03
de fevereiro de 2015 | N° 18062
LUIZ
PAULO VASCONCELLOS
SORRISOS
OBITUÁRIOS
Inspirado
no prefácio da crônica de Luis Fernando Verissimo publicada no domingo, dia 18
de janeiro, em que ele, com muito bom humor, comenta que todas as pessoas que
aparecem nas fotos das colunas sociais estão sorrindo, arrisco os comentários
que vão aí abaixo, nem tão bem-humorados assim, mas de qualquer maneira bem
observados.
Antes,
porém, permito-me reproduzir um trecho da citada crônica: “Nestes dias que nos
assolam, é importante encontrar um abrigo das más notícias. (...) Agora, como o
futebol não é mais refúgio, faço o seguinte: leio as manchetes da primeira
página, o suficiente para me desesperar, e vou direto para a crônica social”.
Pois
eu também encontrei o meu abrigo das más notícias, uma condição que elimina a
inveja, o ciúme, a raiva, a mentira e o mau humor. É verdade. Afirmo que não
existe mais avareza, preguiça e esbanjamento. Não existe mais cobiça, fofoca ou
maledicência. Gulodice, soberba e sovinice foram banidas do cotidiano das
famílias.
E
muitas outras coisas mais que a sociedade costuma julgar como delitos e
defeitos. Pelo menos, é o que concluo lendo os obituários publicados nos
jornais. Todos os que estão deitadinhos nos caixões esperando a hora do enterro
ou da cremação foram honestos, superprotetores, personalidades fortes e raras
inteligências. Todos valorizaram a educação, o estudo dos filhos e a união das
famílias.
Todos
foram alegres, bonitos e elegantes. Todos foram muito ligados à família, aos
pais e avós extremamente presentes, considerados exemplos de dignidade,
simplicidade, honestidade e caráter. Afáveis, meigos e doces. Humildes, leais e
sinceros. Divertidos, atenciosos e queridos.
Tá
certo, eu sei que quem morre fica logo bonzinho, que a dor do luto desculpa
tudo, que o medo da morte transforma em virtude tudo o que a pessoa escondia da
vizinhança e da família. Mas, convenhamos, não é preciso exagerar, tudo tem um
limite. Sem limite, o que deveria ser um tributo ao falecido torna-se risível.
Uma espécie de abrigo das más notícias.
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