sábado, 4 de julho de 2009



05 de julho de 2009
N° 16021 - PAULO SANT’ANA


Gostava desde sempre

Vá lá, as iniciais do nome são as mesmas. Nasci em 1971, ano em que ele foi contratado por ZH. E só. De resto, o afeto que me liga ao PS, esse enxuto garotão de 70 (sinceramente, não acredito naquele monte de doenças que ele diz ter), deve ser tão intenso quanto o de milhares de gaúchos que me leem (e que se espantam por essa interinidade tanto quanto eu, comunicada da missão, a pedido do próprio dono do espaço, na noite de sexta-feira).

O que me torna diferente de você é que estou perto (sou jornalista de ZH há mais de uma década). E que transformei meu fascínio em estudo, na tentativa de decifrar quando (e como) saía de cena o Sant’Ana homem, onde começava o personagem, onde os dois contracenavam, como se construiu esse fenômeno que move – e comove – multidões (sair com ele na rua, dizem, é uma experiência e tanto). Meus escritos (uma dissertação de mestrado) viraram uma porção de ideias ordenadas e encadernadas que hoje descansam na estante da biblioteca da universidade. Não foi em vão, mas foi pouco.

Me esforcei, confesso, em ligá-lo a um novo estágio de socialidade que precisa de catarses, elos afetivos e emoção para se concretizar. Sant’Ana seria essa ligação, esse ídolo que congrega e cristaliza uma dimensão sensível da existência. Afinal, ele se emociona ao vivo, chora, ri, é tão nós, que até confunde. Dizer onde começa e termina o homem e o personagem é como limitar o que não pode ser limitado. Ele é os dois ao mesmo tempo.

E tão difícil de enquadrar, que até jornalista não parece ser. É mais. Ele produz um tipo de notícia e de comunicação que não está nos livros, justamente porque só reproduzir realidades não é a sua seara. Totalmente parcial, altamente subjetivo, autoral e passional, esse é o Sant’Ana. Então é só cronista? Não creio.

O que creio é que ele faz um discurso que parece não pré-fabricado, ou seja, ao conversar com o câmera do estúdio de TV, fumar, brincar com a Cristina Ranzolin ou sair para dançar, sempre ao vivo, ele passa a inequívoca mensagem de deter o poder de montar o próprio script, alguém tão espontâneo quanto sensível e honesto, consigo e com suas próprias verdades. Haja pulso do cinegrafista para seguir seus improvisos.

E isso é coerente com seu jeito de ser e de mostrar-se. E também é tudo que queremos que faça alguém que fala por nós, que sente tão bem o que sentimos. Que tenha autonomia de ser ele próprio, quando e onde quiser. Afinal, quem consegue? Até que me provem o contrário, só ele.

E isso o legitima a assumir o controle da carroça e mostrar como vive quem depende dela, se vestir de baiana para caçoar dos colorados, pedir cadeias dignas de um ser humano estar nela, odiar (muito) pitbulls que estraçalham crianças, querer parques limpos e cercados. E também polemizar, que isso é da sua índole e essência, sobre a foto da governadora no outdoor, os casamentos que detonam as relações, o Viagra que as potencializa.

Não precisamos – e nem devemos – concordar com tudo, porque isso talvez seja da nossa índole, a de gaúcho. Mas o ouvimos como a poucos. Talvez porque a imagem do gaúcho presente no nosso imaginário tenha justamente essa coragem e audácia encarnada todos os dias pelo ex-feirante que se transformou numa das figuras mais poderosas da nossa imprensa.

Esse que ainda tem tempo, e interesse, para saber de mim:

– Você já gostava de mim antes, gostou ao me conhecer ou gosta mais agora?

Sei lá, respondi, enquanto perdíamos o olhar no cinza do dia apresentado além das vidraças de ZH na última quarta-feira. E ele ainda queria que o sol aparecesse para que tirássemos os sapatos e fôssemos dar um passeio, na grama fresca do parque. Esse é o Sant’Ana de que mais gosto, que não cabe em teorias e nem em si próprio.

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