27 DE JULHO DE 2023
TULIO MILMAN
Quem precisa de inimigos?
O Zé Victor Castiel é um querido amigo. No verão, decidimos fazer alguma coisa juntos, além de ir ao Beira-Rio e comer churrasco. "Vamos empreender", concluímos naquela tarde escaldante de verão. Alguns dias depois, surgiu a ideia: uma palestra sobre humor, mas com um viés sério. Desenhei um roteiro inicial. Entusiasmados, planejamos a estrutura da apresentação. Veio março e o assunto esfriou. Foi quando surgiu no meu horizonte o Fórum da Felicidade, realizado mês passado na Capital.
Encarregado da curadoria de conteúdos, vi uma oportunidade de lançar o nosso produto revolucionário. Falei com o Zé e marcamos um encontro. Repassamos os gráficos e as falas. Em um sábado, poucos dias antes do evento, fizemos o ensaio final. "Nessa parte, é importante falar sobre humor e endorfina." "Aqui, vamos abordar os estilos de humor." Tudo combinado.
No dia do fórum, o Zé apareceu com um capote preto e um olhar soturno. "Tô nervoso", me disse. Não levei a sério, mas deveria. "Se o Zé, que já fez centenas de filmes, novelas e peças de teatro está nervoso, imagina nós, mortais", pensei. E assim chegou a hora da nossa apresentação. Chamei meu querido amigo ao palco. Ele subiu. Fiz a introdução conforme o combinado. Mas, na minha primeira deixa, o Zé improvisou. "Ah, esses artistas", pensei, levemente preocupado.
Mal sabia eu que, dali pra frente, só iria piorar. Além de ignorar completamente o que havíamos ensaiado, o Zé, em transe, começou a falar sem parar. E eu com o passador do PowerPoint pra cá e pra lá, tentando achar algum ponto de contato com o que o meu amigo dizia. "Zé, a gente combinou outra coisa...", disse eu, lá pelas tantas, em pânico. "Nah, nah, nah, isso aí que tu escreveu eu não entendo nada", ele devolveu. "Eu escrevi?". Meu Deus. Senti que o trem perdera o freio.
A plateia caiu na gargalhada diante da cena bizarra. Eu, zonzo, não sabia o que fazer. Comecei a rir também. De nervoso. E o Zé metralhando piadas, todas fora do script. Quando nosso tempo acabou, a plateia veio abaixo de tantos aplausos. "Bah, Tulinho, desculpa, desculpa mesmo", me disse o Zé, sussurrando, enquanto deixávamos o palco.
O importante, no fim das contas, é que funcionou. Talvez porque não tenha sido ensaiado. Aconteceu ali, da forma mais humana possível. Seja como for, nossa palestra sobre humor conseguiu um feito ímpar: ser um sucesso, sem nunca ter acontecido. Amigo é pra essas coisas.
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