sábado, 18 de junho de 2011



19 de junho de 2011 | N° 16734
PAULO SANT’ANA


Os direitos dos cães

Eu fico a pensar sobre o porquê de os homens amarem tanto os cachorros.

A gente pega uma tal afeição aos cães, que, quando um da nossa estimação morre, sentimos como se fosse um irmão, um filho que morresse.

Eu disse que os homens amam os cachorros. Não disse que os cachorros amam os homens, mas poderia dizê-lo, tais são as performances afetivas dos cães para com os humanos.

Entre tantos atrativos que nos ligam a um cão, descobri recentemente um muito importante: o cão, quando está conosco, não nos faz oposição, o que não acontece com alguns amigos nossos ou parentes.

Sendo assim, imperceptivelmente exercemos sobre o cão um poder imperial: somos nós que escolhemos o alimento que ele vai comer, somos nós que designamos o lugar em que ele vai dormir, decidimos se ele vai ficar em casa ou vai sair conosco, chegamos ao ponto de tomarmos a decisão sobre se ele vai procriar ou não. Nosso autoritarismo é tão grande, que castramos o nosso cão, não só impedindo que ele tenha filhos como privando-o para sempre do prazer do sexo.

É ou não é um poder despótico que possuímos sobre os cães?

Ditado célebre: o cão é o melhor amigo do homem.

Mas notando esse exagero de restrições e até de castigos que infligimos aos cães, sinto vontade de perguntar: “Será o homem o melhor amigo do cão?”.

Desconfio que não.

Eu teço um absurdo código de direitos caninos. Por exemplo, o nosso cão tinha o direito de nos dizer: “Estou vendo que você quer me dar banho agora, mas eu só quero tomar banho amanhã”.

Tinha também o direito de dizer que não gosta de futebol na televisão: “Não dá para botar um musical na tela?”.

Nada disso, o cão é obrigado a comer a comida que escolhemos ou o veterinário indica. Na maioria das vezes, ele é solitário numa casa e nós não lhe damos companheiros caninos, deve ser um inferno um integrante de uma raça não poder compartilhar na sua vida com indivíduos da sua espécie.

Fico com tanta pena dos cães submetidos aos caprichos de seus donos, inclusive eu, que acho que os cães tinham o direito de nos cantar todo o dia o início do samba célebre: “Nunca vi fazer tanta exigência/ nem fazer o que você me faz/ você não sabe o que é consciência/ não vê que eu sou um pobre rapaz”.

Eu outra coisa não estou fazendo com esta crônica senão pregar que temos de ser mais bondosos e concessivos com nossos cães.

E principalmente aconselhar que sejamos mais sensíveis e imaginativos ao tentar descobrir quais são os verdadeiros desejos dos nossos cães. E tentar satisfazê-los.

Do contrário, há que se modificar o ditado: “O cão é o mais obediente escravo do homem”.

De amigo é que não teria nada.

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