sábado, 20 de janeiro de 2024


20 DE JANEIRO DE 2024
OPINIÃO DA RBS

DEPOIS DO VENDAVAL

Passado o momento mais agudo da crise de desabastecimento de energia e água que atingiu quase 50 municípios do Estado devido ao temporal da semana passada, é imprescindível que todos os setores afetados - população, autoridades, políticos e empresários - reavaliem seus comportamentos com mais racionalidade e menos emoção, para que as lições da recente anormalidade ajudem a prevenir e a atenuar o sofrimento coletivo em eventos do mesmo gênero no futuro.

É praticamente consensual que qualquer análise construtiva deva começar pela responsabilização das empresas concessionárias, que não conseguiram atender satisfatoriamente às urgências da população. Espera-se que a atuação das prestadoras de serviço seja criteriosamente examinada nas investigações em diversas instâncias. Diante do descalabro verificado nos últimos dias, essas empresas ficaram no dever de prestar contas de suas ações e de comprovar que estarão mais bem preparadas para fazer frente a eventuais intempéries. 

Na lista de itens a serem analisados na conduta das distribuidoras, dois são imprescindíveis. Um deles é a agilidade na solução dos problemas, porque é inadmissível que milhares de clientes sigam sem luz e água tanto tempo depois da tempestade da terça-feira. Outro é clareza com transparência, pois são inaceitáveis situações como o péssimo atendimento aos usuários e as informações desencontradas de que determinadas áreas já tiveram o fornecimento restaurado quando na realidade isso não aconteceu.

Também os governantes precisam revisar suas estratégias administrativas. Quando o poder público delega parte de suas atribuições a parceiros privados, tem que assumir o compromisso de continuar acompanhando o atendimento à população que lhe concedeu a representatividade para agir em seu nome. Mais do que isso: os governantes precisam garantir as condições para que os concessionários não encontrem dificuldades para executar a prestação do serviço público - caso específico da arborização malcuidada que acaba desabando sobre a rede elétrica e desencadeando a sequência de problemas para a cidade. 

Sem energia elétrica, o fornecimento de água fica prejudicado, serviços públicos entram em colapso, empresas são atingidas em cheio, o trânsito fica dificultado e o caos se instala. Neste ponto, são esperadas ações mínimas do poder público, como blindar a rede de água e saneamento com transformadores, de modo a, ao menos, evitar que as torneiras sequem assim que a energia vai embora.

Vítimas dessa incúria, os cidadãos que pagam impostos para receber retorno em obras e serviços têm todos os motivos para ficarem indignados, como se viu nas manifestações públicas das coletividades mais afetadas. Porém, além de protestar, criticar e cobrar dos governantes, também cabe aos habitantes das cidades adotarem atitudes individuais preventivas e compatíveis com a convivência coletiva, entre as quais a separação adequada do lixo, o combate ao desperdício de luz e água, a educação no trânsito e o acompanhamento atento da administração pública.

Cabe ressaltar, neste aspecto, que a adversidade dos últimos dias - como já ocorrera na tragédia do Vale do Taquari - despertou o sentimento de solidariedade e civilidade de muitos gaúchos, que passaram a prestar ajuda em gestos como oferecer acesso a luz e água quando dispunham desses bens básicos e também revelaram compreensão e paciência no trânsito ao trafegar por áreas sem sinalização. Como na parábola do clássico ideograma chinês que relaciona crise e oportunidade, o Rio Grande pode extrair lições importantes do triste episódio climático.

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