quinta-feira, 16 de dezembro de 2010



16 de dezembro de 2010 | N° 16551
MUNDIAL


Sobrou para todo mundo

Pelo menos em uma coisa jogadores, dirigentes e torcida estão afinados: a imensidão de suas tristezas. São cerca de milhares de pessoas nos Emirados Árabes que estão buscando novo sentido para a viagem. Muitos vieram embalados pelo turismo exótico que o roteiro Dubai e Abu Dhabi proporciona. Mas o plano original dos torcedores era o futebol ser o protagonista e a visitação aos pontos turístico, o acessório. Desde a manhã de ontem, esta ordem se inverteu.

– Futebol? O que que é isso? Nunca ouvi falar – brincou Ricardo Caldieraro.

Ele foi com os amigos ao Marina Mall, melhor e mais completo shopping center em Abu Dhabi. Em seus corredores imensos e gelados – por aqui o ar-condicionado parece sempre regulado na temperatura mínima nos ambientes climatizados –, torcedores procuravam se distrair no paraíso de compras.

Os amigos estavam na mesma batida, tristes, mas se esforçando para manter o bom humor.

– Na verdade eu vim para ver o Seongnam (da Coreia do Sul, que perdeu ontem para a Inter, de Milão) ser campeão e para andar de camelo – contou Felipe Zorzatto.

Mais; antes da derrota, em uma caminhada por Abu Dhabi, era possível avistar de longe os visitantes do Sul, todos uniformizados para torcer. Agora eles estão à paisana, de roupa de férias. É possível reconhecer os brasileiros que vieram para o Mundial somente pelo kit de turista que carregam: máquinas fotográficas e bonés.

Janesca Pinto foi mais radical. Também em sessão de compras, vestia preto.

– Estou de luto. Foi um absurdo, parecia partida de peteca – queixou-se.

Alguém chamou a atenção:

– Olha ali! Não é o Sobis e o Renan?

Eram sim. Passos lentos, mãos nos bolsos, cabeça baixa e rosto inchado pela falta de sono e pelo choro, os dois não esboçaram nenhum sorriso. Foram gentis. Sabiam que a rodinha de brasileiros estava enfileirando críticas ao grupo. Quando eles surgiram, o papo morreu. Mas a foto, mesmo com insistência, saiu sem sorriso. Não tinha clima.

No andar de baixo, foi a vez de encontrar Índio e Alecsandro – também sérios.

O primeiro colorado que ainda vestia camiseta, Mateus Sachhett demonstrava igual ou até pior abatimento do que os jogadores. Falava com dificuldade:

– A gente se sentiu muito mal. Os jogadores nem saudaram a torcida. Não nos trataram da melhor forma fora de campo e, dentro do campo, o futebol não foi bom.

A queixa de uma saudação à torcida é frequente. Claro que se pudesse escolher, a opção seria gols e não acenos. Mas quem veio de tão longe, reclamou ao menos por um carinho.

Como a tristeza é geral, sobrou também para a torcida.

– As pessoas não cantavam. A gente estava em número tão maior e aqueles caras do Congo faziam muito mais barulho. Tinha muita gente mais velha. Faltou a Popular – queixou-se Guilherme Pinto.

O passeio por Abu Dhabi proporcionou uma outra constatação: os italianos não estão pegando no pé dos brasileiros. Fanáticos por futebol como nós, queriam enfrentar os gaúchos e não os congoleses.

– Queria enfrentar o Inter, de Porto alegre – falou Marco Gatti.

FERNANDA ZAFFARI | De Abu Dhabi

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