começo de temporada. Mas, se não ocorrer, a inércia cobrará caro seu preço. E a cobrança virá já no Aeroporto Salgado Filho.

Honra à tradição

O Uruguai campeão da América é um time sem moicanos. Um time em que seus principais jogadores, os atacante Forlán e Suárez, combatem, preenchem espaços, deslocam-se, incomodam os zagueiros adversários o tempo todo. O Uruguai honra as tradições da Celeste Olímpica. Parece um time do passado. É do futuro.


26 de julho de 2011 | N° 16773
PAULO SANT’ANA


Ainda sobre Deus

Quando escrevi aqui que acreditava em Deus, justifiquei que um dos motivos era o de que assistia diariamente a muitos milagres ao meu redor.

O leitor há de se perguntar sobre quais milagres são esses que assisto diariamente ao meu redor.

Eu respondo que eles são tão grandiosos que não caberiam em palavras.

Respondo também que Deus tem várias maneiras de manifestar-se a nós.

Resta saber-se, em primeiro lugar, se teremos capacidade para discernir se determinado fato é uma manifestação divina dirigida a nós. E em segundo lugar, devemos discernir se é interessante a nós que venhamos a descobrir as razões de por que Deus está nos chamando a atenção para aquele detalhe.

Também é importante que cada um de nós tenha consciência de que somos escolhidos de Deus. Ou seja, quem veio à Terra, quem nasceu, por si só já é escolhido de Deus. E ter vindo à Terra pode vir a ser uma credencial para entender Deus e suas razões.

O problema central é exatamente este: quais os desígnios de Deus.

Eu não sei bem se Deus às vezes se descuida e nos transmite sinais de sua existência ou se esses sinais são dados a todos, e só um mínimo de pessoas é capaz de percebê-los.

O que sei é que Deus existe para quem crê nele. E também não sei exatamente sobre se Deus existe também para quem não crê nele.

Como já escrevi, Deus é um imã, oculto no infinito. E se ele não se mostra (é oculto), deve ter razões ponderáveis para permanecer oculto.

Eu, na minha humilde condição de pensador, de perscrutador dos sinais de Deus, penso que uma das razões para que Deus seja oculto é que ele assim se mostra receptivo a que nós o descubramos e o retiremos da condição de oculto.

Ou seja, só os que perceberam Deus, os que o desvendaram é que podem melhor entender a vida e serem realmente felizes e realizados.

Em outras palavras – não me entendam mal –, essas pessoas que entenderam Deus são os chamados eleitos, os chamados povo de Deus.

Ainda em outras palavras, são as pessoas que tiveram acesso a Deus.

Os meus leitores devem estar achando estranho que um cronista de amenidades de penúltima página de um jornal provinciano esteja se ocupando repetidamente com Deus.

Não há nada de estranho. É que é um direito meu ocupar-me de Deus, como é direito de todo leitor meu fazer isso e de todos os viventes: Deus está lá oculto no infinito, mas todos têm livre acesso à tentativa de decifração dos seus mistérios.

Eu posso não estar sendo claro. É que estou falando de fé, e o conceito de fé é quase tão intangível, impalpável quanto o conceito de Deus.


26 de julho de 2011 | N° 16773
FABRÍCIO CARPINEJAR


Antes das fotografias

Sofri com a separação dos pais. Carregava a sensação de que tinha sido difícil, percebo agora que foi um desastre. Ao mexer no baú da família para catar flagrantes da infância, encontrei o álbum de casamento dos dois. Capa dura, nomes dos noivos em relevo dourado, livro grosso para eternidade mesmo, resistente às traças e porões.

Fiquei intrigado no momento de folheá-lo. Tive que sentar e interromper a pressa.

Voltei no tempo. No papel vegetal entre as páginas, havia desenhado o contorno das fotografias. Copiei à mão cada imagem, colorindo depois. São mais de 50 folhas transparentes preenchidas, duplicando pai e mãe no altar, reproduzindo convidados e bastidores da festa.

Na época (mentalidade de criança ferida), fiz uma cópia reserva das cenas. Raciocinei que os dois não seriam mais amigos, jogariam duas décadas de casados no lixo e providenciei um backup primitivo com o lápis Faber Castell HB2. Ansiei preservar a história usando as armas do estojo de 1ª série. Aproveitei meu conhecimento de copista do Pernalonga.

