sábado, 1 de agosto de 2009



02 de agosto de 2009
N° 16050 - MOACYR SCLIAR


Você crê em Deus?

Apesar do crescente materialismo de nosso mundo (ou justamente por causa disso), apesar dos avanços da ciência (ou justamente por causa disso), as pessoas continuam acreditando em Deus. É o que demonstra recente enquete realizada no Brasil, Argentina e em vários países europeus.

A grande maioria das pessoas respondeu afirmativamente à pergunta: “Você crê em Deus?”. As proporções, obviamente, variam. Em Portugal, país tradicionalmente católico, a percentagem dos crentes é de 90%, enquanto que na República Tcheca a cifra cai para 37%.

Influência do cético e desiludido Franz Kafka? Ou o passado comunista da antiga Checoslováquia? Neste caso, como se explica que a Polônia, com o mesmo passado, tenha 97% de crentes? Alguém poderia argumentar que a Polônia, como Portugal, sempre foi um reduto do catolicismo; mas, na própria Rússia, 87% dos entrevistados declararam acreditar em Deus.

E o regime comunista lá durou sete décadas, período durante o qual o ateísmo foi promovido ativamente (e inutilmente, como se constata). Na escala da crença, o Brasil vem em segundo lugar, com 95% de respostas afirmativas, bem acima da Argentina (74%). Entre os que têm menos de 70% de crentes estão a França (herança de Voltaire e da Revolução Francesa?), a Alemanha, o Reino Unido, a Bélgica e a Holanda.

É óbvio que os crentes não são todos iguais, que a ideia de Deus não é a mesma para todos. Existem aqueles que fazem da crença o fato básico de suas vidas. Existem os fundamentalistas, que procuram convencer os outros a acreditar, chegando ao extremo do crê ou morre. E existem aqueles que acreditam apenas por via das dúvidas, porque seguro morreu de velho.

Da mesma forma existem os ateus militantes, que, como o biólogo Richard Dawkins, autor do controverso Deus, Um Delírio (Companhia das Letras) escrevem livros para defender suas ideias, e existem aqueles que podemos chamar de descrentes resignados, pessoas que não acreditam na divindade, mas que às vezes até sentem falta disso.

Não sem motivo: trabalhos científicos mostram que, em situação de saúde grave, os crentes evoluem melhor que os não crentes. Nessas horas, muita gente deve sentir falta do fervor que leva outros a orarem e pedirem a Deus por sua saúde. Isto sem falar nas necessidades que a religião propriamente dita preenche, através dos rituais, clássicos antídotos contra a ansiedade, do senso de comunidade, de pertinência que a pessoa religiosa sente.

Crença não é a mesma coisa que informação. Esta a gente adquire das mais variadas maneiras, e, se a informação faz sentido, se temos elementos para comprovar sua veracidade, nós a aceitamos. Mas a crença muitas vezes é descrita como uma graça de origem divina que penetra na pessoa, que a impregna, sem ser necessariamente mediada pelo raciocínio.

Crer é uma necessidade; crer em Deus, ou numa causa, ou nos pais, ou nos amigos, ou no cônjuge, ou no guru, ou no chefe, ou nos filhos. Crer numa vida melhor e brigar por ela. Erich Fromm, que numa época ficou famoso tentando conciliar as teorias freudianas com as causas de esquerda, fez uma interessante ponderação a respeito.

As religiões em geral, disse ele, não exigem que a pessoa seja praticante para garantir a salvação externa; se a pessoa for justa, for decente, for reta, Deus a aceitará. Ao fim e ao cabo, é aqui mesmo, na Terra, que o nosso destino é decidido, e é aqui que – independente de qualquer enquete – temos de mostrar o que somos e ao que viemos.

Um nome que decididamente condicionou destino: há poucos dias faleceu o Wayne Branco, figura popular cujo prenome homenageava o famoso ator americano John Wayne, astro de numerosos filmes de faroeste. Pois Wayne era um devoto desses filmes, e até fundou o Clube Western Nostalgia que os exibia. Agora, ele certamente estará encontrando seu ídolo, um encontro que não perderá em grandeza (mas será muito mais amável) que o de O.K. Corral.

A propósito de uma crônica em que contei sobre uma cadela que late quando faço minha caminhada, escreve-me a dona dela, Eunice Gruman, para dizer que a Morgana protege muito bem sua casa, mas que “ infelizmente, nunca nos ocorreu ensiná-la a distinguir os amigos do alheio de um pacato e honrado escritor”. Talvez seja difícil, Eunice...

Agradeço também as mensagens do prof. Duílio de Avila Bêrni, Julio Andrades, Anelise Silveira, Nilo Silva. Obrigado, pessoal.

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