domingo, 9 de março de 2008


ELIANE CANTANHÊDE

Eu não sou cachorro, não!

BRASÍLIA - Depois de barrados no aeroporto, de ficarem horas e horas sem beber, sem comer e sem contato com suas famílias e de passarem até três dias detidos em locais insalubres, os brasileiros escorraçados pelo governo espanhol chegam aqui dizendo que foram tratados "como cachorros".

Podemos até ser de um país em que milhares ou milhões de cidadãos preferem sair do que entrar, principalmente sair para os países mais ricos do norte ou da Europa.

Mas é uma cachorrada tratarem nossos jovens, nossos mestrandos e doutorandos, nossos pobres ou nossos ricos, como cachorros.

Ninguém questiona o direito de a Espanha ou de qualquer outro país -inclusive o Brasil- barrar estrangeiros que batem à sua porta, em especial diante do crescimento brutal de latino-americanos, africanos e asiáticos na União Européia, muitos deles ilegais. (Estima-se que 10% dos residentes na Espanha sejam não-espanhóis.)

O que não se pode engolir são os critérios e sobretudo a forma. Se dois estudantes estão só fazendo uma escala para ir a um congresso em Lisboa; se o consulado brasileiro envia toda a papelada comprovando que eles não estão mentindo; se não há nenhum risco de eles virarem ilegais... aí a coisa passa a ter contornos de racismo.

A moça e o rapaz preenchiam as exigências. Foram barrados por serem brasileiros. E, por serem brasileiros, tratados como cachorros.

Pesa a eleição de hoje, com forte tom antiimigração, e pesa também o confronto entre os ministérios do Interior e do Exterior. Um cuida dos imigrantes. O outro, dos viajantes. E não se entendem. Os dois ministros, aliás, são candidatos.

O Brasil foi decisivo para que Colômbia e Equador se dessem as mãos, e vai precisar de muita diplomacia para apertar as mãos da Espanha. As mesmas que maltratam os cidadãos sem ao menos pretexto; só porque são brasileiros.

elianec@uol.com.br

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