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segunda-feira, 8 de março de 2010
08 de março de 2010 | N° 16268
PAULO SANT’ANA
O vazio da viuvez
Um amigo meu me diz lastimosamente que casou com uma viúva e sua vida virou um inferno: em todos os lances da nova relação aparece o espectro do marido morto de sua mulher, nas comparações, na ausência fria e eloquente do defunto, nas próprias dúvidas do meu amigo, se ele é melhor que o falecido, se o coração da sua mulher não estará ainda ocupado pelo ex-marido etc.
O meu amigo se considera preenchendo uma vaga inexistente, ele acha que aquele pijama que veste tinha de estar sendo vestido pelo falecido.
E o pior, diz meu amigo, é o suspiro. Quando sua mulher suspira, percorrem os labirintos de sua mente vários pesadelos.
Ele tem certeza que aquele suspiro é pelo marido morto, pela atrocidade do destino ter-lhe tirado o homem ideal, substituindo-o por um que nem de longe tem as credenciais do falecido.
O meu amigo tem certeza de que deveria ser impedido às viúvas casarem-se novamente, elas nunca mais serão as mesmas e estragarão cada nova união que encetarem.
Meu amigo me disse que se sente como um MST: invadindo propriedade que não lhe pertence.
Sei bem da sensação do meu amigo porque comigo se dá o mesmo, num exemplo singelo: estou viúvo da Coca-Cola Light.
Desde que tiraram de linha a Coca-Cola Light, substituindo-a pela Coca-Cola Light Plus, me desnortearam. Não é o mesmo, apesar de que tenham propagado que a Coca-Cola Light Plus contém agora vitaminas e sais minerais, não tem no entanto o sabor delicioso da saudosa Coca-Cola Light.
Eu desconhecia que fosse tão arraigada em mim a preferência por um refrigerante. Não sabia que a Coca-Cola Light tinha se incorporado à minha vida como se fosse um parente meu, a minha mulher, um filho, um cãozinho de estimação. Creio que durante 20 anos.
Estou literalmente bebendo água, não me satisfazem a Coca-Cola Light Plus nem a Coca-Cola Zero.
Mas não há vida mais insossa e insípida do que a decorrida em beber somente água.
Dá dó a minha viuvez. E me sinto impotente para, sozinho, implorar à Coca-Cola que faça retornar a Coca-Cola Light, pelo menos só para mim.
Fico tentado a fazer como a viúva que casou com meu amigo: arranjar um substitutivo para a minha Coca-Cola Light.
Mas já sei que se instalará na minha vida o mesmo pavor comparativo que se instalou no lar do meu amigo: sempre que eu beber a Coca-Coca Light Plus, me virá à mente e à garganta o sabor incomparável da Coca Cola Light.
E me sentirei como um traidor, entregando-me a outro refrigerante que não representa nem o meu prazer nem o meu sonho.
Sei que a vida é feita de presenças, mas principalmente a vida é feita de ausências, como a ausência do vigor da mocidade.
E quando nenhuma presença consegue se equivaler a uma ausência, a vida se torna trágica como se tornou a vida da viúva que casou com meu amigo e a minha, que há 30 dias estou separado para sempre da minha inigualável Coca-Coca Light.
E vejo quanto é mais trágica a situação do meu amigo que casou com a viúva e da Coca-Cola Light Plus: eles existem, um se casou, e a nova Coca-Cola está sendo consumida, mas têm a consciência nítida de que são meros paliativos, não fazem nem sombra aos titulares inesquecíveis da nossa preferência.
Vendo bem, quantas coisas em nossas vidas já saíram de linha.
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