28 DE JULHO DE 2023
CARPINEJAR
Cabine telefônica
Quando entro num banheiro de aeroporto ou de um shopping, eu me assusto com um hábito recente da pós-modernidade: homens ao meu lado no mictório papeando ao celular. Já entram conversando, como se fosse a sala de sua casa. Não param nem no instante mais sagrado de paz.
A vida virtual é tão incessante que não respeita mais o relógio biológico.
Julgo um desrespeito com quem estão falando. O interlocutor não tem como descobrir o quanto se encontra refém de uma privacidade indesejada e desagradável. Pode cogitar a hipótese pelo eco do ambiente. Mas sem a descarga da privada, não contará com a prova cabal da indiscrição. Se soubesse por onde anda o outro, desligaria a chamada imediatamente e daria uma lição de bons modos.
Não é o momento de completar negócios ou de atender a um familiar. Não há urgência que não possa esperar alguns míseros minutos. Só que não queremos perder tempo. Confundimos a importância de viver com o fato de nos ver sempre ocupados, resolvendo dilemas e conflitos.
Por uma questão de sanidade, necessitamos suspender essa mania. As baias são as novas cabines telefônicas. Logo mais serão ilhas de DJs com usuários deslizando freneticamente os dedos nos stories. Não existirá mais o recato.
Não vejo mais paradas e intervalos da existência virtual. Todo lugar é lugar de navegar pelas redes sociais. O Wi-Fi dos sanitários públicos deveria ser cortado. É uma indecência trocar confissões naquela situação.
Não sei o motivo de tal desespero, tal ansiedade, tal compulsão verbal. É uma infantilização da nossa natureza fisiológica, é retornar ao penico da infância, é voltar a fazer suas necessidades com plateia, tendo papai e mamãe por perto, ajudando e motivando.
Talvez seja um medo assombroso da solidão. Não queremos ficar sozinhos nem no toalete. Então, contatamos um afeto para nos acompanhar por ligação, para nos entreter, para nos acudir da claustrofobia do silêncio.
Era muito melhor e mais civilizado quando as pessoas levavam revistas e jornais ao banheiro. Pelo menos, exerciam um retiro da incomunicabilidade, um isolamento fundamental aos pensamentos. Não colocavam terceiros no meio dos seus constrangimentos. Com os olhos vidrados no celular, estamos cada vez mais curvados em direção ao chão, regredindo à postura dos nossos antepassados primatas.
Andamos na rua digitando, almoçamos e jantamos digitando, passeamos digitando, dirigimos digitando, desprovidos de freios off-line. Não olhamos para cima, não olhamos para o céu azul, não olhamos para a lua. Miramos, inadvertidamente, a nossa cova.
Até no banheiro nos mostramos agora viciados, numa atividade anti-higiênica. Não duvido de que os falantes nos banheiros lavem as mãos na saída, mas se esqueçam de limpar a tela do aparelho.
Na hora de tirar uma foto para alguém, pense nisso. As baias são as novas cabines telefônicas. Logo mais serão ilhas de DJs com usuários deslizando freneticamente os dedos nos stories
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