segunda-feira, 2 de novembro de 2009



02 de novembro de 2009
N° 16143 - KLEDIR RAMIL


Vegetariano radical

Em meu livro de estreia, Tipo Assim (RBS Publicações), eu cito uma frase de Hipócrates: “o homem é o que ele come”. A partir dessa afirmação, desenvolvo um raciocínio absolutamente distorcido, de que o homem vai ficando com a cara dos alimentos que consome. Ou seja, levei a coisa ao pé da letra.

E ilustrei o assunto, dizendo que os orientais são amarelos porque comem muito milho, os índios pele-vermelhas são assim por causa do tomate, os africanos são escuros por causa da feijoada, os europeus desbotaram de tanto comer arroz e os marcianos são verdes por culpa do brócolis.

Um jornalista, impressionado com a quantidade de vezes em que falo de abóboras no meu livro, me perguntou em entrevista: “Você tem cara de quê?”. Obviamente estava tentando desvendar o mistério da minha obsessão pela leguminosa e insinuando que minha leitura do pensamento do “pai da medicina” poderia estar incorreta.?

Apesar do meu perfil branquelo e longilíneo, mais próximo de um nabo, respondi que tenho cara de abóbora de pescoço. Foi uma tentativa desesperada de mostrar coerência e sustentar minha teoria furada.?

As palavras se prestam a estas distorções e, infelizmente, nem sempre ficam só no âmbito da brincadeira e do bom humor. Alguns políticos brasileiros adoram explicar certas malandragens citando frases famosas. Sempre através de um ponto de vista meio estrábico.

Voltando à culinária. Sou vegetariano há mais de 30 anos. Meus filhos nunca comeram carne e, seguindo meu raciocínio obtuso, deveriam estar com cara de abobrinhas. Coitados.? Alguns amigos acham que eu sou muito radical, mas não dá pra ser meio vegetariano. Ou você é ou não é. Assim como não é possível a uma moça estar meio grávida.

Tudo bem, concordo que algumas de minhas regras são bastante rígidas. Por exemplo, em minha casa não entra carne de jeito nenhum, o que já provocou histórias engraçadas.

Certa vez, numa emergência, uma vizinha pediu se poderia mandar uma panela de feijão para terminar de cozinhar, pois estava com um problema no fogão e um monte de visitas para almoçar. Minha mulher disse pra ela não se preocupar. Chamou nosso caseiro e mandou entregar na casa da vizinha nosso fogão de seis bocas e um bujão de gás.

Deu um certo trabalho, mas aquela panela com orelhas e focinho de porco não entrou lá em casa.

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