domingo, 9 de agosto de 2009



09 de agosto de 2009
N° 16057 - MARTHA MEDEIROS


Os pais no cinema

E m meio a tantas boas comédias que o cinema nacional vem produzindo, é bacana saber que o drama continua mantendo seu espaço, e tendo ótimos representantes, como é o caso de À Deriva, filme de Heitor Dhalia que estreará em breve com Débora Bloch, Vincent Cassel e a estreante Laura Neiva formando uma família à beira da desestruturação.

O fato de a história privilegiar o ponto de vista da adolescente Filipa, de 14 anos, faz toda a diferença: é a inocência e a tragédia sendo apresentadas: muito prazer.

Assisti também Quando Você Viu Seu Pai Pela Última Vez?, filme britânico com Jim Broadbent e Colin Firth, que narra a visita de um filho quarentão ao pai que está em estado terminal. Um acerto de contas com o passado, já que a relação entre eles nunca foi de total camaradagem, nem poderia: um pai malandro e dominador que adorava provocar seu guri romântico e sensível.

Os dois filmes mostram adolescentes perplexos diante da desconstrução da imagem que faziam dos próprios pais. Ambos os roteiros se concentram no turning point que se dá quando descobrimos que nossos super-heróis não são tão super assim: têm fraquezas, defeitos e um comportamento que, se um dia provocou orgulho, pode vir a nos envergonhar. Alguém consegue passar batido por essa mudança radical de perspectiva?

A adolescência ainda é considerada apenas uma fase de desbunde e de pequenas transgressões assistidas, mas é bem mais do que isso. Não só é o momento em que se começa a abandonar a infância e a entrar no mundo adulto, mas também o momento em que passamos a enxergar o que não gostaríamos de ver – ganhamos uma amplitude de horizonte que nos tonteia.

A realidade cai no nosso colo de forma abrupta, agora fazemos parte da vida pra valer, é hora de começar a cuidar de nós mesmos, e então? Preparados?

Ninguém nunca está suficientemente preparado para descobrir que o amor é cheio de sutilezas, e que nossos pais, assim como nós, possuem desejos secretos e são capazes de abafá-los, mas também são capazes de não abafá-los, levando seus impulsos às últimas consequências, a despeito de tudo e de todos, incluindo os filhos.

Afinal, a garotada está se divertindo tanto que mal consegue perceber o que se passa em volta, não é assim? Pais preferem acreditar que adolescentes só enxergam o próprio umbigo, quando na verdade os moleques são providos de uma antena de alcance supersônico.

Só que ainda não possuem as ferramentas necessárias para racionalizar sobre o que estão descobrindo. Então sentem. Sentem feito loucos, sentem com 100% de potência emocional. E ainda são rotulados de rebeldes sem causa, quando causa é o que mais lhes sobra.

Tanto À Deriva como Quando Você Viu Seu Pai Pela Última Vez? nos lembram o quanto nossos pais foram e são fundamentais em nossas vidas, mas não a ponto de impedir o espanto juvenil.

Mas esse espanto tem tudo para voltar a trilhar o caminho do deslumbramento: no filme Tinha que ser Você, que esteve recentemente em cartaz, Dustin Hoffman, no papel de um pai distante, consegue resgatar a intimidade com a filha no dia do casamento dela.

Mais uma vez o cinema mostrando que essa relação sempre tumultuada entre pais e filhos depende apenas de se deixar o orgulho de lado e abrir espaço para um afeto que não pode nunca faltar.

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