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domingo, 26 de dezembro de 2010
26 de dezembro de 2010 | N° 16561
PAULO SANT’ANA | CLÁUDIO BRITO (INTERINO)
O dia seguinte
Depois das viagens e entregas da noite de sexta-feira e alguma coisa que ficou para ontem, Papai Noel está de volta à Lapônia. Seus olhos se espicham até o trenó ainda com alguns poucos pacotes que não entregou. As renas descansam. Nicolau, Noel ou Clauss, não importa como o chamam em cada lugar, revisa toda a correspondência. Faz um balanço. Na gaveta mais alta de sua mesa de trabalho, guarda as cartas completamente atendidas.
A maioria, felizmente. Bicicletas, videogames, bolas, bonecas e até computadores ele entregou. Celular, então, uma fábula, vários carregamentos. Foi e voltou dezenas de vezes. Deu conta do recado.
Quer dizer, fez o que podia fazer. Viu gente sem presente e não teve como corrigir. Havia carta não atendida e soube de pessoas que não mandaram carta alguma, outras que fizeram os pedidos, mas, não se sabe como, extraviaram-se. A gaveta do meio está cheia desses casos.
Noel conforma-se. Está acostumado às desigualdades. Tenta, todos os anos, alguma compensação. Vai às reuniões em que a brincadeira do amigo-secreto ou a distribuição da generosidade equilibram os pratos da balança da justiça social. Sorri. Logo depois, repassando na memória algumas cenas que viu em suas viagens, chora.
Por mais que tente convencer os povos a que se curvem ante valores como honra, dignidade, lealdade, tolerância, amizade e solidariedade, ainda encontra quem não creia na felicidade, na paz e na simplicidade como bons modos de viver. Noel chora outra vez.
Na gaveta bem de baixo, estão guardadas as cartas que Noel escreveu para o Papai Noel dele. Mágoas sem ressentimentos, mas algumas boas doses de tristeza preenchem os papéis. Seus desencantos vão para o fundo de um gavetão que nunca será aberto, a não ser para receber novas dores. O Noel dele é duro, não vem.
Ele escreve e armazena para saber que não lhe cabe ser entusiasmado indevidamente. Para cada boneca ou bola que entregar, outras tantas faltarão. E não deve sofrer demais por isso. É preciso sobreviver à pieguice e à lamentação. Só assim poderá ter forças para, no ano que vem, fazer tudo de novo. Se não for ele, quem fará? Nem sorrisos demais, nem choro exagerado. Noel não é um fraco, sem ser um super-herói.
Se eu pudesse, ajudaria o Papai Noel. Se cada um pudesse, resolveríamos muita coisa e o velhinho seria só alegria. Na verdade, podemos. Não é preciso muito para ajudar Noel a ajudar a gente.
Coragem, fé, esperança, aposta nos sentimentos mais nobres dos humanos e um imenso acordo mundial pela paz. Banir o crime, impedir a traição. São boas propostas, podem ser realizações daqui para a frente. Só depende de nós.
Está certo, depende também do Papai Noel, mas com ele se pode contar sem vacilos. Nós é que cambaleamos às vezes. Vamos encarar novas atitudes, vamos repelir o que não presta, jogar fora o que é ruim. E, daqui a um ano, Papai Noel vai ter apenas uma gaveta para encher: a das cartas plenamente atendidas.
Ainda que seja otimismo demais, penso assim, para desenhar a meta a perseguir. Não sei de outro jeito para chegar lá. Feliz ano-novo para nós e para Noel, que sai cansado e triste do Natal. As coisas vão melhorar. Acredite Noel, acredite.
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