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sábado, 18 de junho de 2011
19 de junho de 2011 | N° 16734
MARTHA MEDEIROS
A viagem dentro da viagem
Só mesmo se afastando da rotina para estabelecer uma intimidade menos invasiva e mais calorosa. Viagens propiciam isso
Quem acompanha meus textos sabe que estive em Tóquio algumas semanas atrás, e antes disso fiz um pit-stop em Honolulu, no Havaí. Foi vertiginoso: do clima paradisíaco e tropical da ilha americana, caí direto num cenário de Blade Runner, tudo no curto espaço de 15 dias.
No entanto, a cereja do bolo não foi uma coisa nem outra. É bem verdade que sou fascinada pelo mar e ter alugado um jipe para percorrer toda a ilha de Oahu entrou para meu compacto dos melhores momentos, assim como meu lado urbanoide ficou plenamente satisfeito com a eletrizante capital japonesa, em especial com o bairro de Shibuya, mas o entusiasmo não ofuscou minha consciência de que o mundo está se transformando num grande parque temático.
A globalização vem coisificando as grandes cidades, de forma que nada é muito surpreendente. Tudo que existe num lugar existe em outro. Ocidente e Oriente deixaram de ser polos tão opostos. Estando no modo “turista”, a programação se reduz ao que comer, o que comprar e a atrações turísticas obrigatórias. Talvez por isso venho pensando em deixar pra lá os cartões-postais clássicos desse vasto mundo e me dedicar a rotas alternativas, viagens de carro, turismo ecológico... mas isso já é outro assunto. Voltemos à cereja do bolo.
O que mais curti nessa viagem foi a companhia que tive a meu lado: minha filha de 19 anos. É sempre uma aventura sair da mesmice cotidiana e enfrentar duas semanas de convivência ininterrupta, compartilhando quarto, refeições, imprevistos, silêncios e blablablás. Sempre nos demos bem, mas família é família. Sobreviveríamos sem sequelas?
Deixei meu lado mãe em casa. Quem viajou com ela foi uma parceira de sonho. O Japão nunca fez parte dos meus anseios turísticos, mas tendo uma filha tão conhecedora de sua cultura, tão empolgada com sua música, com amigos que lá viviam e sabendo se comunicar em japonês, não tive escolha, ou melhor, tive: escolhi deixar de ser o general da banda e ceder o protagonismo da viagem àquela menina audaciosa que me orientava pelas ruas, que comprava os tíquetes de metrô, falava com os motoristas de táxi, me explicava o cardápio, ria do meu completo estrangeirismo e tirava as melhores fotos. Foi ela quem me levou, e não eu a ela.
Só mesmo se afastando da rotina para estabelecer uma intimidade menos invasiva e mais calorosa. Viagens propiciam isso, uma quebra de hierarquia e uma democrática união diante do desconhecimento mútuo.
O melhor de tudo não foi o mar verde-esmeralda da praia de Waikiki nem os painéis luminosos da noite de Tóquio, mas a descoberta de que a passagem do tempo pode ser muito gratificante. Ela, que tinha 19, hoje faz 20, e segue meu sol nascente.
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