sábado, 11 de junho de 2011



11 de junho de 2011 | N° 16726
NILSON SOUZA


De passagem

Das minhas andanças matinais.

Passam dois ciclistas paramentados, luvas, capacetes, camisas e bermudas coloridas, bicicletas incrementadas. Pedalam devagar e conversam animadamente:

– Depois que a gente se vicia em endorfina, não tem, né? – diz um deles, entusiasmado.

– É muito bom... – concorda o outro.

No banco da praça, o velhinho que prepara um cigarro de palha capta o fragmento de conversa, me lança um olhar de cumplicidade e exclama:

– Desavergonhados!

Também sobre duas rodas, pai e filho passeiam no calçadão. O homem em silêncio, possivelmente para poupar o fôlego. O menino, acomodado numa confortável cadeirinha, disparando perguntas:

– Pai, o que quer dizer “relação”?

Antes que eles se afastassem, só ouvi o homem responder “ahn?”. Certamente tentava ganhar tempo.

Vestidas de preto, com roupas apropriadamente folgadas, as duas jovens senhoras andam no mesmo ritmo, um tanto lento para a minha passada. Antes de deixá-las para trás, ouço a mais gordinha desabafar:

– Todo ser humano tem um vazio interior...

Não sei se falavam de filosofia ou de dieta.

Dois garotos de aproximadamente 10 anos deslizam na calçada sobre seus brinquedos de rodas. Um deles para, pisa com força na ponta da tábua e faz o objeto dar piruetas no ar, antes de apará-lo com uma das mãos. Olha para o outro e diz:

– Esse cheipe não tá legal.

Só não fiquei devendo essa porque outro dia meu sobrinho da mesma idade deles me ensinou o que é shape.

Um grupo de homens grisalhos discute acaloradamente numa área mais espaçosa do calçadão. Nem preciso ouvir para saber que estão falando de futebol. Quando passo por perto, percebo que o mais loquaz fala por todos:

– Com esse frio? Vou ver na tevê, pois no campo não dá para ver direito.

Disso sei bem, depois de tantos anos de cobertura esportiva. No estádio não tem replay.

Pego uma rua lateral, já no caminho de casa, e encontro a carroça do verdureiro. O homem faz um ruído incompreensível com a boca e seu veículo para diante da casa de um possível cliente. Um menino que estava no portão corre para a porta da casa e grita:

– Mãe, o cavalo que vende laranja taí.

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