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terça-feira, 20 de dezembro de 2011
20 de dezembro de 2011 | N° 16923
PAULO SANT’ANA
Meu velho amigo
A história sobre um amigo, que vou lhes contar agora, é uma prova de que para viver um grande amor não é necessário ser jovem nem maduro.
No caso de meu amigo, ele tem 71 anos de idade, vive ele, há cerca de seis meses, o mais venturoso e pleno caso de amor.
A namorada de meu amigo tem 58 anos de idade. Eles se conheceram faz pouco tempo. Foram se enamorando aos poucos e hoje sentem tal necessidade um do outro, que meu amigo, de cinco em cinco minutos, passa ou recebe um torpedo para e da namorada.
Eles, quando não estão juntos (e todos os dias se encontram pessoalmente), passam torpedos apaixonados um para o outro, rigorosamente de cinco em cinco minutos.
Já decidiram que a vida só é viável e possível, só é encantadora, se eles permanecerem juntos, como namorados como são agora – e talvez como marido e mulher se assim quiserem mais tarde as circunstâncias.
O fato é que meu amigo, septuagenário, e sua namorada, quase sexagenária, parecem ambos que têm 18 anos cada, tal o entusiasmo e o arrebatamento com que se entregaram a esse amor tanto sublime quanto ridículo.
Só digo ridículo porque os escritores afirmam que é muito tênue a linha de fronteira entre o sublime e o ridículo.
E é de ver-se, como são vistos quase todos os dias, o meu amigo e sua namorada, exercitando-se quase todas as manhãs, ambos de abrigo, caminhando pelas ruas de Porto Alegre.
Todos os dias, ela, que mora num lado da cidade, transporta-se em seu carro até a casa de meu amigo, no lado oposto da Capital, e dali eles partem de mãos dadas para caminhar pelas ruas durante uma hora e meia a duas horas. Todos os dias.
E, pelo jeito com que se empregam com engenho e fervor nesse romance espetacular, irão até o fim de suas vidas caminhando pelas ruas da cidade, ele nela, ela nele, fixados em olhares acariciantes, caminhando despreocupados sob as árvores ou à margem do Guaíba, totalmente apaixonados um pelo outro.
Parece que foram feitos um para o outro. Interessante é que nenhum dos dois se lastima em não terem se conhecido antes. Pelo contrário, abençoam a chance que tiveram de se conhecer agora.
Já viajaram juntos, mas seguem o conselho célebre desta coluna de não morarem na mesma casa.
Meu amigo ontem me disse: “Sant’Ana, já não está dando mais para suportar, acho que vou acabar morando na mesma casa dela. Eu não posso resistir a morar junto com ela, eu a amo demasiado, eu jamais imaginei que voltaria a ser tão feliz. Mas, como tu me afirmas que, se decidirmos morar juntos, aos poucos nosso amor irá esmaecer, então resisto. E devo te confessar que, não morando juntos, cada vez cresce mais o amor que nutrimos. Então, seja o que Deus quiser.
Se ela está concordando em não morar junto comigo, embora me confesse que o que mais queria era residir na mesma casa minha, não deixemos que os fatos deixem de assim tão proveitosamente se suceder dentro desse círculo deleitoso da nossa relação. Moremos juntos ou continuemos morando separados, o fato é que nunca mais, isto é absolutamente certo, deixaremos de nos amar. E, se o Braz é tesoureiro, esta conta a gente ajeita no final”.
Meu velho amigo, nunca o tinha visto em minha vida tão feliz. Ele sempre foi bem-humorado, mas agora ele está exagerando em bom humor.
E vá torpedos, de cinco em cinco minutos, para sua amada. Nunca vi um amor tão correspondido.
E lá vai caminhando todos os dias pelas ruas o parzinho feliz de namorados.
Que inveja eu tenho deles! Não há ventura maior nesta vida que amar-se assim tão obsequiosa e languidamente como estão se amando meu amigo e sua namorada.
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