segunda-feira, 17 de abril de 2017



17 de abril de 2017 | N° 18821
ARTIGO

NINGUÉM CORA!

O que mais me angustia neste degradante espetáculo de corrupção a que o país assiste estarrecido é a absoluta falta de remorso e de vergonha dos acusados de embolsar propinas. Posso ser ingênuo, mas esperava que pelo menos um entre dezenas de protagonistas de falcatruas viesse a público para dizer:

– Errei. E aceito pagar pelo meu erro.

Já nem exijo que o cara diga:

– Roubei, sim, mas estou arrependido.

Ou que seja baruscamente magnânimo:

– Quero devolver o que tomei indevidamente do povo brasileiro.

Bastaria, para me consolar, o sujeito admitir que embarcou numa canoa furada, que fez o que todos faziam sem se dar conta de que era errado. Mas, não. Todos, até agora, só o que têm feito é repetir o mesmo mantra:

– Só recebi doações legais. Tudo está registrado na Justiça Eleitoral.

No máximo, transferem responsabilidades, naquele tom de enganar bobo:

– Se alguém pediu em meu nome, tem que ser punido.

É inacreditável. Temos corruptores à beça dizendo que pagaram, quanto pagaram, onde e como entregaram o dinheiro, inclusive mostrando os registros dos pagamentos em planilhas repletas de apelidos irônicos, mas os supostos beneficiários continuam posando de santos.

Por falar em santo – não no “santo” da lista de apelidos –, lembro uma historinha que li certa vez, escrita por um escritor alemão, provavelmente Hermann Hesse, que era um dos meus preferidos na adolescência. Ele reconta o episódio bíblico da crucificação, na perspectiva dos dois ladrões que foram supliciados ao lado de Jesus. Um deles, na hora da morte, disse que se arrependia de todos os seus pecados para ganhar o reino dos céus. O outro preferiu morrer sem renegar sua vida de crimes, mesmo sabendo que teria que pagar por eles por toda a eternidade.

E o escritor pergunta: – Qual dos dois você escolheria para amigo?

Aqui também é preciso esclarecer: não estou me referindo ao “amigo” da lista. A questão moral, proposta pelo escritor, nos remete também à delação premiada. É justo premiar com a liberdade delinquentes que só foram ao confessionário pela generosidade da indulgência?

Jornalista de Zero Hora - nilson.souza@zerohora.com.br

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