sábado, 6 de janeiro de 2024


06 DE JANEIRO DE 2024
EUGÊNIO ESBER

COMPRA DE VOTOS

Sempre dou atenção às análises publicadas pelo economista gaúcho Darcy Francisco Carvalho dos Santos por duas razões. A primeira delas é o esmero técnico na observação dos números. Seu campo de estudos é o das finanças públicas, uma seara muito permeável a explorações políticas. Mas Darcy, e eis sua segunda virtude, se mantém sóbrio, independente, equidistante de facções. 

Quem quiser entender, por exemplo, como o Estado do Rio Grande do Sul gerou uma dívida inadministrável ao longo de meio século encontrará, em seus textos, um relato equilibrado e objetivo, calcado em um amplo painel estatístico que ele maneja sem a preocupação de poupar, agradar ou perseguir setores e personagens da política que se alteraram no poder. 

Em suma, prende-se aos fatos, sua matéria-prima. Mas paciência tem limite, e foi nisso que pensei ao ler seu último artigo, quando ele se permitiu um desabafo ao deitar os olhos sobre o orçamento federal para 2024. "Os senhores parlamentares que me desculpem, mas não estão pensando no Brasil, que caminha a passos largos para a derrocada."

De fato, a peça orçamentária tem várias deformações. Fixo-me em uma delas, por razões de espaço: a dinheirama destinada às emendas parlamentares. Serão R$ 49 bilhões, uma exorbitância que os deputados e senadores terão à disposição para irrigar seus redutos eleitorais com critérios que, sabemos todos, ressalvadas honorabilíssimas exceções, atendem apenas ao objetivo de pavimentar o caminho para a própria reeleição ou impulsionar aliados que disputarão prefeituras municipais no final do ano.

 Não há, na alocação dessa montanha de recursos, um sentido que atenda a uma ideia de desenvolvimento do país, tão carente de infraestrutura econômica e social. É dinheiro para adubar o continuísmo e frear a necessária renovação política. Concorrência desleal, para dizer o mínimo. E o abuso não cessa aí. O fundo eleitoral sugará, do bolso do pagador do impostos, mais R$ 4,9 bilhões.

A gastança com emendas parlamentares recebeu um veto do presidente da República, mas não se trata de uma tentativa de reduzir o montante a ser pago. O que Lula tenta retirar da lei orçamentária é apenas o dispositivo que obriga o governo a cumprir um cronograma de liberação dos recursos. A razão é evidente. Lula quer utilizar a liberação das emendas parlamentares de acordo com o cronograma político que interessa ao governo, segurando o dinheiro até as vésperas de votações importantes no Congresso. Foi o que o Planalto fez em 2023, quando grande parte dos parlamentares votaram e aprovaram, às escuras, temas complexos como reforma tributária. 

É a compra de votos institucionalizada, sem reação alguma das instâncias de controle. Ministério Público e Judiciário, de saudosa memória nos tempos do mensalão, calam-se, atuando como engrenagens de um único bloco de poder. O governo, que aqui já referi como o regime STF-Lula, opera sem freios, e lastimavelmente o Congresso Nacional, o único poder amparado no voto de todos os brasileiros, se amesquinha pela postura de um grande contingente de parlamentares que, literalmente, negocia seus votos em barganhas nada republicanas.

EUGÊNIO ESBER

Nenhum comentário: