sábado, 4 de dezembro de 2010



05 de dezembro de 2010 | N° 16540
DAVID COIMBRA


Cuidado com as coisas africanas

No meio da última Copa do Mundo, peguei uma PUTZGRIMBERLANDWOFRISTICABLERGST%$@!@$%$$¨&*BLOMG duma gripe africana.

Foi a pior gripe que tive na vida.

Sabe como são essas coisas africanas. Abelha africana, se pica, mata; formigas africanas comem uma casa inteirinha; na África há leões com dentes do tamanho de facas de cortar pão e rinocerontes que investem contra tudo que é semovente; foi na África que surgiu a Aids; na África há negros altos, fortes e espadaúdos, mas também pigmeus que disparam flechas com curare e que diminuem cabeças decepadas até ficarem do tamanho de uma caixa de fósforos. Das pequenas.

Então é claro que a gripe africana seria uma supergripe. Um mês depois de curado ainda sentia tonturas. Achei que ia falecer. Não gostaria de falecer. No jogo em que o Brasil foi eliminado, contra a Holanda, é que dei uma melhoradinha. Sobretudo quando vi a Seleção Brasileira jogando. Foi um futebol tão escorreito, tão plástico, tão envolvente, que me esqueci da gripe. Estava boquiaberto.

Era a melhor atuação da Seleção na Copa. Na saída do time para o intervalo, Juca Kfouri, sentado duas ou três fileiras adiante da minha mesa, Juca Kfouri, crítico ácido da Seleção e acidamente criticado por alguns integrantes da Seleção, pois Juca Kfouri pulou da cadeira e, de pé, bateu palmas para os jogadores. Rendia-se o Juca Kfouri e rendíamos nós todos ao belo futebol da Seleção.

Aí veio o segundo tempo. E a Holanda marcou um gol.

E o Brasil se desmanchou como se todos os jogadores estivessem contaminados pela gripe africana.

Pouco se falou sobre aquela Seleção, depois da Copa. Quase nada se fala. As pessoas tentam esquecer a Seleção Brasileira de 2010. Não devido ao seu futebol, mas porque aquela foi uma Seleção mal-humorada, grosseira, mal-educada, rabugenta, ressentida, uma Seleção do Mal.

Eu mesmo não gosto de me lembrar do clima belicoso que experimentávamos na África, mas vou citar aquela Seleção. Pelo seguinte: a maioria dos comentaristas especulou sobre o que havia ocorrido com os jogadores no recesso do vestiário. O que lhes foi dito? O que disseram um ao outro? O que se passou naqueles 15 minutos para que o futebol exuberante do primeiro tempo virasse uma meleca no segundo?

Vou dizer o que aconteceu no intervalo:

Nada. Zero. Coisa alguma.

O problema da Seleção Brasileira ocorreu em cima da grama bem aparada do campo de Port Elizabeth. Foi o gol da Holanda. Bastou a Seleção levar um gol para se desestruturar emocionalmente. Foi, na verdade, a primeira vicissitude importante enfrentada pela equipe na Copa. O primeiro revés sério. E a Seleção sucumbiu a ele.

Por quê? Porque era um time sem fibra, sem personalidade, forjado entre paredes, superprotegido, distante do mundo e das cobranças da realidade. Era uma Seleção mimada, cheia de suscetibilidades, bobinha, ouriçada, irritadiça. Um time de guris de apartamento. Não merecia ser campeão do mundo.

Mas os defeitos daquele time só poderiam ser apurados numa decisão. Só num jogo em que o resultado definisse a sobrevivência. Em que a estabilidade emocional acabasse escrita no placar.

Um jogo de decisão, decisão mesmo, vida ou morte, é imprescindível para se avaliar a qualidade de um time. Um campeonato sem decisão é um campeonato menor.

O Campeonato Brasileiro, com essa fórmula de pontos corridos, é isso: é um campeonato menor.

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