quinta-feira, 21 de julho de 2011



21 de julho de 2011 | N° 16768
ARTIGOS - Flavio José Kanter*

Velhice é doença?

Outro dia fui surpreendido por menção à “medicina antienvelhecimento”. Conheço tratamentos antiproblemas que precisamos combater: anti-inflamatórios, anti-hipertensivos, antipsicóticos, antidiabéticos... A lista dos anticoisas que queremos combater é grande. Mas queremos combater o envelhecimento?

Lembro do meu pai dizendo que envelhecer é bom, ruim é não envelhecer: morrer antes de chegar à velhice...

Em meu trabalho assistindo pessoas, sua saúde e doenças, encontro formas diferentes de envelhecer. Muitos chegam a esta fase preparados, tendo estabelecido condições e hábitos que lhes permitem obter satisfação e ser felizes nesta fase da vida. Outras não. Ouso dizer que a primeira condição para envelhecer bem é aceitar a velhice como algo normal, uma nova fase na vida, que pode ser bem vivida.

Ser velho não é pejorativo. Pode ser vantagem. Evita-se o termo e chamam velho de “melhor idade”, “idade de ouro”, “sênior”, e outros eufemismos. Aí já se diz que velhice é ofensivo. Será?

Como é então envelhecer bem? É preciso chegar a esta fase com boa saúde física. Isto se prepara ao longo da vida, com hábitos saudáveis, atividades física e intelectual permanentes, identificação de fatores de risco e sua remoção ou redução sempre que possível. Envolvimento familiar e social com laços afetivos é relevante.

A relação com o trabalho importa; o que fazer quando parar ou diminuir? Os que pior vivem, em geral, depois de se aposentarem são aqueles que não tinham outros interesses em paralelo, ficaram sem objetivos ao interromper a rotina.

Acompanho pessoas com mais de 80, até 90 anos, que mantêm uma vida que as satisfaz através do equilíbrio de ocupações físicas, mentais e sociais. Absorver as progressivas perdas que caracterizam esta fase é um dos segredos: perdem-se pessoas, diminuem sentidos, força, trabalho, dinheiro... Vejo que vão melhor os que aceitam, absorvem e se adaptam às características da fase do que os que lutam contra ela.

Sêneca escreveu sobre o assunto mostrando vantagens da velhice. Mas há quem diga que a calma e a tranquilidade que se obtém devem-se à queda das energias que lhes permitiam excessos quando jovens...

Um cirurgião cardíaco paulista, perguntado sobre parar de trabalhar quando chegou aos 70 anos, respondeu que seus clientes é que decidiriam a sua aposentadoria: quando deixarem de procurá-lo, esta será a hora de parar. A boa relação com o trabalho, a sintonia com o que se faz e o reconhecimento obtido também somam para um bom envelhecimento.

Começamos a envelhecer ao nascer. É inevitável e inexorável. Aceitar e estar preparado é o que vai fazer com que seja mais ou menos fácil. A gente envelhece como vive. Quem vive bem envelhecerá bem. Quem não aceitar, lutar contra, poderá sofrer decepções.

Ruim mesmo é não envelhecer.
*Médico

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