Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
domingo, 7 de março de 2010
07 de março de 2010 | N° 16267
MOACYR SCLIAR
Quando éramos andróginos
A história está em O Banquete, de Platão, que data mais ou menos do ano 380 a.C. Conta-nos o filósofo grego que, em tempos remotos, existiam seres chamado andróginos, formados pela união do homem e da mulher.
Os andróginos tinham duas caras, uma olhando em cada direção (podiam caminhar para a frente e em marcha a ré), e um duplo corpo. Eram fortíssimos, e tinham tal ânsia de poder que tentaram conquistar o Olimpo, a morada dos deuses. Para anular essa tentativa, Zeus cortou em dois os andróginos. Desde então as duas metades procuram-se, sonhando, através da união, recuperar algo da antiga força.
Fortes os andróginos eram, mas, será que era fácil a vida deles? Vejam, tinham duas faces, olhando em direções opostas. Isso significava que nunca poderiam ver juntos um programa de tevê, por exemplo. Claro, nada impediria que possuíssem dois televisores, mas, e se cada um deles quisesse ver um programa diferente? Só com fones de ouvido? E na hora de ir ao banheiro? Fazer xixi de pé ou xixi sentado? E na hora dos programas? Futebol ou chá com as amigas?
Pensando bem, Zeus, talvez, até sem querer, acabou fazendo um favor para a espécie humana. Tirou a força descomunal dos andróginos, certo, mas será que precisamos de força descomunal? Será que não nos basta a força suficiente para cumprir as tarefas do dia a dia, para trabalhar, para cuidar de nossas coisas, para levar nosso filho nos braços?
E o Olimpo? Quem é que precisa do Olimpo? Aquilo, convenhamos, é um empreendimento fracassado, um condomínio abandonado. Talvez esteja no mesmo lugar, mas pelo jeito ninguém mora lá, deus algum. Nossas casas, nossos apartamentos, por modestos que sejam, existem, e dão de 10 a zero em qualquer imaginário Olimpo.
Mas o melhor resultado é a irresistível atração entre os sexos. Uma atração que podemos chamar de amor, ou de paixão, não importa. O certo é que uma nova energia foi gerada, e ela já não é mais usada para a conquista dos redutos das divindades; serve para aproximar homens e mulheres, que desta maneira descobrem o outro e, igualmente importante, descobrem a si mesmos no outro. Nascem daí canções, e romances, e poemas; e, muito importante, nascem os filhos, que um dia também procurarão suas caras-metades.
Conclusão: se Zeus aparecesse agora oferecendo-se para fazer um recall da espécie humana e nos devolver ao mundo sob a forma original de andróginos, deveríamos recusar de forma taxativa: “Não, Zeus, estamos muito melhor assim, preferimos cada um com sua cara e olhando na direção que melhor lhe convém. Preferimos as nossas individualidades, a afirmação de nossas identidades pessoais. Preferimos procurar um ao outro, mesmo que esta busca tarde uma vida inteira, e que seja acompanhada de enganos, de decepções, de frustrações.”
Sim, Zeus fez bem separando os sexos. É claro, ele não pensou nas desigualdades que isso eventualmente poderia acarretar, sobretudo em relação à mulher, durante milênios, e ainda hoje, oprimida, discriminada. Mas, se não temos o poder de Zeus, ao menos criamos o Dia Internacional da Mulher. Um dia no qual sempre podemos refletir sobre o nosso mundo e tentar melhorá-lo, sem para isso invadir o Olimpo.
Coisa que os andróginos nunca fizeram.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário