sábado, 13 de março de 2010



13 de março de 2010 | N° 16273
CLÁUDIA LAITANO


A teoria do sistema

Um amigo meu costuma dizer que as pessoas não se apaixonam por um indivíduo, mas por um “sistema”.

Você pode até acreditar que se sente atraído por um belo par de olhos azuis ou por uma personalidade encantadora, mas o que define a jogada, o que transforma um namorico em namoro ou um namoro em um casamento é um pacote mais amplo de atributos, que leva em conta, além da aparência e da personalidade do ser amado, circunstâncias como família, amigos, trabalho e, principalmente, estilo de vida.

Um casal formado por pessoas que aparentemente não têm nada em comum pode esconder dois sistemas que se entendem, ou se complementam, muito além da compreensão dos observadores externos.

O pacote de cada um, ou “sistema”, vai atrair, ou não, conforme o interesse de quem olha, evidentemente. Onde alguém vê excesso de convivência familiar, outro pode encontrar uma chance de entrar para uma família unida. Onde alguém vê um profissional bem-sucedido e confiável, outro pode perceber o fim dos sonhos de uma vida de aventuras e surpresas.

Qualquer fantasia romântica é sempre uma construção – uma combinação entre o que a gente vê e o que a gente acha que está vendo (ou gostaria de ver). O que a teoria do sistema coloca em evidência é que essa criação romântica é muito mais complexa do que podemos imaginar e se alimenta de fatores sobre os quais, muitas vezes, não temos nenhum controle (pense nisso na próxima vez que levar um fora, e talvez sirva de consolo por mais ou menos uns 15 minutos).

Em cartaz em Porto Alegre, o filme Educação, que concorreu a três Oscar esta semana, retrata uma curiosa história de amor –não de uma mulher por um homem, mas de uma mulher por um “sistema”. Baseado no livro de memórias da jornalista britânica Lynn Barber, o filme mostra o envolvimento de uma menina de 16 anos com um homem mais velho, que representa para ela não apenas uma possibilidade romântica até ali impensável, mas uma espécie de TGV rumo às experiências da vida adulta inteligente que ela fantasia enquanto lê os existencialistas e ouve discos de Juliette Gréco (o filme se passa no comecinho dos anos 60).

Fascinada pelo mundo culturalmente sofisticado em que ele vive, a personagem acaba sendo traída pela falta de experiência, mas mesmo que o desfecho não seja o mais convencional em filmes românticos, não dá para dizer que a história tenha um final triste.

Pelo contrário. Essa não é uma história de amor com começo, meio e fim, mas o retrato encantador de uma jornada rumo ao amadurecimento, com seus tropicões inevitáveis e as lições que podemos tirar deles.

Talvez haja até algo de nostálgico nessa história de uma adolescente que encontra a chance de amadurecer aproximando-se de um homem mais velho e mais experiente.

Não porque as meninas de hoje tenham deixado de se apaixonar por homens mais velhos, mas porque, em algum momento daquela década em que Lyn Barber se tornou adulta, o conceito de juventude começou a se transformar em uma espécie de valor em si, invertendo a lógica de que os mais jovens têm muito a aprender com os mais velhos.

A falsa sensação de que ser informado é o mesmo que saber das coisas impede, muitas vezes, que se perceba que a jornada rumo ao amadurecimento é longa e trabalhosa. Em qualquer idade.

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