24
de junho de 2014 | N° 17839
FABRÍCIO
CARPINEJAR
Esperança é o que mais
dói
É me
acomodar no avião e já adormeço. Nem espero o comissário fechar as portas.
Durante
conexão de Galeão para Salgado Filho, escorado na janela, pronto para babar,
escuto uma mulher chorando na poltrona da frente.
Sempre
vou acordar quando ouvir uma mulher chorando. Meu sono não resiste a mulher
chorando. Ela soluçava ao telefone:
–
Você disse que a gente moraria junto depois que terminasse seu treinamento.
Você mentiu, você só está me enrolando com promessas. Promessa dói. Esperança
dói.
Não
alcançava qual o contexto da conversa, mas sua frase produziu muito sentido. Esperança
dói!
Eu
quase chorava junto. Ela estava coberta de sentimento mais do que coberta de
razão.
Concordava
com ela: não minta com esperanças. Minta com qualquer outro sentimento, menos
com esperança. Não ofereça esperança se não acredita na relação.
Pense
bem antes de falar, pense se realmente deseja cada verbo. Cuidado com aquilo
que sonha em voz alta. Todas as palavras são estrelas cadentes. Prometer é
sério, prometer é se comprometer.
Não
adianta dizer que só falou, alegar que não fez nada de errado e lavar as mãos
no vento. Falar é fazer.
Entenda
que a esperança é o que mais machuca. Não há maior tortura do que gerar
esperança em vão: é oferecer para tirar. Não estimule projetos se não está
disposto a cumprir, se não é sincero, se não é verdadeiro.
Não
diga da boca para fora pelo prazer da hora, pelo romantismo, pelo
arrebatamento.
Imaginar
já é concretizar. Se não tem segurança com sua companhia, não iluda. Não fique
fantasiando casa própria, filhos, cachorro, viagens ao Exterior. Não insufle o
porvir para agradar. Não disfarce o pouco sentimento com a eternidade. Não
chame o futuro impunemente. Não apele para a emoção à toa.
A
fantasia é uma responsabilidade do casal. Pois o amor é o que se vive somado ao
que se conversa somado ao que se planeja. Ao fortalecer intenções, permite que
ela ou ele passe a esperar dali por diante.
Somos
crianças no amor, ansiosas pela confirmação das expectativas. Enxergamos o que
imaginamos, trabalhamos para conseguir o que imaginamos.
Esperança
é também parte importante do namoro. Esperança é também lembrança do namoro.
Esperança é também memória do namoro. Esperança é também realidade do namoro.
O
que foi idealizado a dois é um patrimônio da intimidade, um marco da confiança.
Ninguém sofre numa separação por aquilo que aconteceu, sofrerá por aquilo que
não vai mais acontecer. Sofrerá pela perda da esperança mais do que pela perda
do amor.
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