sábado, 13 de janeiro de 2024


13 DE JANEIRO DE 2024
MONJA COEN

DRAGÕES

Havia um monge na China antiga que adorava dragões. Se houvesse tatuagem naquela época, estaria com o corpo coberto delas, com todos os tipos de dragões. Principalmente aqueles dragões de três garras, que seguram uma joia arredondada, como uma bola, em uma das patas dianteiras. Corpo de escamas, transporte alado como cavalinhos dos filmes lindos sobre a capacidade de manter a pureza no coração humano e jamais perder o contato com a árvore da vida.

Já na entrada de seu templo, um quadro belíssimo, de um grande artista plástico da época, dava as boas-vindas a quem chegasse. O quadro colocado em uma moldura de madeira de um metro quadrado era apoiado em um suporte também de madeira tampando a entrada do templo. Ao chegar, as pessoas tiravam os sapatos, subiam três degraus, sempre sob os olhos firmes do dragão, e entravam pelas laterais - espaços vazios entre o quadro e as paredes.

Seus seguidores e amigos, sabendo de seu afeto, sempre presenteavam o monge com desenhos, imagens, estátuas de dragões.

Quando estive em Kyoto, no verão de 2023, visitei o Templo Kenninji. Esse templo fica ao final da rua das gueixas, ou Maiyako - jovens mulheres que usam aquela maquiagem bem branca no rosto e perucas ou cabelos presos de forma arredondada. São jovens treinadas a entreter tanto em restaurantes, bares e teatros, como nas casas das pessoas ricas, em eventos especiais. Treinadas nas artes da poesia, da pintura, da fala, do canto e da dança. Treinadas na arte de servir, ser gentil e trazer leveza e beleza. Uma arte que leva muitos anos para a formação, feita com respeito e dignidade.

Ao final dessa rua, que é mantida como na antiguidade, estreita, com entradas de restaurantes e lojas como teriam sido no passado, há os portais do Templo Kenninji. Foi nesse templo que o fundador da ordem religiosa Soto, a que pertenço, Mestre Eihei Dogen Daiosho Zenji (1200-1253), praticou quando jovem. A sala de Buda desse templo antigo tem um grande dragão pintado, cobrindo o teto. Recentemente essa pintura foi restaurada. Linhas pretas fortes e um vermelho brilhante.

Mas o que é um dragão? Alguns dizem que dragões foram, são e serão sempre os protetores dos ensinamentos de Buda. Dizem também que um verdadeiro dragão tem a aparência de uma pessoa comum, só outro dragão o reconhece.

Quando nosso olhar para a realidade muda. Quando nos percebemos intersendo com tudo que é, foi e será. Quando cuidamos com respeito e dignidade da vida em suas múltiplas facetas podemos encontrar a verdade.

Dragões - seres imaginários que representam força, dignidade e cuidado. Sabedoria e compaixão. Não é o dragão de São Jorge na Lua. Sem luta. Ninguém quer matar o dragão. Ele não é inimigo. É o protetor da verdade.

Pois o monge que adorava dragões nunca havia encontrado um dragão verdadeiro. Conhecia representações, era cercado por esses desenhos e pinturas. Certo dia, o verdadeiro dragão chegou ao seu templo e o monge se encolheu surpreso e amedrontado... Um ser livre, leve, forte, destemido, correto e bondoso.

Você quer encontrar o dragão da verdade? Quer estar em contato com a realidade assim como é? Prepare-se. Ouça o seu rugir, afaste o medo, veja a realidade assim como é e não um desenho, uma representação da vida.

Reflita. Desperte. Este é o ano do Dragão. De 12 em 12 anos um dragão surge. Você o reconhece nos céus, nos ares, nas matas, nos oceanos, nas águas, nos pássaros, nos insetos, na terra e em cada ser? Muito além do bem e do mal - onde as dualidades se tornam uma unidade, pode-se ouvir o rugido de um dragão.

Ouça! Veja na árvore seca o desabrochar da vida no incessante fluirda corrente sanguínea. De Buda a Buda.

MONJA COEN

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