29 de abril de 2017 | N° 18832
CARPINEJAR
Vi e Mari
Sempre eu me espantava o tanto que os meus filhos cresceram. Nas roupas, nos gestos, nas tiradas, na defesa dos argumentos. Pasmo que o tempo vai nos empurrando para a frente e não traz nenhuma pausa para repetir as cócegas na barriga deles ou carregá-los na garupa durante os shows de música.
Vicente, 15 anos, ultrapassou a minha altura até então imponente na casa. Mariana, 22, decidiu corrigir meu português até então indefectível na casa. O pai idealizado vai sendo substituído pelo amigo humano, imperfeito e feito de falhas perdoáveis e cômicas.
Logo mais cederei o meu lugar na cabeceira da mesa. Naturais o crescimento e a crítica cada vez mais exigentes.
Como não existe como segurar a idade, o que noto em mim é uma metamorfose do olhar. Há uma inversão de minha mirada diante dos filhos. Como eles amadureceram rapidamente, deixo de procurar em suas feições os adultos que se tornaram para reaver as crianças que um dia foram. Cato e recolho agora resquícios da infância em suas atitudes.
Mudei minha expedição: não perseguir mais o futuro, e sim a pureza e a magia da criancice intactas em alguma de suas frases e expressões. Folheio em seus rostos o nosso velho álbum de fotografias. Não me interessa mais saber se são parecidos com o pai ou com a mãe, com o avô ou avó, o que importa é encontrar semelhança com eles mesmos de antigamente.
Minha luta é identificar o que mantém de quando eram crianças: talvez a curiosidade, ou a risada desbragada, ou a teimosia de dormir tarde ou a pressa de comer quando amam uma refeição.
Minhas pupilas têm pinças e espátulas para não estragar as asas das borboletas do jardim do Éden.
Todo pai, depois de ser um profeta, converte-se num arqueólogo. Não está centrado em adivinhar quem serão os seus filhos, dispõe a proteger a ternura dos laços primevos.
Eu me esforço em não esquecer o começo. Serei a retaguarda deles por toda a vida. Irei guardá-los quando precisarem recuperar as suas identidades.
Enquanto avançam, recuo nostalgicamente. Não estranho que voltei a adotar os apelidos que usava quando ainda trocavam as fraldas: Vi e Mari. Recorro à diminuição proposital de seus nomes para preservar o amor da filiação.
Assim como meus pais nunca mais me chamaram de Fabrício, porém de Bito. Para não esquecer que serei eternamente uma criança para quem me criou e educou. Maturidade é jamais negar a nossa origem.
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