segunda-feira, 8 de janeiro de 2024


08 DE JANEIRO DE 2024
CÍNTIA MOSCOVICH

A Coroa

No final de dezembro, foram lançados os últimos episódios - de um conjunto de 60 - de uma das séries mais mesmerizantes e refinadas da TV por streaming. Concebida e roteirizada pelo britânico Peter Morgan (de Frost/Nixon, A Rainha), The Crown conta a história do mais longevo reinado da monarquia inglesa, o da rainha Elizabeth II, desde seu casamento em 1947 com o Duque de Edimburgo até o ano 2000 - e, sem alcançar sua morte em 2022, passa em revista a trepidante metade do final do século 20.

Com um elenco de estrelas, a série está dividida em seis temporadas, cada uma abrangendo uma década. Ali estão as princesas Anne e Margareth, o príncipe Charles, Lady Di, o primeiro-ministro Winston Churchill (e, adiante, Margaret Thatcher), o presidente americano Robert Kennedy (e sua bela esposa Jacqueline), entre outros, garantidos por atores que sustentam atuações empolgantes.

Pedra no sapato da família real britânica, com aproveitamento de fatos nem sempre abonadores (as irmãs nazistas de Philip, os complôs palacianos, as futilidades da monarquia, os cruzamentos entre a política de Estado e as veleidades individuais, o constrangedor caso Charles-Camilla), a série, que foi exibida por sete anos, lança mão da liberdade da ficção sem deixar de lado uma certa aura de compromisso histórico, mantendo uma linha de verossimilhança e de constante, e muito atraente, andamento narrativo. 

Mesmo que a família real jamais tenha interferido na série - faz pensar numa atrapalhada ação movida por um juiz de Santa Catarina, que se reconheceu em infelicidade num livro de uma advogada-autora que atua naquela comarca -, o secretário de cultura Britânico, Oliver Dowen, pediu que a Netflix alertasse que a série se tratava de ficção, "para não distorcer a verdadeira história", coisa que não foi considerada pela Netflix e que os espectadores agradecem.

Com direção de Stephen Daldry, Philip Martin, Julian Jarrold e Benjamin Caron, The Crown tem espaço para os maravilhosos cenários da Escócia e para os organizados salões ingleses, para caracterizações tão convincentes que fazem esquecer que se trata de ficção e, melhor, para grandes interpretações (Matt Smith, Tobias Menzies e Jonathan Pryce vivem o Duque de Edimburgo de maneira muito expressiva). Olivia Colman, que faz a rainha em sua meia-idade, incorpora a perda de toda a inocência e a pressão da coroa, carga que expressa nos olhos assustados e nos ombros que já se curvam um pouco. É um espetáculo.

Que o grande Ticiano Osório me perdoe por meter a colher no assunto dele. E que tenhamos todos um abençoado 2024.

CÍNTIA MOSCOVICH

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