sexta-feira, 17 de dezembro de 2010



Reflexões finais na confeitaria de um shopping
DIVULGAÇÃO/JC

Minha mãe se matou sem dizer adeus é o quinto livro de Evandro Affonso Ferreira, mineiro de Araxá, radicado em São Paulo há 40 anos. Evandro, 65 anos, estreou na literatura aos 55, apresentado pelo lendário José Paulo Paes, com o volume de contos Grogotó, que foi muito bem recebido pela crítica. Depois publicou Araã!, Erefuê, Zaratempô! e Catrâmbias.

O romance apresenta narrativa densa, melancólica, mas com altos teores de poesia. Sentado à mesa de uma confeitaria num shopping, o narrador, um escritor à beira dos 80 anos, vê a vida passar e espera a morte, enquanto relembra acontecimentos de sua infância. Lembra principalmente da mãe suicida, que se foi em silêncio, sem qualquer bilhete de despedida.

Ela era bêbada, louca e artista fracassada, mas ele mantinha uma forte ligação com ela. O protagonista lembra da primeira ceia de Natal após a morte da mãe. O velho decrépito conversa telepaticamente com outros frequentadores do shopping e tenta justificar sua vida com um livro que, acredita, jamais será publicado.

Ele escreve para fugir da morte, fala de todo mundo e ao mesmo tempo de ninguém. Evandro Affonso Ferreira, o autor, durante um ano, passou quatro horas por dia numa doceria de um shopping de São Paulo. Não entrevistou ninguém, apenas observou o comportamento dos que passavam por ali e ficou imaginando histórias.

Escreveu muitas páginas a mão, ali mesmo, no shopping. Na orelha, Juliano Garcia Pessanha escreveu que Evandro não é um escritor de segunda ordem, um manipulador de contas de vidro, alguém que escreve a partir de outros livros.

Explica que ele é um habitante da exclusão e pertencente à família dos tragados pelo impossível. Juliano refere que este novo trabalho de Evandro é uma viragem no trabalho do autor, que ele tornou-se o outro e a dicção emergiu, não para falar sobre a melancolia, mas para presentificá-la em sua narrativa. Juliano escreveu que Evandro conhece a abissalidade impensável do não e do seu poder de sucção gigantesco.

Em meio às lembranças da narrativa, o protagonista vai apresentando reflexões filosóficas, frases e ideias de filósofos. Como se vê, não se trata apenas de mais um romance desses com começo, meio e fim, sujeito, verbo e predicado e linguagem fácil.

Evandro nos oferece, tipo assim, a polpa viva dos dias e das pessoas, nos oferece literatura viva, dessas que não gostam de rótulos e trivialidades. Não é pouca coisa. Record, 128 páginas, mdireto@record.com.br.

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