terça-feira, 28 de dezembro de 2010



28 de dezembro de 2010 | N° 16563
CLÁUDIO MORENO


A mídia amiga

De todos os líderes militares da Antiguidade, nenhum foi maior que Alexandre Magno, que superou todos os demais nas conquistas que empreendeu e nas mentiras e exageros que contaram a seu respeito. Uma das principais fontes dessas invencionices foi um tal de Onesícrito, escritor e historiador que acompanhou Alexandre até os confins da Ásia e registrou as façanhas de seu ídolo num volume em que fato e fantasia se misturavam de forma constrangedora.

Uma das lendas mais famosas divulgadas por este embusteiro foi a visita de Taléstris, rainha das Amazonas da distante Hircânia, na região do Mar Cáspio. Segundo o historiador, a rainha, mulher admirável tanto pela formosura quanto pela força física, chegou ao acampamento à frente de uma escolta de trezentas mulheres guerreiras, em armadura de combate, cavalgando silenciosamente em perfeita formação.

Admirado com o porte altivo das visitantes, Alexandre – que era conquistador não apenas de reinos e continentes – ajudou Taléstris a apear do cavalo e perguntou, galantemente, em que poderia servi-la.

A resposta só podia ser uma, pois – como Hollywood depois viria a repetir infinitamente – era inevitável que o encontro de dois personagens tão excepcionais, ambos tão poderosos e bonitos, produzisse o calor necessário para a combustão espontânea dos corpos. “Vim aqui para dormir contigo”, disse a rainha, com aquela segurança de quem não duvida de sua beleza.

“Tu demonstraste ser um homem magnífico, e eu supero todas as mulheres em força e coragem; imagina o que poderá ser um filho nosso!”. Alexandre, encantado, aceitou a proposta e, nas palavras do cronista, “entreteve-a por treze dias, ao cabo dos quais honrou-a com presentes e a dispensou”.

Esta cena, sem fundamento histórico algum, foi muito ridicularizada por detratores de Alexandre, que a usavam, entre outras, para demonstrar que grande parte da fama atribuída a ele era pura propaganda. É claro que isso não afetava a opinião dos verdadeiros crentes – como Arriano, um dos biógrafos do rei, que assim explicava os exageros que iam ficando cada vez mais evidentes: “Se o fato realmente ocorreu, só tenho a louvar Alexandre; no entanto, se os historiadores contaram isso só porque julgaram que era algo que ele faria, ainda assim só resta louvar Alexandre”.

Era o prenúncio daquilo que hoje chamamos de “mídia amiga”, sempre disposta a justificar seja qual for a atitude do seu líder político, representada magnificamente pelo Gen. Franks, quando lhe perguntaram o que ele pensava a respeito da estratégia do Secretário da Defesa, seu superior, para a ofensiva americana no Afeganistão: “Senhor, eu penso exatamente o que o meu secretário pensa, o que ele sempre pensou, e o que ele sempre irá pensar, ou qualquer coisa que ele pensou que poderia pensar”.

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