sábado, 3 de dezembro de 2011



03 de dezembro de 2011 | N° 16906
ANTONIO AUGUSTO FAGUNDES


Dezembro

Chegou dezembro. É o verão que se anuncia, com seus dias de sol e de calor.

Nas cidades, os estudantes se preparam para os exames de fim de ano e logo as férias, ah, as férias, ou o aceno das praias, viagens, descanso restaurador para a trabalheira do ano que está passando.

Na Campanha, o cenário é outro. O campo se enche de roseta, o que impede a gurizada a andar de pé descalço. A gurizada campeira só tem um jeito de andar sem calçado e evitar os mordiscos das incomodas rosetas: é arrastar os pés no chão. Mas atenção: com o sol forte as cobras saem das tocas e não são raros os acidentes se o guri se descuida.

Apesar das lendas de que essas serpentes atacam pessoas sem provocação, na realidade elas só picam em defesa própria quando se sentem agredidas. E há outros bichos peçonhentos pelo chão como aranhas e escorpiões – aranha caranguejeira, grande, peluda e feia, na realidade é inofensiva.

É a época dos banhos de sanga, lagoões e rios. A gurizada aprende a bracear, algumas vezes até usando duas bexigas de porco infladas como flutuadores.

No Alegrete da minha infância e adolescência, lá pelas quatro horas da tarde a gurizada amiga passava pelas casas dos outros que já estavam em férias e chamavam: “Vão ao banho!”, e lá se iam, a gente já de calção enfiado, rumo ao Valêncio, um trecho raso na curva do Ibirapuitã que ficava lá para baixo da Santa Casa.

Na água vinham as brincadeiras, a mais popular das quais era o “pataço”, quando um guri mergulhava de ponta cabeça na frente do outro e com as duas pernas fora d’água batia fortemente tentando atingir o outro guri. Quando errava, era um barulhão com a água saltando para tudo que era lado. Outra brincadeira era a luta entre dois guris, cada um montado num companheiro maior dentro d’água, tentando derrubar o “cavaleiro” adversário.

No final da tarde voltava-se para casa e antes da janta começavam as brincadeiras de rua, quase sempre nas esquinas, onde a brincadeira mais popular era o “um, dois, três, por mim”: o guri ficava com uma pedra no chão e os outros ficavam escondidos. Quem tinha a pedra ou avistava qualquer um dos escondidos batia com a pedra no chão e dizia: “Um, dois, três, por mim pelo fulano”, e o guri assim identificado estava fora do jogo.

Mas então, o dono da pedra tinha que sair para procurar os que estavam escondidos. E aí outro se aproveitava e vinha correndo, pegava a pedra e batia por cima. Mas o dono da pedra também via a correria do outro e tentava voltar o mais rápido possível, ás vezes se pechando os dois na hora de pegarem a pedra.

Era também a época das pandorgas, das bolitas e de brinquedos cíclicos, que apareciam de vez em quando, como o bilboquê, onde havia guris com extraordinária capacidade manual. E era também a época das “quadrilhas”, quase sempre inspiradas por filmes e seriados que passavam no cinema (não existia ainda TV)...

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