PRODUÇÃO CIENTÍFICA É ESTRATÉGICA
Mais um levantamento confirma o momento desafiador para a pesquisa no Brasil. Entre 51 nações analisadas, o país teve no ano passado a maior queda na produção de artigos científicos, ao lado da Ucrânia, onde a guerra é um óbvio desorganizador de qualquer atividade. A taxa de decréscimo das publicações foi de 7,4%. No caso brasileiro, é a primeira retração desde o início da compilação das informações, em 1996. No mundo, houve crescimento de 6,1%. O trabalho é da Agência Bori, serviço que conecta a ciência à imprensa, e da editora de publicações científicas Elsevier.
A produção de ciência e tecnologia no Brasil enfrenta, nos últimos anos, diversas dificuldades ocasionadas especialmente pelo financiamento público insuficiente. Reflexo de restrições fiscais e orçamentárias e, decorrente desse quadro, da priorização de outras áreas para a alocação dos recursos existentes. Deve ser lembrado, entretanto, que o desenvolvimento científico também está relacionado ao progresso econômico e social. É pela pesquisa que são descobertos novos processos e tecnologias que se traduzem em maior produtividade e bem-estar. O mundo vive a era do conhecimento. Quem o produz tem maiores chances de ser protagonista nessa corrida.
Um dos mais conhecidos exemplos de uma atividade econômica catapultada por cientistas é o do agronegócio. Em cinco décadas, o país passou de importador de alimentos para uma das maiores potências globais. Preocupa, no entanto, que as ciências agrárias tenham sido a área de conhecimento com maior queda (13,7%) na produção de artigos científicos no país no ano passado. Foi, aliás, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), grande responsável por essa revolução no campo, que teve a maior redução no número de publicações. Das instituições analisadas no país, apenas a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) elevou a produção no ano passado.
Gerar pesquisas e ciência requer dedicação de longo prazo e garantia de recursos. Para custear laboratórios, aquisição e manutenção de equipamentos e bolsas para quem se dedica a esta tarefa. Os resultados aparecem com o tempo. Talvez não será de uma hora para outra, portanto, que o país conseguirá reverter a queda na publicação de artigos científicos. Mas há algumas iniciativas que sinalizam uma maior atenção para a área. Uma delas foi o reajuste, no início do ano, das bolsas para pós-graduação e iniciação científica.
Os valores estavam congelados havia uma década, um evidente desestímulo frente à escalada do custo de vida neste período. Outra, anunciada neste mês, foi a decisão da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), vinculada ao Ministério da Educação, de flexibilização das normas para o acúmulo de bolsas de programas de pós-graduação com outras atividades profissionais remuneradas. Era uma saída necessária para incentivar a pesquisa, atraindo pessoas que não cogitariam depender apenas de bolsas bem menos atrativas do que os salários do mercado de trabalho.
O número de artigos científicos publicados é apenas uma das dimensões a ser analisada para averiguar a capacidade de um país de gerar ciência, tecnologia e inovação. É preciso analisar outras variáveis, como patentes, citações em outros trabalhos científicos e aplicação prática do conhecimento produzido. Só não há dúvida de que é uma atividade estratégica que deve ser apoiada. Não apenas com recursos públicos, mas em aliança com o setor privado, que também dispõe de recursos para aplicar no desenvolvimento de novas soluções e auxiliar na retenção de cérebros no Brasil.
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