sábado, 16 de julho de 2011



17 de julho de 2011 | N° 16763
PAULO SANT’ANA


Gênio também cansa

Disseram-me que anteontem estabeleceu-se no bar da Zero Hora uma intensa discussão sobre os motivos que levaram Chico Buarque de Holanda a cessar suas composições e ter ficado cinco anos sem gravar, tendo retornado só agora a essa atividade.

Quem se enfronhou na discussão foram o Jones Lopes da Silva, o David Coimbra, o Nílson Souza e o Élton Werb.

Uma pena que eu não estava no bar. Porque só eu talvez saiba por que Chico Buarque deixou de compor músicas durante tanto tempo.

O motivo inicial foi técnico: ele se entregou à literatura e passou a escrever romances, no que incorreu numa grande tolice, os seus romances não podem atar as chuteiras das suas músicas, não contêm o gênio das suas composições de samba e de modinhas.

Os romances de Chico Buarque são como as sardinhas que Hemingway cozinhava em sua casa de Cuba: intragáveis.

O outro motivo é o principal: depois de escrever as mais belas canções do cancioneiro brasileiro, Chico Buarque tinha o direito de descansar seu gênio, isto é, o gênio tem o direito de encher o saco.

Mas compor que mais músicas depois de O meu guri, Valsinha, Banda, Todo sentimento, Construção? Que mais queriam que ele compusesse? Não bastavam essas e mais 200 que seu estro ergueu? Basta! Chega! É o que se devia gritar a ele, depois que ele nos afogou em encantamento com cada uma das canções que escreveu.

Basta!

Chico Buarque chegou a um ponto que hoje não se ouve mais ninguém dizer assim: “Como é bonita esta música do Chico.”. Não se diz porque todas as músicas do Chico, até Januária, são bonitas. Música bonita do Chico é pleonasmo.

Todas são bonitas.

Chico, prosseguindo na tese, escreveu músicas tão belas e tão aproximadas do céu em beleza que ele parou de compor porque não podia mais superar-se. Não sei se os meus leitores me entendem.

Se não me entendem, vou dar um exemplo com o que se dá comigo.

Acontece que, se nos próximos dias eu escrever duas ou três crônicas iguais, da mesma altura literária e intelectual das duas crônicas que escrevi há poucos dias, aquela do meu flerte com um urubu na sacada do meu prédio e aquela outra em que afirmei que acreditava em Deus, se eu repetir em qualidade duas outras crônicas como aquelas, também vou parar por cinco anos de escrever.

Nunca recebi dos leitores tanto reconhecimento e consagração, pessoalmente nas ruas e por mensagens.

Os gênios têm o direito de parar quando já atingiram o seu apogeu.

E se eu conseguir essa proeza em minhas próximas colunas, vou escrever só uma frase no dia seguinte, aqui neste espaço: “Sabem de uma coisa? LARGUEEEEIIIIII!”.

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