quarta-feira, 1 de abril de 2009



01 de abril de 2009
N° 15925 - DAVID COIMBRA


O galo cinza

O que um homem quer ouvir de uma mulher? O que um homem re-al-men-te quer ouvir de uma mulher? Nada desse negócio de eu te amo e minha paixão e bibibi.

Um homem quer ouvir que ele é uma máquina de produzir orgasmos, que ela nunca em tempo algum deparou com outro que lhe fornecesse tanto prazer, que basta o mero toque dele para que ela se liquefaça em gozo irreprimível. Ele quer ouvir que ele é o galo cinza. Você sabe: o galo mais galo de todos os galos.

Na sexta-feira passada eu dizia isso numa roda de amigos. Amigos e amigas em torno a uma mesa redonda no Quincho, ali perto da Carlos Gomes. Cito o restaurante em homenagem aos seus garçons, que foram bravos naquela sexta-feira. Heroicos, foi o que foram.

Porque nossa mesa era uma daquelas mesas que fazem um garçom desistir da profissão. Nossa mesa era a dos caras que nunca vão embora. Ficamos ali, bebendo e rindo e conversando madrugada adentro, e os garçons sorridentes:

– Mais uma rodada?

Aceitávamos. Sempre aceitamos. Entre uma rodada e outra falei disso. Do que um homem re-al-men-te quer ouvir de uma mulher. Ao que uma das presentes, dileta esposa de um personagem muito conhecido da cidade, homem público que há não muito tempo teve seu nome estampado em títulos corpo 68 do jornal, pois essa esposa comportada proferiu uma frase terrível e, pior, na frente dele:

– Ah, isso não existe! Quer dizer: um homem capaz de conduzir uma mulher ao mais elevado estado de excitação sexual não existe. Meu amigo, o marido da dita cuja, abriu os braços e protestou:

– Pô, amor!

Tarde demais. Ela havia quebrado o encanto. Todos nós homens já pensávamos nisso, que a glória suprema de um macho é ouvir de uma mulher que ele é, precisamente, um macho. Macho, entendeu? Macho.

– Você é o meu macho. É impossível haver homem mais viril do que você. A sua habilidade sexual merecia uma medalha. Um Oscar. Um Nobel.

Mas a mulher do meu amigo disse que isso não existe. As mulheres são assim. São práticas, vivem no mundo real, na superfície dura da Terra. Nós homens estamos sempre sonhando. Sempre fantasiando. João Bosco e Aldir Blanc já revelaram com o que fantasiamos quando escreveram:

“Sem pressa foi cada um pro seu lado. Pensando numa mulher ou num time”.

Uma mulher e um time. A síntese perfeita do que habita o cérebro masculino. Uma mulher que diga para o homem que ele é o deus do sexo e um time que trucide os adversários, todos os adversários, sem clemência. Um time que não produza vitórias; produza goleadas.

Um time de toque de bola requintado, os passes escorreitos, de pé em pé. O toco y me voy, como dizem os argentinos. Um time de jogadores que tonteiem os adversários a drible. Isso. Um time de drible. Chapeuzinho, janelinha, meia-lua, o drible da vaca.

A Seleção Brasileira tem de ser esse time. É o que se espera da Seleção. Mais: o que se exige dela. A Seleção Brasileira não tem direito de jogar futebol pragmático. É proibido, à Seleção Brasileira, optar pelo futebol de resultados. A Seleção Brasileira tem obrigação de ganhar e encantar.

Não são os torcedores do Brasil, é o mundo inteiro que espera show da Seleção. Até os adversários da Seleção ficam decepcionados quando a Seleção joga um futebol de despachante, um futebol de carimbo e cópia autenticada e segunda via. Não pode. Todo mundo pode, menos a Seleção.

Os práticos podem repetir que isso não existe. As mulheres podem dizer que o tipo de homem que os homens esperam ser não existe. Pouco importa. Importa é a fantasia. Importa o sonho. Queremos ver alguma mágica da Seleção, nesta noite. Queremos ouvir alguma mentira das nossas mulheres todas as noites.

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