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sábado, 27 de março de 2010
28 de março de 2010 | N° 16288
DAVID COIMBRA
Augusto sabia dar chutão
Há quem seja zagueiro na vida. Se Júlio César era o camisa 10 da Roma Antiga, o zagueirão foi seu sucessor, Otávio Augusto.
Como bom zagueiro, Augusto era um homem prudente. Ressalte-se: um zagueiro não teme o perigo, até porque amiúde o enfrenta. Mas um zagueiro jamais é temerário. Um zagueiro não se arrisca. Augusto, as guerras que travou foram calculadas para redundar em sucesso. Ele jamais empreenderia uma campanha contra os partos, por exemplo.
Esses partos, eles nunca foram conquistados pelos romanos. Eram guerreiros ferocíssimos. Em combate, empreendiam a famosa “carga parta”: investiam com a cavalaria a todo galope contra as formações retangulares dos romanos.
Quando os legionários se punham ao alcance de uma flechada, avançavam mais alguns metros e davam meia-volta com seus cavalos. Durante esse movimento semicircular, giravam o corpo em cima da sela e, fazendo pontaria por sobre o ombro, disparavam suas flechas, perfurando as armaduras e os escudos dos romanos, dizimando as legiões.
Foi assim que o general Crasso se transformou em adjetivo. Crasso tinha tudo na vida: dividia o poder máximo do império com Júlio César e Pompeu, havia sufocado a revolta dos escravos comandada por Spartacus, era um astro. Mas decidiu atacar os partos.
Tsc tsc.
Vinte mil de seus homens morreram em combate, outros 10 mil foram aprisionados e o próprio Crasso acabou tendo a cabeça separada do corpo por um golpe de espada, o que é bem ruim para a carreira de um general.
O fracasso de Crasso (rimou!) virou símbolo de erro estratégico. Donde o “erro crasso”. Imagine o seu nome tornar-se sinônimo de erro monumental.
– Você cometeu um erro wianey carlet, por isso será demitido.
Erros que tais, Augusto não cometia. Tratava-se de um meticuloso. Um ser racional. Não se deixava embalar pelas paixões carnais, fraqueza de tantos próceres do império. Cleópatra se ofereceu a ele, como havia se oferecido a César e Marco Antônio e, ao contrário de César e Marco Antônio, ele a rechaçou.
Os escândalos da família ficavam por conta da filha Júlia, que, segundo os cálculos de certos historiadores, repoltreou-se com 80 mil homens, o que deve ser algum recorde. Não sei se acredito neste número.
Porque, pense bem: Júlia viveu 54 anos, dos quais digamos que 30 tenham sido sexualmente ativos. Para alcançar a façanha de somar 80 mil amantes, teria de interagir com 2.666,666 amantes por ano, o que dá uma média de 7,3 amantes por dia. Sete homens grandes e um pequenininho, talvez. Sem repetir um só. Sem faltar nem nos feriados e dias santos. Convenhamos, é muito homem.
De qualquer forma, é certo que Júlia se dedicava com afã à atividade, porque o próprio pai, o nosso zagueirão Augusto, a baniu de Roma sob a acusação de adultério. Quer dizer: Augusto não vacilava nem quando a família estava envolvida. Se tivesse que dar chutão, dava.
Mário Fernandes, que está a caminho de ser o camisa 3 da Seleção, precisa desenvolver essas tão preciosas virtudes do comedimento e da prudência. Contra o Novo Hamburgo, cometeu um erro que, por pouco, não foi crasso: deixou de mandar pela lateral uma bola disputada entre ele e um atacante inimigo, quando não havia ninguém mais até o gol de Victor.
Mário quis sair jogando, perdeu a bola, teve de fazer a falta e levou cartão amarelo. Zagueirões não têm medo de dar chutão para a lateral. Zagueirões não têm vergonha de fazer tratado com a Pártia, como fez Augusto. Zagueirões evitam o erro, não se expõem a ele.
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