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quinta-feira, 25 de março de 2010
25 de março de 2010 | N° 16285
RICARDO SILVESTRIN
O readmitido
O autor de umas das músicas mais tocadas no país no início dos anos 1980 estava sendo dispensado pela gravadora. De Repente Califórnia, composta por Lulu Santos e Nelson Motta, fazia parte da trilha do filme Menino do Rio.
Cinco milhões de espectadores já haviam visto a história no cinema e ouvido a canção na voz de Guto Graça Melo, ator e cantor. Na rádio, era o sucesso do momento.
Lulu havia gravado antes disso a versão de Get Back, de Lennon e McCartney, feita por Rita Lee e Gilberto Gil, executada primeiramente pela dupla brasileira no álbum Refestança. Mais um nome da série “re” do Gil: Refazenda, Refavela, Realce.
A gravação do Lulu fez certo sucesso, integrando até a trilha de uma novela da Globo. Mas não teve, na avaliação dos empresários da gravadora, a repercussão ou o retorno financeiro que garantisse a permanência do artista no elenco.
Lulu procurou um dos diretores para colocar que não entendia como o autor de um sucesso nacional estava sendo mandado embora. O diretor foi informado que De Repente Califórnia era do rapaz. Negociaram então que seria feita um long play.
O executivo ainda perguntou se Lulu colocaria o hit e mais outras versões, como a que cantara dos Beatles. O músico disse que não precisaria colocar versões, pois era um compositor. Teria suas próprias criações.
O disco foi produzido por Liminha, o ex-baixista dos Mutantes, nos intervalos de um dos seus trabalhos importantes na gravadora, a produção de Luar, do Gil. Quando sobrava um tempinho, entravam para o estúdio Lulu na guitarra, Liminha no baixo e o baterista do Roupa Nova.
Três excelentes músicos executando os arranjos de coisas como Tempos Modernos: “Eu vejo um novo começo de era / de gente fina, elegante e sincera...”. Ou Tudo com Você, parceria com Fausto Nilo: “Eu quero tudo com você / que só sabe viver”.
Sozinho ou com parceiros, Lulu colocaria na roda, ao longo dos anos seguintes, versos como “acho que é bobagem a mania de fingir negando a intenção”, com Ronaldo Bastos, “fazer da minha vida sempre o meu passeio público / e ao mesmo tempo fazer dela o meu caminho só, único”, com Antônio Cícero, “o poeta é a pimenta do planeta”, com Wally Salomão, ou “ela me faz tão bem que eu também quero fazer isso por ela”, só dele.
Lulu pegou o vento a favor da indústria do disco. Mas soube usar esse espaço com canções que fazem um bom encontro entre letra e melodia. Textos que trazem, ao mesmo tempo, surpresa e simplicidade: “assim caminha a humanidade / com passos de formiga e sem vontade”.
Esse um contraponto mais amargo em relação aos tempos modernos que ele vislumbrava lá atrás. Da história do Lulu, fica o seguinte: antes de ser mandado embora, verifique se quem o contratou sabe o que você faz.
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