Lembro que não dei mole na separação: briguei com os irmãos, esperneei no sofá, chantageei no carro, planejei greve de fome, renunciei futebol, peguei recuperação, chorei no mercado, passei recreio no SOE, ia de um lado para outro da sala ao quarto para diminuir a distância das palavras. Olha, coitados de Carlos Nejar e Maria Carpi, criei um inferno para reconciliá-los, demorei a constatar que o paraíso deles também não era o meu.

Diante do flashback, eu me pus a comparar o que fui com o que sou. Todos, quando pequenos, sofrem com o divórcio dos pais, indicativo de trauma, término da idealização e receio de parar num orfanato. E todos, quando maduros, consideram a separação necessária e natural.

É impressionante o quanto nos esforçamos para manter os pais juntos, e não realizamos quase nada pelo nosso casamento na vida adulta.

E se lutássemos para entender nossa esposa como defendemos nossa mãe? Se realizássemos metade da birra feita com o pai durante a despedida de nossa mulher? Se trocássemos o orgulho da cobrança pela cumplicidade emocionada do erro? Se desejássemos falar menos e ouvir a voz dela mais um pouco?

Se fôssemos meninos para sempre, nenhuma separação seria fácil. O amor não morreria fácil. O papel vegetal protegeria as fotos.

segunda-feira, 25 de julho de 2011



Bônus na berlinda

Política de remuneração de professores com base no mérito é promissora, mas precisa ser alvo de estudos para poder ser aperfeiçoada

Apesar de renhida resistência, sobretudo dos sindicatos de professores, um número cada vez maior de Estados e municípios brasileiros tem adotado em anos recentes políticas de premiação por mérito a docentes, nas redes estatais de ensino.

A lógica de recompensa dos programas é louvável. Busca-se compensar e estimular financeiramente o esforço dos mestres, avaliados pelo desempenho acadêmico de seus alunos. O objetivo é melhorar o rendimento dos professores em sala de aula e, em última análise, elevar a qualidade deficiente do ensino público.

Expectativas tão ambiciosas sofreram um golpe, na semana passada, com a notícia de que a cidade de Nova York, cuja política de bônus inspirou governos no Brasil, suspenderá o pagamento desses prêmios em suas escolas.

A decisão se seguiu à conclusão de um estudo, iniciado há quatro anos, que não constatou diferenças significativas no desempenho de estudantes. Notas dos alunos cujos professores recebiam remuneração por mérito eram similares às de colegas sob a responsabilidade de docentes não beneficiados pelo programa.

É preciso cautela ao analisar o resultado da pesquisa nova-iorquina, que não deve ser avaliada de forma isolada. Estudos semelhantes, em países como Índia, Reino Unido e Chile, apresentaram diagnósticos opostos, que confirmariam a eficácia da remuneração por mérito.

O que o conjunto de tais pesquisas parece indicar, em sua aparente disparidade, é que o simples estímulo financeiro aos docentes não é uma panaceia para os males da educação. Outros fatores, externos à sala de aula, são decisivos para o desempenho dos alunos.

O mais relevante deles é a vinculação entre a condição socioeconômica da família do estudante e seu desempenho cognitivo. Mas há maneiras de mitigar a desvantagem inicial de parcela das crianças mais pobres no seu percurso acadêmico. A principal providência é o início antecipado da vida escolar, com a oferta de creches e pré-escola de boa qualidade.

Os impactos específicos da remuneração por mérito deveriam ser avaliados levando em conta essas condições. O Brasil ainda não dispõe de pesquisas capazes de medir com precisão os efeitos de uma política tão recente.

O governo paulista, pioneiro na adoção do bônus salarial, promete agora elaborar novas regras para aprimorar seu funcionamento.

Pelo menos num aspecto deveria seguir de forma imediata o exemplo nova-iorquino: contratar estudos independentes capazes de examinar com isenção o programa promissor, que não deve ainda ser descartado, mas que pode ser avaliado e aperfeiçoado.

Uma ótima segunda-feira. Excelente semana para você.