sexta-feira, 28 de abril de 2017


Jaime Cimenti

Gaivotas no triplex do Guarujá 

Antigamente, as gaivotas viviam tranquilamente entre as areias e as ondas do Guarujá, sem preocupações, comendo, voando, sentindo os dias, as noites, o sol, a chuva e as estrelas passarem naturalmente, aguardando, sem medo, a hora de desencarnar.

Aí então alguns líderes do grupo das gaivotas do Guarujá descobriram que havia um triplex desocupado, à beira-mar, e resolveram dar um voo alto e se instalar no terraço do apartamento. Não sabiam de nada sobre o local e foram permanecendo. Gaivotas são pacíficas, democratas, simples e não aspiram muito.

Para elas, viver, comer, dormir, saber voar e apreciar a natureza bastam. A não ser para o Fernão Capelo Gaivota, do livro célebre do Richard Bach, que resolveu inovar, voar mais alto e diferente e transformar a vida do seu clã. Mas isso é outra história, outra ficção.

As gaivotas do Guarujá sabem, meio por cima, das questões que envolvem o famoso triplex e aguardam, serenamente, que as coisas se decidam. No início, nem se preocupavam com o assunto, depois resolveram acompanhar os fatos e as notícias. Gaivotas não se preocupam com papéis, compras, shoppings, consumo, competição e outras modernidades dos humanos. Elas simplesmente vivem, voam e sobrevoam, desde nem sabem quando e até quando também não sabem. Não estão preocupadas com fim de mundo, distopias, utopias e outras considerações demasiado humanas para elas.

Mas no mundo as coisas mudam, evoluem. Na vida, na ciência e na arte, a coisa é assim meio tipo infinita, todo mundo sabe. Há quem diga que o bando de gaivotas do Guarujá está usando redes sociais e se comunicando com gaivotas de todo o País e até do exterior para uma realizar uma grande assembleia à beira-mar e pensar na realização de ações com vistas às reformas e mudanças necessárias.

Disseram que algumas gaivotas pensam em escolher novos líderes, se envolver com a realidade, dar uma renovada em velhos hábitos do mundo. Outros dizem que as aves chegaram a pensar numa revoada de milhares, milhões, em direção às sedes dos poderes para protestos, ocupações, bicadas e bombas de "napalm" intestinal nas cabeças dos poderosos e cobrança de novas atitudes. Há quem diga que isso tudo é ficção, fruto da imaginação de algum poeta ou escritor delirante ou devaneador.

Por enquanto, as gaivotas tomam sol, dormem e acordam no terraço do triplex. Se afastam para uns voos, pegar uma praia e buscar alimento. Algumas gaivotas mais experientes dizem que o futuro a Deus pertence, que é preciso ter calma, esperar pelo melhor. Outras, especialmente as mais jovens, estão impacientes pelas definições e assim, em meio ao choque de gerações, la nave vá. O gaivota professor-doutor Sócrates Tropical de Oliveira lembrou do filme Os pássaros, de Alfred Hitchcock, e espera que, se algo acontecer, não haja violência como no filme, mas lembra que uma união de aves revolucionárias pode trazer consequências imprevisíveis. a propósito...

Há quem diga que alguns líderes dos poderes, preocupados, estão pensando em conversar com o grupo de gaivotas para troca de ideias e entendimento em relação ao futuro. Não se sabe ao certo quem são os líderes, se realmente vai ocorrer a reunião e muito menos o local e a data. Não se sabe ao certo a pauta da reunião, mas todos sabem que essas conversas e mudanças são lentas, que é preciso calma, clareza, esperança e boa vontade. Uns dizem que isso tudo é produto da cabeça de algum sonhador.

O tempo, sempre o senhor da razão e de outras muitas coisas, dirá. Não se sabe o prazo. Mas as gaivotas, dizem, estão olhando para seus cronômetros, tipo árbitro de futebol no início do jogo.  - Jornal do Comércio

(http://jcrs.uol.com.br/_conteudo/2017/04/colunas/livros/559106-elogio-filosofico-e-literario-do-sexo.html)

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