sexta-feira, 30 de dezembro de 2011



30 de dezembro de 2011 | N° 16932
ARTIGOS - Rodrigo Grassi de Oliveira*


As pessoas estão precisando de férias?

Alguns dias atrás, fui a uma famosa confeitaria, ingenuamente tentar comprar uma torta para as festas de final de ano. Chegando ao local, vi nobres senhoras, com seus cabelos, unhas e roupas impecáveis àquela hora da manhã. Confesso que até me questionei se eu mesmo estaria apropriadamente vestido para adentrar naquele recinto, já que quando me dirigi ao balcão de atendimento pressenti uma certa hostilidade entre tão distintas senhoras.

“Tem que pegar a ficha”, “não sobrou mais nada, nem adianta ficar aqui”, “essa torta de chocolate é minha, só para te avisar”, foram algumas das frases de boas-vindas que recebi. Solicitei uma ficha e aguardei, várias outras senhoras com as mesmas características chegavam e iam se acumulando, e também recebidas com aquele carinho todo. Definitivamente, não era só comigo o incômodo.

Subitamente, uma atendente anunciou que uma torta de chocolate estava chegando. No mesmo instante, todas aquelas senhoras transformaram-se em vorazes predadoras.

Não existiam mais fichas, não existia mais ordem, não existia mais educação, todas gritavam, se acotovelavam, e nesse instante os cabelos eram jubas, as unhas eram garras, e as roupas, pelagens dignas de savanas africanas. Resolvi sair correndo, fugir dessas leoas, eis que o segurança me olhou placidamente e disse: “Nesta época do ano, o pessoal fica bem estressado”.

As pessoas estão precisando de férias? Foi então que me lembrei do livro Por que as Zebras não Têm Úlceras?, escrito por um importante neurocientista, professor da Universidade de Stanford, chamado Robert Sapolsky. Muitos já devem ter escutado a história das zebras de Sapolsky, mas creio que cabe resgatar algumas ideias para responder a essa pergunta.

Em seu livro, ele conta que as zebras precisam enfrentar situações muito estressoras, como ter um grupo de leoas tentando caçá-las, ou mesmo terem sido atacadas por uma dessas leoas. As zebras ou morrem, ou escapam.

O interessante é que, se escaparem, logo a seguir a vida volta ao normal e elas continuarão pastando tranquilamente. As zebras conseguem se adaptar a essas situações de estresse agudo e não permitem que elas se acumulem. O estresse não é ruim, ele é o mecanismo de defesa às adversidades da vida.

O problema é o estresse crônico, de que os humanos parecem gostar tanto. Passamos o ano acumulando preocupações e criamos a expectativa de que, assim que mudar o ano, voltaremos a “pastar” tranquilamente. Isso não irá ocorrer se a nossa mente estiver acostumada a perceber apenas sofrimento e os aspectos negativos das nossas experiências. Precisamos de férias para isso. Precisamos reprogramar nossa mente para que a mesma não se torne um filtro mental de coisas negativas.

Assim, as férias não serão efetivas se ficarmos alcoolizados o dia inteiro para não pensar, se chegarmos com a torta de chocolate mais concorrida na ceia de final de ano e fingir que tudo vai “zerar” naquela noite, se não aprendermos que, assim como as zebras de Sapolsky, o segredo é a rápida adaptação. De outra forma, aconselho evitar a compra de tortas de chocolate no final de 2012.

*Coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Trauma e Estresse da PUCRS

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