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sábado, 13 de março de 2010
13 de março de 2010 | N° 16273,
NILSON SOUZA
Notas azuis
Vem aí uma mudança significativa no sistema educacional do país, com o fim da reprovação nos primeiros três anos do Ensino Fundamental. Não chega a ser novidade, algumas secretarias estaduais e municipais já adotam há décadas a chamada progressão continuada como estratégia para reduzir a evasão e a repetência.
O debate em torno desse assunto quase sempre se transforma em Gre-Nal, com críticos e defensores apaixonados de ambos os lados. Não me meto nessa discussão, até mesmo por falta de conhecimento. Mas me comovo com a ideia que está por trás desta mudança: proteger a autoestima das crianças dos danos de uma reprovação formal.
Uma nota vermelha, quando o indivíduo ainda não está preparado para os tropeços da vida, pode se transformar em rótulo infamante e irrecuperável. Muitas vezes funciona como profecia autorrealizadora negativa – o sinal de que aquela criança está destinada a fracassar. E a própria criança acaba acreditando nisso.
O aluno que é levado a acreditar em sua capacidade de conseguir boas notas tende a estudar mais e a alcançar mesmo os melhores resultados. Já aquele que é rotulado de incapaz perde o estímulo para se esforçar. Evidentemente, existem as exceções.
Lembro-me de ter editado neste jornal o artigo do psicólogo espanhol Emílio Ruiz, especializado em síndrome de Down, sobre os “disbicicléticos”. Ele relata o caso de um menino que não sabia andar de bicicleta como as outras crianças de sua idade. Foi chamado um especialista que examinou o garoto, fez vários testes e concluiu que ele tinha uma dificuldade natural para se equilibrar sobre duas rodas.
Estava feito o diagnóstico: ele era um disbiciclético e o problema estava resolvido. Ninguém se preocupou em saber se ele tinha recebido estímulo dos pais para aprender a andar de bike, se havia espaço na sua residência para isso, se alguma vez ganhara uma bicicleta de presente, ou se os próprios pais, prevendo que o menino teria esta dificuldade, jamais lhe ofereceram a oportunidade de bicicletar.
Ruiz faz uma analogia com os portadores da síndrome de Down, que muitas vezes são diagnosticados como incapazes e, por isso, sentenciados à incapacidade.
Na escola, como na vida, também pode acontecer algo parecido. Por isso, pais, professores, treinadores, tios, avós e adultos em geral devem investir no sucesso das crianças e não na impossibilidade.
Se acreditarmos que elas podem ser bem-sucedidas, elas certamente serão. Mas não basta adiar a nota vermelha por três anos. É preciso aproveitar este período para estimulá-las e ensiná-las a conquistar suas próprias notas azuis.
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