Entrelacos

23 de março de 2010 | N° 16283
CLÁUDIO MORENO

Homens e mulheres - 3

7 – Em nenhuma sociedade conhecida o casamento foi mais incentivado do que em Esparta. Não era fácil permanecer solteiro; os raros indivíduos que teimassem em não casar eram obrigados, no inverno, a dar voltas pela praça pública, completamente despidos, entoando uma canção em que diziam ser aquele um justo castigo para quem desobedecia a um preceito tão importante para a pátria.

Embora os casamentos fossem combinados entre as famílias, geralmente os jovens davam um jeito de informar aos pais o nome da pessoa desejada. Aqueles que não celebrassem nenhum acordo de matrimônio, porém, eram colocados – homens e mulheres em número igual – num grande recinto fechado, às escuras, onde os pares se formavam ao acaso.

Este tipo de seleção seria impensável para nós, mas os espartanos juravam que os casais assim constituídos tinham a mesma chance de dar certo quanto os outros, já que a escolha por amor, no fundo, era tão cega quanto esta – se não mais.

8 – Admeto, rei da Tessália, adoece gravemente; sentindo que a Morte virá buscá-lo, lembra que o deus Apolo tinha prometido poupar sua vida se algum membro da família aceitasse partir em seu lugar. Por mais que argumente, porém, não consegue convencer os pais, já velhinhos, a substituí-lo, mas Alceste, sua esposa, vem se oferecer em sacrifício – oferta que ele aceita com uma rapidez constrangedora.

Ela deita para morrer e despede-se do marido, com votos de que a nova esposa, se houver, não maltrate as crianças. Admeto, choroso, promete que vai mandar fazer uma estátua dela para colocar na cama, a seu lado, pois já está começando a sentir saudades... Felizmente Hércules, que é amigo da casa, ao saber dessa tragicomédia, arranca Alceste das garras da Morte e a devolve ao marido – muda, triste e pensativa para sempre.

Bem longe dali, em Roma, o tribuno Tibério Graco fica espantado ao encontrar duas serpentes em seu próprio quarto. Consultados em segredo, os adivinhos interpretam o fato como um terrível presságio: só uma delas deverá ser poupada; se morrer o macho, Tibério também morre; se for a fêmea, morrerá sua mulher.

Então ele, por amor à esposa e aos filhos, mata o macho e aceita o seu destino, vindo a morrer poucos dias depois. Sentados na plateia, sempre vamos aplaudir este nobre gesto e vaiar a covardia de Admeto – rogando aos deuses, no entanto, que não nos coloquem numa situação dessas, pois só então saberemos qual dos dois vai ser nosso modelo.