sábado, 4 de dezembro de 2010



04 de dezembro de 2010 | N° 16539
NILSON SOUZA


Onze horas e três minutos

Tenho uma certa resistência a relógios, mas sou quase obsessivo no cumprimento de horários. Faz muito tempo que não uso relógio de pulso, nem costumo recorrer a despertador para sair da cama, mas raramente me atraso para encontros e reuniões agendadas. Veio de fábrica, acho, esse relógio interno inflexível, que me faz acordar várias vezes na véspera de viagens e outros compromissos matinais.

Esta semana, juntamente com vários outros colegas de trabalho, fui homenageado por ter completado 25 anos de empresa. E, como em outras datas redondas do nosso programa de jubilados, ganhei o tradicional presente da casa: um relógio.

– É para a gente não chegar atrasado! – sempre tem um colega que brinca.

Por coincidência, tinha acabado de ler uma reportagem da revista Superinteressante sobre a marcação e a administração do tempo nesta nossa sociedade da pressa. Diz o texto que existe o tempo do relógio e o tempo que está em nossas cabeças, alheio às leis da física, determinado por fatores culturais, geográficos e até econômicos.

O primeiro tempo independe da nossa vontade, o segundo pode ser alterado pela nossa mente. Chamou-me especialmente a atenção, como habitante de uma metrópole nervosa, a informação de que uma cidade acelerada atrai gente acelerada e expulsa os lerdos. Como tenho feito um esforço constante para reduzir o ritmo, acho que corro sérios riscos de ser expurgado de minha cidade natal.

Mas, segundo uma teoria citada no texto, é a perspectiva temporal, resultado da nossa atitude em relação ao passado, ao presente e ao futuro, que dá significado à vida. Tem até um teste para identificar a perspectiva das pessoas, com ênfase na visão positiva ou negativa de cada uma destas três dimensões do tempo.

Você pode ver o passado com otimismo ou pessimismo, valorizando as lembranças boas ou as ruins. Pode ser fatalista ou prazenteiro em relação ao presente. E pode, ainda, viver com os olhos voltados para o futuro.

Não sei qual é a minha classificação. Preferi não fazer o teste, assim como prefiro não usar relógio. Deve ser alguma atitude psicológica de defesa. Sinto-me mal quando sou rotulado, sinto-me tolhido no meu livre-arbítrio. Ainda que seja um sujeito totalmente previsível, gosto de pensar que basta a minha vontade para sair da rotina, surpreender e viver emoções diferentes.

Mesmo assim, dei uma olhadinha desinteressada para o novo relógio e percebi que está parado. Marca exatamente 11 horas e três minutos. Será um registro do passado ou uma previsão para o futuro? São mesmo enigmáticos esses devoradores de tempo.

Um sábado gostoso para vc e um gostoso fim de semana.

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