terça-feira, 3 de novembro de 2009



03 de novembro de 2009 | N° 16144
PAULO SANT’ANA


Os três fumantes

Estávamos os três, eu, o Guerrinha e o Moisés Mendes, no fumódromo aqui do prédio da RBS na Avenida Ipiranga.

A temperatura no fumódromo era de 60ºC, um calor que só pode suportar qualquer um de nós três, que fumamos três maços de cigarro por dia.

Só sendo muito viciado em tabaco para aguentar 60 graus de temperatura, não há ar-condicionado, não há exaustor, não tem nada no fumódromo, nem ventilador, só tem quatro poltronas surradas de tão velhas.

Evidentemente que a técnica usada pelo gerente a quem cabe administrar o fumódromo é tornar o ambiente tão inóspito, que isso possa nos fazer nunca mais voltar lá, o que acende a esperança de que deixemos de fumar.

O Guerrinha disse que aquilo não é fumódromo, é crematório.

Quero deixar bem claro que acredito que o cigarro mata, provoca muitas doenças graves e fatais, que fique claro que sou contra o cigarro, acho que não deveriam fabricá-lo, mas aí se correria o risco do tráfico de cigarro, como acontece com a maconha.

Sou contra o cigarro, anotem aí.

Mas o cigarro é muito caluniado pela medicina.

Vejam o caso meu, do Moisés Mendes e do Guerrinha. Fumamos três maços de cigarro por dia, ao todo nove, nós três.

O Moisés Mendes é asmático, as duas únicas coisas que ele aspira são a fumaça dos três maços de cigarro e a bombinha da asma, que ele aplica logo após cada cigarro.

Foi quando o Guerrinha perguntou a mim se eu já tinha tido infarto. Respondi que não.

Perguntou também ao Moisés se tinha já infartado. Respondeu o Moisés que não.

O próprio Guerrinha declarou que nunca tinha tido infarto.

Conclusão do Guerrinha: “Se nós, que fumamos 60 cigarros por dia, nunca tivemos infarto, como é que o Alexandre Bach, nosso colega, que caminha oito quilômetros por dia e pratica natação três vezes por semana, conseguiu ter um infarto há dois meses? Eu não entendo isso”.

Por isso é que digo que o cigarro é muito caluniado.

Não quero dizer que o cigarro tem propriedades medicinais favoráveis à saúde ou até mesmo que é anti-infarto.

Sei que o cigarro é danoso à saúde e muitas vezes mata.

Mas alguma coisa há, que pulmões de fumantes inveterados resistem milagrosamente à nicotina e ao alcatrão, que desferem nos brônquios e nos alvéolos ataques que a medicina classifica de medonhos e mortais.

Alguma coisa há.

E o mesmo acontece no meu bairro: o Bezerra tem os dentes perfeitos, nenhuma cárie e vive mastigando e chupando balas cheias de açúcar.

Já o Medeiros, outro vizinho meu, tem praticamente todos os dentes cariados, vive se queixando de dor de dente, mas nunca comeu qualquer doce ou chupou qualquer bala.

Que mistério é este?

Não fumem, pelo amor de Deus, não fumem, mas afirmo que o cigarro é muito caluniado pelas estatísticas da medicina.

E, quando estou terminando esta coluna, me dirijo imediatamente para o fumódromo de ZH, aliás, para o crematório.

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