segunda-feira, 23 de agosto de 2021


23 DE AGOSTO DE 2021
DAVID COIMBRA

A perda do Magro Lima

O Magro Lima morreu. Você não sabe o que significa a perda do Magro Lima. A maioria das pessoas decerto não sabe, porque o Magro Lima ainda não era conhecido como devia ser. Se você quiser ter uma ideia do que estou falando, procure o podcast Era Uma Vez No Oeste, no qual o Magro tinha tempo e espaço para conversar com o Potter e o Daniel Scola sobre... tudo. Porque o podcast abordava um tema específico, a série americana The West Wing, mas evoluía para assuntos do dia, assuntos históricos, assuntos filosóficos, assuntos da vida.

Naquela conversa entre amigos, o Magro mostrava um pedaço da sua personalidade. Mostrava como era uma pessoa gentil e, ao mesmo tempo, arguta, culta e, ao mesmo tempo, despretensiosa. Será que algum dia o Magro Lima foi grosseiro com alguém? Será que algum dia ele foi arrogante? Duvido.

É uma pena que muito mais pessoas não tenham conhecido melhor o Magro Lima. É uma pena que eu não tenha convivido mais com ele. Não consegui. Não conseguimos. Antes, eu morava nos Estados Unidos e pouco o via, quando vinha ao Brasil. Ao finalmente voltar para Porto Alegre, explodiu a peste do coronavírus, e todos ficamos trancados em casa, nos falando por telefone ou por mensagens eletrônicas, como se ainda houvesse 8.300 quilômetros a nos separar.

Tempos atrás, o Magro Lima me indicou uma série alemã, Babylon-Berlin, no Globoplay. Como sempre, respeitei sua opinião, fui vê-la. Adorei. Foi uma das melhores séries a que assisti. Escrevi sobre isso, agradecendo de público ao Magro pela indicação. Depois da coluna, nos falamos por telefone. Não sei por que ele me pediu a sugestão de um livro e não sei por que sugeri Os Ratos, de Dyonelio Machado.

Você pode ser sarcástico, dizendo que provavelmente sugeri Os Ratos por se tratar de um ótimo romance. Sim, sim, sei que é um ótimo romance, mas por que citei especificamente esse, e não outro qualquer, disso é que não lembro. Mas lembro que o Magro Lima foi atrás, comprou Os Ratos, me mandou uma foto do livro e anunciou que, em breve, o leria. Depois, não falamos mais disso. Neste domingo, ao saber que o Magro Lima morreu, vários pensamentos me ocorreram, e um deles foi esse: será que o Magro Lima leu Os Ratos? Se leu, será que gostou? Não sei por que essa ideia me veio à cabeça, talvez tenha sido até inapropriado ter esse pensamento, mas tive e, de alguma forma, ainda tenho. Agora mesmo me peguei cogitando: será que ele leu Os Ratos?

Outra sensação que tem me acometido, ao pensar no Magro Lima, é uma certa frustração alheia. Fico lamentando que muito mais pessoas não o tivessem conhecido como deveriam. Elas só ganhariam ao ter contato com esse ser humano doce que ele foi. Eu ganhei um pouco, poderia ter ganhado mais. Muito mais. Mas agora o Magro Lima morreu, e perdemos todos. Você nem sabe o quanto. Você nem faz ideia do que significa a perda do Magro Lima.

DAVID COIMBRA

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