sábado, 2 de agosto de 2008



02 de agosto de 2008
N° 15681 - PAULO SANT’ANAA


Vergonha do sistema

A relação que mantenho com o SUS é sempre dramática. Mas não estou sozinho. Os médicos sofrem com o SUS, têm ali na sua frente uma paciente portadora de doença vascular obstrutiva, em membros inferiores, como é o caso que me veio agora parar nas mãos, aqui na Redação.

A paciente, é bom que se diga, está internada, pelo menos estava até ontem, no Hospital Getúlio Vargas, em Sapucaia do Sul.

Como se sabe, nesse hospital, como na maioria dos hospitais gaúchos do Interior, não há recursos técnicos para realizar estudo angiográfico de artérias de membros inferiores com a finalidade de avaliar a revascularização cirúrgica.

Traduzindo, neste caso, o procedimento é uma cirurgia, provavelmente de amputação dos membros inferiores ou dos pés, em razão de que a paciente é diabética.

Não tem caso de maior urgência do que este. Em última análise, a paciente do SUS, cuja família é modesta, vive apenas com um salário mínimo, espera e implora apenas para que seja removida para um hospital de Porto Alegre. No caso, o Conceição ou a Santa Casa, estabelecimentos onde podem ser feitas cirurgias vasculares.

Em síntese, uma paciente e sua família clamando para que algum hospital lhe ampute as pernas ou os pés e salve sua vida. Deus sabe lá que salvamento é esse, do que lhe restar de seu corpo após as amputações.

Mas não existe vaga, nem no Conceição, nem na Santa Casa, e a paciente ia se deteriorando anteontem e ontem no hospital de Sapucaia do Sul.

Eu sei que milhares de pessoas estão aguardando na fila de cirurgia do nosso SUS aqui no Sul.

Eu sei que as pessoas vão vendo assim agravado seu estado de saúde, vão se deteriorando seus órgãos em esperas que duram um ano, dois anos, até três anos por uma cirurgia. É a morte e é o sofrimento lentos.

Mas eu tenho este caso singular na minha frente, diante da pluralidade de milhares de outros casos análogos, certamente de gravidade menor, mas certamente de seriedade ímpar, que vão acabar desembocando para a gravidade deste caso.

A família da paciente está desesperada. Deve ser também grande o desespero do Dr. Leopoldo Amorim, do Hospital de Sapucaia do Sul, que não sabe como proceder diante da glacial falta de vagas em hospitais especializados em cirurgias de tal profundidade e convive com a gravidade sem solução.

Repito, não pode haver maior urgência do que esta. E, em termos cirúrgicos, este caso prova que a sociedade gaúcha está no fundo do poço de uma barbárie instalada em nosso SUS, pela qual faltam leitos cirúrgicos para pacientes que estão às portas da morte, aguardando apenas vagas para que sejam operados.

Só me resta apelar para a governadora do Estado, para o secretário estadual da Saúde, para o prefeito Fogaça, para o secretário municipal da Saúde em Porto Alegre, gestor do SUS entre nós, para os diretores dos hospitais mais importantes da Capital, para que concedam um leito para essa pobre e abandonada mulher.

Não é crível que com superávits de arrecadação do governo federal, só neste primeiro semestre da ordem de R$ 40 bilhões, nós vivamos milhares de casos idênticos ao dessa desafortunada mulher.

Isto não é humano, nós estamos vivendo o porão escuro da falta de atendimento de saúde para o nosso povo. Pessoas condenadas ao aleijume e à morte por falta de vagas nos hospitais.

Mas o que isto? É imprescindível que se decrete estado de emergência na saúde. Isto não pode mais continuar assim.

Sei que este caso é apenas um grão de areia no deserto do abandono dos paciente gaúchos. Mas é o grão que veio parar na minha mesa.

E como se trata de pelo menos salvar uma vida ante tantas agoniadas, publico o nome da trágica paciente: Iraci Schneider dos Santos, fones 9987-1929 e 3019-3125.

Autoridades, salvem-na. É o mínimo que se exige que façam. Mas meu coração resta esmigalhado.

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