terça-feira, 19 de julho de 2011



19 de julho de 2011 | N° 16766
LIBERATO VIEIRA DA CUNHA


Vidas idas e vividas

Uma amiga que esteve me visitando telefonou depois para comentar o que definiu como o museu de antiguidades que, segundo ela, guardo em casa. Primeiro devo dizer que minha amiga foi exagerada. Guardo alguns objetos antigos, mas nada suficiente para formar um museu. Segundo, preciso conservá-los como testemunhos de bons momentos do passado.

Estas duas cadeiras de alto espaldar, por exemplo. Foram esculpidas ambas no século 18, por algum fino artesão e mantêm a majestade com que foram concebidas. Eu não as trocaria por nada no mundo, pois datam da mesma e distante época do console que é a primeira visão de quem me visita neste apartamento.

A sala de jantar já conta bem mais de meio século, e com sua cristaleira, seu grande espelho, seu balcão, sua mesa de oito lugares é um atestado presente e vivo do talento dos artífices dos anos 40 e 50.

E há os quadros. Gosto de pensar que tenho duas pequenas obras-primas. Um autorretrato de Pedro Weingartner e uma gravura de Lasar Segall, ambos de minha particular estima e consideração.

Não posso esquecer os cristais. Sou dono de uma razoável coleção deles, mas nenhum é tão antigo e intrigante do que uma taça azul. Nela está gravado, em letras douradas, Bons Annos, assim mesmo, com dois enes. Quem a ofereceu a quem no dia de seu aniversário? Um filho, um amante, um amigo? Eis aí algo de problemática certeza. A única que tenho é a de que o ofertante era pessoa de extraordinário bom gosto.

E não devo deixar de lado os livros. Acumulei-os ao longo de anos. Tenho as obras completas de um bom número de autores, como Machado, Simões Lopes e Erico. Mas junto a estes colecionei algumas preciosidades, como um exemplar de Os Lusíadas, que caminha para entrar em seu terceiro século.

Tudo isso é nada, se comparado com os quadros, cristais, móveis, livros e outros bens de dezenas e dezenas de residências de Porto Alegre. Esses tempos visitei uma mansão que abrigava em Van Gogh. Não coleciono acervo algum distantemente parecido. Mas gosto do que tenho e protejo a sete chaves, minha amiga. São marcas bem guardadas de existências idas e vividas.

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