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domingo, 7 de março de 2010
07 de março de 2010 | N° 16267
PAULO SANT’ANA
Carro que não acaba mais
Não foi por mim que escrevi na última semana uma crônica com preocupação profunda pelos engarrafamentos de trânsito em Porto Alegre.
Foi por piedade às almas penadas de milhares de motoristas que se acotovelam nos engarrafamentos.
Foi por compaixão das centenas de milhares de pessoas que andam de ônibus e concorrem nos engarrafamentos com os carros.
Há pessoas que levam até quatro horas – ou mais – presas no trânsito, por dia, gastando, só em transportar-se, metade ou mais do tempo em que se ocupam no trabalho.
Não há um levantamento em Porto Alegre a respeito, mas em São Paulo a velocidade média no pico da tarde de um carro diminuiu de 18 km/h para 15 km/h.
Imagine você comprar um carro para deslocar-se com mobilidade na cidade e ter de imprimir somente 15 km/h!
Os carros em São Paulo, pasmem, andam em velocidade média inferior à de um campeão da Corrida de São Silvestre. E a velocidade tão lenta, que se assemelha à que uma galinha pode atingir.
A principal causa dos engarrafamentos em Porto Alegre é a mesma de São Paulo: a expansão da frota.
Por dia, são acrescidos à frota mil veículos, quase 400 mil por ano. Não há cidade que suporte.
Agora mesmo, ficou ainda mais fácil comprar um carro novo, os prazos de financiamento se alongam a perder de vista: voltaram a ser vendidos carros com 80 prestações.
Os bancos e as financeiras, sem qualquer controle, oferecem carros em “condições imperdíveis” e com “pagamento só depois da Copa”.
Não importa que quem compre um carro com prazo de pagamento de 80 meses pague o dobro do preço real em juros. Todo mundo se atira na compra de carros.
Lembro-me que anos atrás havia um celular para cada sete habitantes do Brasil.
Agora, o número de celulares no Brasil é maior que o número de habitantes.
O mesmo está acontecendo com os carros: hoje, já existe no Brasil um carro para cada sete habitantes. Em breve, o número de carros vai encostar no número de habitantes e eu não sei o que será do trânsito nas cidades.
Essa licenciosidade é de uma irresponsabilidade gigantesca dos governos: não podiam liberar a venda de carros sem abrigo deles na malha viária das cidades.
Além disso, a gravidade maior de todas. Um veículo obrigado a fazer a média de 15 km/h no trânsito ou a média de 2 km/h nos engarrafamentos gasta de duas a cinco vezes mais combustível do que em fluxo dito normal.
Ou seja, ninguém calcula, mas todos nós, que somos vítimas dos engarrafamentos, pagamos duas ou três vezes mais por combustível do que deveríamos pagar.
Para amortizar os efeitos da expansão da frota, em Porto Alegre teria de ser construída uma Avenida Ipiranga por mês. No entanto, a malha viária permanece a mesma há vários anos e são despejados milhares de carros por ano na frota já esgotada.
Em São Paulo, tentam atenuar os engarrafamentos com obras. A partir do mês que vem, serão inaugurados três empreendimentos de grande porte: a alça sul do Rodoanel, a primeira fase da ampliação da Marginal Tietê e a linha 4 do metrô.
E aqui em Porto Alegre? Absolutamente nada.
Absolutamente nada.
Vai quebrar.
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