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sexta-feira, 26 de março de 2010
26 de março de 2010 | N° 16286
DAVID COIMBRA
Como nasceu a cidade
Vou contar como tudo começou. No princípio, nada era como hoje é. Ao amanhecer da Civilização, as pessoas viviam em comunidades agrícolas autossuficientes. Plantavam o que comiam, cosiam as roupas de vestir, levantavam elas mesmas as paredes das casas em que iam se abrigar, fabricavam as ferramentas com as quais trabalhavam. Todas mourejavam nas lides do campo, com exceção das mães, que ficavam em casa, velando pelos filhos.
Mas, certo dia, um dos filhos de um agricultor demonstrou habilidade especial em fabricar... enxadas, talvez. Ninguém fazia uma enxada como ele. A família toda pedia-lhe enxadas, e ele as produzia com gosto. Logo sua fama espalhou-se pela região e os vizinhos também passaram a fazer encomendas.
Trocavam uma enxada por uma saca de cereal, ou por um manto de lã que o aquecesse no inverno, quem sabe por um barril de dourada cerveja de trigo. Eram tantos os pedidos, que o rapaz foi apartado do trabalho na terra. Sua função, agora, era fabricar enxadas. Quando ele enfim conheceu uma beldade do neolítico e decidiu casar-se, saiu da casa dos pais. Mas não procurou terra para plantar.
Montou uma casinha mais ou menos próxima das comunidades agrícolas do entorno e anunciou que viveria do fabrico de enxadas. Quem quisesse revolver a terra com a melhor enxada das cercanias, que o procurasse e oferecesse algum produto em troca. Era bom para ele, que assim sustentava sua família, e era bom para os agricultores, que tinham mais tempo para arar e colher.
O filho de outro agricultor, admirando o sucesso do fabricante de enxadas, resolveu imitá-lo. Mas não para concorrer com ele: esse outro rapaz era um ótimo construtor de casas, e foi assim que se estabeleceu em uma propriedade contígua à do fabricante de enxadas – afinal, aquele lugar era estratégico, dava fácil acesso aos agricultores da área.
Em algum tempo, outros especialistas foram se instalando naquele local: um velocíssimo cavador de poços, um ferreiro incomparável, um hábil construtor de carroças populares.
E, depois deles, uma jovem viúva, que não tinha mais nem terra para cultivar nem marido que a provesse, passou a ceder o corpo tenro à volúpia masculina, aceitando como paga qualquer coisa à toa, uma noitada boa ou um corte de cetim. A prostituição, como se vê, não é a mais antiga profissão do mundo.
Para facilitar o comércio entre si, os profissionais pioneiros abriram caminhos que ligavam uma casa a outra, e suas casas às propriedades dos agricultores. À noite, reuniam-se no mesmo lugar para cultuar seus deuses primitivos. Um deles comandava os ritos, organizava as liturgias, e por este serviço também passou a pedir produtos de que necessitava para viver. Assim foram rasgadas as primeiras ruas e estradas, assim surgiram os primeiros sacerdotes. Assim nasceu a cidade.
A natureza da cidade, pois, é dupla: surgiu da reunião de muitas pessoas em um só lugar, sim, mas antes disso surgiu da especialização de tarefas. Das diferenças entre os homens.
E, à medida que uma cidade vai se sofisticando, as atividades vão se tornando mais especializadas. Uma cidade moderna tem de um tudo, é capaz de suprir as necessidades mais específicas. Em uma cidade pessoas ganham a vida trabalhando como terapeutas ocupacionais, engenheiros de alimentos, designers de doces.
E como consultores de RH, que sobrevivem impingindo a adultos atividades de recreação de jardim da infância. Chegamos a esse ponto, nas cidades. Tudo culpa daquele fazedor de enxadas.
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